O que queres ser quando fores grande? Solteira

Quando perguntavam a uma amiga minha o que queria ser quando fosse grande, esta respondia, perentoriamente: solteira.

A resposta, de certo causou algumas gargalhadas junto dos adultos daquela altura. Ora, afinal, quem é que poderia ter esse, como um sonho de adulto?

Éramos, e somos educados para estudar, namorar, tirar um curso, trabalhar, comprar casa, casar e ter filhos, preferencialmente por esta ordem. E quando assim, não é? Que posição ocupamos nós na sociedade que tão mal preparada está para aceitar e receber aquilo que foge aos padrões tradicionais? Existe sempre uma tendência em criticar ou questionar aquilo que se desvia da rota, dita aceitável.

Se chegamos aos 25 anos sem namorado – ou temos um problema – usualmente atribuído a uma personalidade difícil – ou somos homossexuais. Se, por outro lado, namoramos há muito tempo, perguntam-nos quando nos iremos casar. Se casamos, ainda no casamento já nos questionam quando encomendamos um bebé. Se o bebé não chega nos primeiros dois anos de casamento, há sempre quem comente – entre dentes – que devemos ter qualquer problema e não conseguimos engravidar.

Como se lida com esta pressão da sociedade, em que maioritariamente, não existe qualquer fundamento para tais questões?

Não deveríamos ser livres para fazer as nossas escolhas sem prejuízo daquilo que pensam sobre nós? Onde encontramos o nosso livre arbítrio?

Decidi ser mãe, porque desde sempre imaginei que o seria, mas se me questionarem o porquê dessa vontade, possivelmente não saberei responder. Quer queiramos, quer não, dificilmente não seremos influenciados pela nossa família, pela forma como fomos educados ou pelas expectativas que depositam em nós.

Por isso pergunto-me: não deveria ser tão legítimo não querer ter filhos, como querer?

Possivelmente, quem não os quer, consegue ter uma resposta mais elaborada sobre o assunto do que quem opta por se tornar pai ou mãe. E, embora exista quem classifique essas pessoas de egoístas, não deveria ser esse um dos motivos principais para ser honesto o suficiente consigo próprio, e decidir não deixar descendência?

Uma mulher continua a ser vista como alguém que, inevitavelmente, se tornará mãe. Espera-se que seja esse o seu papel principal no mundo.

As mulheres – tal como os homens – podem ser aquilo que desejarem ser, e se isso implicar não se tornarem mães, essa vontade deve ser respeitada.

Ainda que já tenhamos dado alguns passos nesta direção, o caminho ainda se adivinha longo para a mulher que assume não se sentir preparada, capaz ou com vontade de ser mãe.

Não somos todos iguais, aquilo que me completa a mim, não completará outro; aquilo que realiza outro, não me realizará a mim; os meus objectivos de vida não serão, certamente, iguais aos do meu vizinho do lado. E que bom que assim é!

Fui mãe da mais extraordinária menina do mundo (como todas as mães são dos seus filhos) e dentro daquilo que conseguir, sei que vou tentar sempre educá-la para que cresça sem limitações daquilo que poderá vir a ser. E se um dia lhe perguntarem o que quer ser quando for grande, ficarei igualmente realizada se ela responder solteira ou casada, bailarina ou futebolista, desde que eu saiba e sinta que é feliz.

Não será o conceito de felicidade demasiado extenso para se limitar aos estereótipos de sempre?

Respeitemos então de igual modo, a Maria que decidiu não ser mãe, o António que se formou em bailado clássico ou a Helena, mãe de quatro filhos.

Cada um deles é feliz, à sua maneira, sem esperar aprovação de ninguém para validar aquilo que acreditam, e que os faz sentir realizados.

Sejamos, portanto, felizes.

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