Por estes dias tive o privilégio de ver o meu afilhado canino, de 18 anos, quase 19, ser adoptado.
Durante cerca de 6 anos, permaneceu na União Zoofila, mas agora tem uma casa que partilha com alguns humanos e outros cães.
Quando conheci o adoptante, um senhor de meia-idade, e não consegui calar a pergunta sobre a sua preparação para uma adopção geriátrica, ele, muito calmamente, explicou que o sentia como missão. Após algumas peripécias graves na sua saúde, percebeu que ainda não tinha realizado alguns dos intentos, e, portanto, pôs mãos à obra, que é como quem diz, adoptou alguns cães, 2 dos quais de idades avançadas.
É preciso coragem para tal, mas a minha alegria foi imensa, por conhecer cada vez mais pessoas que têm esta disponibilidade mental e emocional. Um dia quero ser assim, comandar o meu coração em prol do bem alheio, e sarar as feridas da minha perda com os unguentos da felicidade provocada. Até lá, racionalizo o assunto, embalando-me na coragem dos argumentos pró -adopção, animais novos ou velhos.
Quando se fala de adopção de cães, na grande maioria dos casos, pensa-se num animal jovem, de preferência com menos de um ano. São alavancadas razões como pretender educá-lo ao jeito do dono, acompanhar o crescimento, haver crianças no lar. Adoptar uma criançola já é um avanço sobre a compra de animais, parabéns pela iniciativa! E é bem verdade que a probabilidade de adopção vai decrescendo, tal como com os humanos, à medida que a idade vai somando.
Contudo, aqueles que não tiveram a sorte de ser adoptados em cachorros, vão acumulando, permanecendo mesmo alguns deles uma vida inteira, que pode chegar aos 15 anos, em associações. Isto na melhor das hipóteses, porque, nos canis, a eutanásia ainda é praticada e animais mais velhos, com patalogias ou com pouca hipótese de adopção, são preferenciais no acto. Falamos de probabilidades, claro, mas, há quem goste de contrariar tendências e adoptar cães com alguma idade, ou mesmo idosos. É a si que me dirijo hoje, acreditando que de certeza se integrará um dos seguintes perfis. Acha que não? Então vamos lá, conversamos no final:
Tem pouco tempo para investir em educação
Um animal jovem tem que ser ensinado: a usar os espaços, a criar ritmos fisiológicos, a interagir com os humanos. Um cão adulto ou idoso já o saberá fazer, até porque alguns dos animais deixados em abrigos ou abandonados, já tiveram uma casa antes. São menos exigentes ao nível da atenção.
Tem limitações de espaço ou preferência por um tipo de cão
Um animal adulto já tem o tamanho definido, bem como o tipo de pêlo. Não há surpresas, não são necessárias estimativas de crescimento, não há duvidas, é olhar e ver. Torna tudo mais simples.
Gosta da previsibildade no comportamento
Se um cachorro é enérgico e imprevisível, um cão mais velho já terá um padrão de personalidade definido, portanto saberá com o que pode contar: se ladra muito, se é agressivo, se não suporta cães pequenos, por exemplo, o que pode ajudar na selecção do perfil que se adequa a si e ao seu ambiente doméstico.
Adora a sua casa
Teve um cuidado meticuloso a mobilar a sua casa, e agora teme que os rodapés e os sofás desapareçam, como se a sugerir a troca? Um animal com mais de um ano já tem a dentição completa, pelo que não necessitará de destruir a sua casa no intuito de conseguir algum alívio no romper dos dentes. Assim, poderá trocar de sofá na mesma, mas talvez para que possam ambos acomodar-se neles, quem sabe?
Não gosta de exercício físico
Se não lhe agradam muito passeios de 1 hora ou corridas, saiba que um animal adulto é menos exigente em termos de saídas, e também na frequência com que necessita ir à rua para fazer as suas necessidades. Duas vezes por dia é suficiente. Nos velhotes, qualquer volta ao quarteirão e já uma aventura, com paragens para cheirar as flores e cumprimentar os vizinhos.
Terá uma excelente companhia
Naqueles dias em que só sonha com o sofá, terá a companhia do seu cão, a dormitar ao seu lado, sem estar sempre a trazer-lhe o brinquedo para o desafiar para a brincadeira. E talvez até seja brindado com um cómico ressonar. Sempre pode dizer ao seu parceiro que o ressonar que ouviu não era o seu …
Tem com quem disputar o nascimento dos cabelos brancos
Haja alguém que nos entenda, quando nos começamos a queixar das maleitas da idade, ou apenas da estética daquele cabelo branco que surgiu de repente. E se até já tem alguma dificuldade em manter uma passada acelerada, terá um companheiro ao lado, e não na frente, em desatino de corrida.
Não quer gastar muito no veterinário
Animais adultos poderão eventualmente já ter a esterilização feita. Essa é a primeira medida para auxiliar o controlo de ninhadas errantes. Correndo tudo bem, visitará o veterinário para a vacina anual, sendo que algumas são já bianuais. Poderá ter algumas surpresas com doenças da idade, mas saiba que quanto mais rafeiro, mais resistente é. Conte com um amigo até aos 15 anos, pelo menos.
Se tudo isso já não fossem vantagens, poderia convencê-lo com a mais significativa delas: o amor e a gratidão.
Um cão com um passado de sofrimento, agradecer-lhe-á todos os dias por lhe ter dado uma oportunidade. Talvez ele próprio se esqueça da vida que antes teve, e parta deste mundo com o sentimento de ter sido amado. E há lá coisa que valha esse olhar?
Então, conte-me lá, vai pensar nisso ?
Pode ser, com carinho?
Na juventude deve-se acumular o saber. Na velhice fazer uso dele.
– Jean-Jacques Rousseau