Há dias assim, em que o sol não parece ser o sol, em que a luz não queima nem aquece, um sol fraco com uma luz tão branca que parece ilusão, como uma luz de brincar. O sol fora do café, a tentar entrar pelas janelas, fraco, enquanto tu seguras numa chávena pequena que cheira a quente e a conforto. Eu continuo a olhar para ti, e tu não dizes nada. Nem sequer olhas para mim. A luz, o barulho, o ambiente… tudo me faz sentir que é um daqueles dias em que a nossa vida muda, um daqueles dias em que pensamos “como é que o mundo pode continuar a girar?” porque o que nos aconteceu foi tão importante que precisávamosmos de um botão de stop. Uma morte, um acidente, uma decisão sem volta atrás.
De repente fico com medo. Penso se quererás ir embora, deixar-me; se me vais contar que tens um amante. Afasto esses pensamentos da cabeça, tento ser melhor que eles, mas a verdade é que te amo tanto que tenho medo de te perder. Não penso muito nisso, só que hoje… hoje sinto que tenho de pensar.
Será que morreu alguém? Não, penso que estarias a chorar. Não foram os teus pais, nem os teus irmãos, nem ninguém da minha família. Estás calma demais para uma morte próxima. Mas talvez alguém mais afastado, talvez alguém esteja doente e tu ainda estejas a tentar perceber como me dizer. Sinto-me a suar e a tremer de ansiedade, mas quero dar-te tempo e deixar-te falar, não te quero forçar. Será que alguém está doente? Serás tu? Será que isso te está a fazer filosofar sobre a vida? Não pode ser, pareces-me serena.
Pergunto-me se te terás finalmente despedido desse trabalho que odeias. Ou talvez te tenham despedido. Olho para o relógio: são 11 da manhã. Eu estou de folga, mas tu deverias estar a trabalhar. Talvez tenhas sido despedida e não saibas como me dizer.
“Sabes que o que quer que tenha acontecido, estamos juntos!” digo-te. Olhas de leve para mim, como se roçasses os meus olhos com os teus, como um toque suave com a ponta dos dedos, e sorris de forma enigmática. Desvias os olhos ainda, como se precisasses de estar sozinha comigo. Sozinha dentro de ti comigo cá fora, a acompanhar a tua solidão, ou talvez a minha. Sorriste à minha afirmação, por isso tu sabes que estou aqui para ti.
OK, chego à conclusão que não é nada de mau, pelo teu sorriso. Não foste despedida, e quero acreditar que ainda me amas. Talvez um novo emprego? Saíste mesmo desse lugar que tanto mal te fazia? Uma proposta de trabalho do estrangeiro? Fico nervoso, não sei se isso será o melhor, quero ver-te feliz, mas também te quero egoisticamente ao meu lado. Não é uma doença nem uma morte. Só podes ter mudado de emprego e não me disseste.
Sorrio para ti, como se fosse uma pergunta. Sorrio ansiosamente, com felicidade, quero que me vejas bem por ti, quero a tua confiança. Ponho a mão em cima da mesa, perto de ti, palma virada para cima à espera da tua. Tu olhas e dás-me a tua mão. Pousas a chávena de café.
“Estou grávida.”