A sociedade estabelece os meios de categorizar as pessoas e o total de atributos considerados como comuns e naturais para os membros de cada uma dessas categorias. […]
Enquanto o estranho está à nossa frente, podem surgir evidências de que ele tem um atributo que o torna diferente de outros que se encontram numa categoria em que pudesse ser incluído, sendo, até, de uma espécie menos desejável […]. Assim deixamos de considerá-la criatura comum e total, reduzindo-a a uma pessoa estragada e diminuída. Tal característica é estigma, especialmente quando o seu efeito de descrédito é muito grande.
Erving Goffman
Se todos fossemos iguais que aborrecido seria este mundo!
Começámos agora um novo ano, 365 páginas em branco para irmos preenchendo diariamente com aquilo que nos torna seres humanos: alegrias, tristezas, conquistas, derrotas, um bocadinho a cada dia, como se de um puzzle gigante se tratasse. Já cá andamos há dois milénios e uma adolescência. Mais que tempo para nos “habituarmos” uns aos outros mas, na realidade, isso está bem longe de ser verdadeiro.
Há poucos dias, andávamos nós cheios de filhós e rabanadas, quando no chamado “Boxing Day” se realizou um jogo de futebol, daqueles à séria, num país também à séria, entre duas equipas à séria. No campo, 22 jogadores realizavam nada mais que o seu trabalho: jogar para vencer o jogo.
Ora, como sabemos uma equipa de futebol é uma miscelânea de jogadores de várias nacionalidades, de varias formas e feitios que, em conjunto, são o motor de uma equipa. Contudo, aquele jogo em particular vai ficar gravado na memória, pois, durante a partida, Kalidou Koulibaly, central do Nápoles, senegalês nascido em Saint-Dié-des-Vosges, França, foi vítima de vários cânticos racistas na casa do Inter de Milão. E porquê? Porque é negro. Porque algumas pessoas ainda julgam o outro pela cor da pele. Porque ainda há a quem falte a capacidade de ver apenas o invisível e deixar de fazer julgamentos por aquilo que os olhos vêem. Naquele momento, aquelas pessoas deixaram de ver Koulibaly como um de 22, e focaram aquilo que, para elas, o categoriza como diferente. Que vergonha alheia sinto ao ver isto…
Após alguma pesquisa percebo que esta onde de intolerância é , infelizmente, recorrente: há cascas de banana atiradas a jogadores, há palavras de ódio, há intolerância, intolerância demais! Mesmo sendo neste contexto especifico, e talvez roçando a provocação, é uma atitude condenável ao máximo.
Temos pois de proclamar, em nome da tolerância, o direito de não sermos tolerantes com os intolerantes.
Karl Popper
A intolerância da sociedade em que vivemos é, infelizmente, uma realidade aguçada que nos pica todos os dias. Seja pela cor da pele, pela orientação sexual, pela crença ou religião, pelas escolhas individuais, pelos ideais defendidos. Em suma, tudo aquilo que seja diferente é suficiente para ser categorizado e estigmatizado de alguma forma… esquecendo-nos, tantas vezes, dos papeis desempenhados por essas pessoas. Papeis que formam toda a sociedade em si.
A cor da pele é infelizmente o expoente máximo deste estigma, mas não pensemos que se reduz ao típico branco vs negro, dependendo do contexto, da comunidade, o contrário pode acontecer e acontece. Temos então a ovelha branca, que num rebanho de ovelhas negras é olhada de lado.
E quando a ovelha é vesga? Ou tem pelo malhado? Ou quando coxeia? E se lhe falta a ponta do rabo?
Mas que estúpidos estigmas…
Neste inicio de ano vamos entrar com o pé certo e ser mais! Ser mais tolerantes, ser mais compreensivos, ser mais observadores. Vamos olhar para o mundo pelo que ele é. Vamos ver com o coração. Vamos deixar-nos de rótulos.
Vamos olhar em vez de ver.