É um dos diálogos mais intensos do filme O Ben está de Volta, numa cena que se confunde perfeitamente com a dura realidade de muitas famílias, que sofrem a devastação provocada pelo mundo da droga. Esta é a pergunta de uma mãe desesperada, que carrega uma dor imensa, visceral, e que tudo faz para que o seu filho Ben, de 19 anos, toxicodependente em tratamento, se afaste das malhas da droga. A cena passa-se num cemitério para onde esta mãe, exasperada, leva Ben para que este tome a real consciência do lugar para onde a droga o levará, caso não faça o tratamento de desintoxicação e não se afaste daquele mundo imundo. Um filme que, na verdade, é um paralelismo da vida real, que pode acontecer nas nossas casas, com pessoas comuns, com vidas normais e que, aparentemente, têm tudo para ser felizes. Uma realidade da qual ninguém está livre onde o cemitério é o único destino para onde a droga empurra quem dela depende e quem dela sofre efeitos colaterais.
Um lamiré do filme: estamos em Nova Iorque a poucos dias do Natal. Holly, mãe de Ben, é surpreendida pelo aparecimento deste seu filho, toxicodependente reincidente que está internado numa clínica de desintoxicação. Se ao mesmo tempo é uma alegria tê-lo em casa inesperadamente para passar a quadra, a verdade é que este súbito aparecimento traz como reverso a aflição. O padrasto e a irmã mais velha estão bem cientes disso, e não acompanham Holly e os filhos mais novos na satisfação pelo regresso do rapaz. E a perspectiva de um Natal calmo e alegre dá lugar a tensão e a grandes angústias.
Julia Roberts e Lucas Hedges são as figuras centrais do drama. Ou seja, a mãe Holly e o filho Ben. Uma mãe cujo amor ultrapassa os limites do incondicional e que tudo faz para que o filho se mantenha sóbrio. Um rapaz com um sofrimento atroz, provocado pela toxicodependência e por ter arrastado a sua família para os efeitos colaterais daquele tormento. Um rapaz rodeado de amor, mas que se sente perdido e parece não encontrar saída para a sua libertação. Um rapaz igual a tantos outros jovens, com acesso fácil à droga, mas que, depois de entrar naquele mundo, se torna difícil encontrar a saída…
Embora o filme não entre em grandes pormenores, capta muito bem o enredo que a droga envolve e a devastação que provoca em tudo e todos quantos toca. A verdade é que uma mãe de um filho toxicodependente nunca mais volta a ter uma noite de sono tranquila. Mesmo que um toxicodependente esteja limpo, a verdade é que o pesadelo da droga fica apenas adormecido. É uma tempestade que pode estiar, mas que a qualquer momento se pode levantar. É que as tentações daquele mundo estão instaladas em todo o lado. Os dealers, ou passadores de droga, são pessoas normais, com bom ar, que andam por aí a seduzir os mais susceptíveis para que caiam em tentação. Em casa, na rua, nos centros comerciais, nas escolas, nas casas de banho públicas, nas paragens de transportes públicos, nos bares, num encontro banal, etc.. eles andam sempre a farejar. A verdade é que no mundo da droga não há lugar para a compaixão, mas apenas para a mentira e para o desespero de arranjar dinheiro para comprar produto. A verdade é o aglomerado de zombies, nos cantos e buracos mais escuros e degradados.
O filme trata de um duelo entre o amor e a droga. Entre dois mundos que lutam desesperadamente pela conquista da liberdade, embora a liberdade do mundo da droga seja unicamente ilusória, uma besta disfarçada, completamente destruidora e com efeitos colaterais nefastos. Um mundo do qual, mesmo assim, é possível sair, através da força do amor, o lado bravo da vida. Este, sim, o mundo da verdadeira liberdade. E é aqui que reside a esperança, uma esperança que o filme também nos deixa em aberto e nos leva a crer que o amor pode sair vencedor.