Levantam-se várias questões, na espuma dos dias que são diluídas pela nossa incapacidade prática de atender a todos os quadrantes da nossa vida, ao mesmo tempo e com a mesma força e dedicação.
Um dos principais problemas atuais é o movimento de partes consideráveis das populações. Chame-se migração, emigração ou imigração consoante se fala de movimentos internos, externos ou forçados (guerras por exemplo). Numa Europa que vira à (extrema) direita para, na minha opinião, compensar todos os anos dos diversos tipos de socialismo existente na Europa, com o intuito de se proteger da ameaça que estas movimentações representam.
Sabendo, em alguns casos, bem de perto qual a dificuldade de integração da parte da população com origem nas antigas colónias portuguesas, posso extrapolar o mesmo para a França a Itália, assim posso dizer que a guettização é um fenómeno real e ainda hoje bem presente na nossa sociedade, supostamente evoluída e informada. Para mim a questão é que o progresso, que sem dúvida se alcançou, foi nas costas desta faixa da população. Não é populismo barato e sim a verdade que vemos todos os dias nos autocarros, metros e comboios das primeiras horas de cada dia. Mais, estas pessoas, são formatadas para agradecer pelo emprego, por terem um prato de comida em casa e algum elogio que venha de um qualquer “doutor” é uma moeda de ouro para se usar com orgulho.
Com excepções cada vez mais constantes, felizmente, os lugares onde esta camada da população vive são cada vez mais afastados das capitais de distrito, ou contrário dos anos 90 por exemplo. Ora, uma pessoa que mora numa casa mal situada, que mal consegue aquecer, mal paga, com um horário muitas vezes abusivo e olhada, nos melhores dias, com condescendência tornar-se-á, não poucas vezes, uma subversão do estado em que ninguém lhe deu hipóteses de se inserir. Estas cidades, estes bairros, não são habitadas por pessoas piores do que as do centro da cidade, são, isso sim, resultado de políticas públicas que não pensam mais além dos próximos 4 anos. Esse voraz ciclo político, que não se importa mais do que com a sua sobrevivência. Claro que há programas e medidas que contrariam o que eu digo aqui, mas são coisas avulsas, sem um plano maior de verdadeira transformação.
Os índices apontam para uma melhoria generalizada em termos de segurança e perceção da mesma, assim sendo o problema não é urgente e, portanto, não faz manchete nos jornais, não abre noticiários, logo cai no esquecimento, na procrastinação burocrática que é, para mim, o principal defeito português.
Estão a chegar novos problemas, como a migração climática, o empobrecimento generalizado e estrutural, mas que no fundo são derivados do problema subjacente, que é a falta de vontade de todos nós em mudarmos realmente a cabeça de quem tudo decide. Na Suécia como na Hungria, fecham-se fronteiras ou são colocadas quotas de migração, bem como já foi feito na Itália e na Grécia. Se nós não cuidarmos da democracia aqui no burgo, vai acontecer. Não tenho pretensão de ser arauto da desgraça, mas os exemplos são muitos e variados.
Concluindo, acho que sim, a migração é um problema gerador de outros, mas só porque o estado não raras vezes deixa pessoas dos mais variados contextos sem uma porta de saída. Ouvi por estes dias um número que me assustou muito, sem as ajudas do estado, 4 milhões de portugueses viveriam abaixo da linha de pobreza. Agora é pensar na força destes números e no poder paralisante que o estado detém.
Fico muito contente com as crônicas lúcidas que você escreve. Parabéns! Muito obrigado!