Do Respeito

Ao longo dos últimos anos tenho reflectido sobre uma questão que, para mim, é a base de muito do que temos vivido nestes tempos conturbados, o respeito, ou a falta dele. Contactando diariamente com pessoas, conversando com elas, de certa forma auxiliando-as a encontrar caminhos ou a “encaixar peças” no puzzle da sua vida, apercebo-me que a sociedade deixou o respeito para segundo plano, substituindo-o, essencialmente, pelo medo.

Hoje, muitos de nós evidenciam diversas situações que estão a moldar a sociedade. Desde as questões mais globais, como as guerras, a fome mundial, o problema da destruição da natureza, até às questões sociais mais prementes, como o envelhecimento populacional, o abandono de idosos, o não acompanhamento de crianças, a exploração dos trabalhadores, a situação precária, também, de muitos empregadores, o desemprego, a pobreza e a fome escondidas e tantas outras situações, todas são mostradas ao mundo através da televisão, dos jornais, dos sites, das redes sociais.

No entanto, como sempre, vejo pouca tomada de consciência face à real razão do problema que, para mim, claramente, está na crise de valores que vivemos desde o início deste século e que nos tem vindo a destruturar, e ainda bem, as bases em que a sociedade estava a ser construída. Contudo, também é preciso reconstruir esses pilares, com o impulso correcto, focado e direccionado a um bem-estar, a uma felicidade, a um crescimento, não económico, mas sim pessoal e social.

Construímos uma sociedade onde falta o respeito mútuo, o estender a mão, não como uma esmola, como caridade, mas sim com a noção profunda de que sozinhos podemos chegar rápido, mas dificilmente chegaremos tão longe como quando vamos acompanhados. Preferimos ajudar as instituições de caridade a meter a mão na consciência e compreender o que podemos fazer de diferente, como podemos ser diferentes, pois, na verdade, o problema não está nos outros, mas sim em nós mesmos.

Na verdade, acredito que o maior problema com que temos de lidar é a falta de respeito por nós mesmos, por quem somos, pelo que acreditamos, pelo que pretendemos atingir, pela nossa unicidade. Quando vivemos nessa frequência, duas coisas acontecem. A primeira é a de que não podemos esperar também que os outros nos respeitem, pois não podemos pedir aos outros algo que não damos a nós mesmos. A segunda é a de projectarmos para o mundo exterior a fonte dos nossos problemas, sem nos responsabilizarmos e sem percebermos que também estamos a contribuir para o funcionamento desta rodinha do hamster em que nos movemos diariamente.

Acredito também que cada um pode dar algo de único ao mundo em que vivemos, mas, para tal, também cada um tem de acreditar nessa sua essência, tem de acreditar em quem é, tem de se respeitar tão profundamente que nada nem ninguém o deitará abaixo, pois muitos são os que tentam deitar abaixo, pois alguns os convencem que os que estão errados são aqueles que querem marcar a diferença, e os certos aqueles que todos os dias se alimentam desse medo.

Confúcio dizia: «Respeita-te e outros te respeitarão.» Essa é uma enorme máxima, que implica compreender que respeitarmo-nos é reconhecer as nossas origens e o nosso legado, dar quem somos sem barreiras ou restrições, elevar a nossa identidade e a nossa individualidade, mas, ao mesmo tempo, pelo nosso exemplo, puxar outros connosco, pois o mundo precisa de exemplos, de diferença, de acreditar. Respeitarmo-nos é saber quem somos, de forma tão forte e focada, que nada nos corromperá, nem deste mundo nem doutro qualquer, pois, assim, tornamo-nos no fino bambu, que o vento balança e verga, mas dificilmente quebra.

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