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Felicidade

Fui fazer uma caminhada e ver o mar. O mar é calmante. As suas ondas sabem como conversar e mostrar que afinal há muito mais do que se possa pensar. Gosto do som, da paz que me transmite e da imensidão que consigo imaginar. Ou de tentar, pois a água é tão líquida que consegue levar alguns dos meus pensamentos.

Era um dia quente. Algumas pessoas caminhavam, lado a lado, em amena cavaqueira. Percebia-se que era o corpo a ser liberto e o respirar agora tinha outra função, a de devolver a liberdade que se arrumou durante uns meses. Soltavam-se como se tudo fosse o certo.

Não resisti e descalcei-me. A sensação de pertença é grande e libertar os pés de jugos sabe sempre bem. Os pés tocaram a água e nem o frio que ela me passou demoveu os meus passos. Queria sentir a areia, a água bem fresca e sentir o seu cheiro salgado que me tempera a vida. É um sabor intemporal.

Sesimbra. Uma terra que gosto e me deixa ficar sempre um sabor de pouco. Tanto que aconteceu por lá e, mesmo passados tantos anos, revivo tudo como se fosse a primeira vez. Encanta-me sem me incomodar. São páginas de história que se folheiam sem dor.

Por momentos, senti a presença de alguém que me foi essencial, com a sua voz segura que me amparava em tudo. Por momentos o tempo congelou e visualizei-me enquanto adolescente, com todos os sonhos por realizar. A voz continuava presente, ao lado do vento e misturada com a espuma das ondas. Uma melodia que me fez fechar os olhos.

Caminhei e vi a limpidez da praia, a ausência do meu passado e a alegria que o presente sempre suscita. Havia crianças a rir e brincar. A continuidade da vida está assegurada. O sol apertava, com vontade de torturar e fazer reviver o último dos dias. O que não devia ter acontecido. O que foi e não volta.

Sentei-me numa pedra. Olhei para o horizonte e ao fundo vislumbrei uns pequenos pontos curiosos. Talvez fossem os locais secretos onde se escondem os sonhos que não se realizaram. Terão porta e cofre? Ouvi a água e senti que a saudade era apenas uma amiga.

Um casal jovem fazia fotografias. Ela sorria, cheia de esperança e de futuro e ele, em posse de muito adulto, derretia-se de amor de cada vez que ela ajeitava o cabelo. É delicioso perceber como a vida se repete, como os desejos e os sonhos são sempre o mote que impele à continuidade.

Sorri. Que belo é o amor pueril. Tão forte e ingénuo que tudo permite e aceita. E sabe tão bem! Os apaixonados querem-se embriagar com todas as formas possíveis. É uma droga que vicia. O amor vicia e não se conforma. Quer mais e ainda o impossível.

Regressei ao local de origem. Lancei um último olhar. Foi ali que nos beijámos pela primeira vez e foi, também ali, que vertemos as lágrimas mais ácidas que tínhamos. Continua a ser o nosso sítio mesmo que não o queiramos admitir. Ali. Continua como se não tivesse sido testemunha de tudo.

Se a água é o símbolo da vida, então, certamente está cheia de dores. Aquele choro que vertemos foi tão grande que sol algum o conseguiu secar. Naquele local, o que sabemos, ainda está a tal mancha que prova a dureza da felicidade.

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