Shein, a empresa de moda rápida com sede na China, enfrenta desafios significativos. Acusada de desperdício e de exploração da mão-de-obra nas fábricas associadas, vê surgir a concorrência ao virar da esquina. Pronunciada em inglês “she-in”, a gigante chinesa foi fundada na cidade de Nanjing em 2008 por Chris Xu, um empresário nascido nos Estados Unidos e especialista em otimização de motores de busca. Inicialmente não se chamava Shein e sim ZZKKO. Só em 2015 a marca adota a designação atual.
Ao longo dos anos, a Shein passou de uma empresa chinesa de vestuário de baixo custo para um gigante global da moda exclusivamente online. As vendas recentes aumentaram de forma meteórica; dos 10 bilhões de dólares em 2020 (segundo a Bloomberg), a empresa apresenta resultados de 100 bilhões de dólares em 2022. O crescimento dos últimos anos fez com que se tornasse uma das mais reconhecidas empresas têxteis do mundo em termos de quota de mercado. Em 2021 marcou presença no Top 10 na Europa Ocidental como a que que cresceu ao ritmo mais rápido, muito à frente das restantes.
A estratégia da Shein: Modelo de negócio, redes sociais e influencers
O modelo de negócio baseia-se em roupas muito baratas, como a Primark, centrado no público da Geração Z. A marca chinesa criou um nicho para si própria nos armários ocidentais. Ao ponto de ameaçar o reinado de gigantes como a Zara ou H&M sem sequer ter lojas físicas.
A Shein é um fenómeno global ao conquistar uma base de clientes fiel dentro da Geração Z. Focada nas redes sociais, especialmente no Instagram e TikTok, baseia a comunicação com clientes no uso de influencers. No TikTok, a Shein morde os calcanhares da Zara com 7,6 milhões de seguidores em comparação com 8,2 milhões para a marca espanhola. No Instagram ainda está atrás, quer da Zara quer da H&M, mas a aproximar-se: 29,5 milhões de seguidores para a marca chinesa em comparação com 38 milhões para a sueca e 59 milhões para a espanhola.
A empresa usa o método ‘tentar e repetir’ para se manter a todo o vapor. Por outras palavras, acrescenta continuamente uma grande variedade de artigos à sua APP mas em pequenas quantidades e apenas aumenta a produção dos que são bem-sucedidos em termos de vendas. Com este modelo ultrarrápido a empresa controla o inventário e reduz o risco de obsoletos.
Outros dois pontos-chave determinantes no sucesso do negócio são o baixo preço dos produtos e a utilização dos Correios para entregas. Isso permite que em grande parte das situações os envios não estejam sujeitos a taxas de importação, ao contrário do que acontece com outros gigantes das vendas online que utilizam outros métodos de embalagem e entrega.
A Shein tem também um programa chamado Shein X que recruta jovens designers acabados de sair das universidades. Oferece-lhes a oportunidade de conceber um pequeno número de peças de vestuário e de as lançar no mercado. A originalidade consegue-se barata uma vez que são jovens ainda sem provas dadas no mercado.
Desafios éticos e de sustentabilidade: Críticas às condições de trabalho e impacto ambiental da Shein
As críticas à Shein são mais visíveis dado o sucesso de que a marca goza. O crescimento rápido e a expansão global tornam as suas práticas cada vez mais escrutinadas. Especialistas em ética e sustentabilidade afirmam que os trabalhadores, muitas vezes mulheres, são submetidos a condições precárias para permitir que a empresa maximize os seus lucros e minimize custos. Enquanto os clientes podem desfrutar da conveniência e dos preços baixos é importante reconhecer as implicações negativas que estão escondidas nessas ofertas.
Uma auditoria realizada pela empresa aos seus fornecedores revelou grandes problemas de segurança. Dos quase 700 fornecedores auditados, 83% operavam com “riscos importantes”. Essas violações variavam desde problemas relacionados com a preparação para incêndios e emergências até horas de trabalho excessivas. A gravidade destes resultados aumenta quando 12% dos fornecedores cometeram violações de “tolerância zero”, incluindo trabalho infantil, trabalho forçado e problemas graves de saúde e segurança.
A Shein reagiu a estes resultados e no início deste ano divulgou o seu próprio relatório de sustentabilidade e impacto social no qual se compromete a utilizar têxteis mais sustentáveis e divulgar as suas emissões de gases de efeito estufa. Vai disponibilizar formação nas áreas de Higiene e Segurança aos fornecedores que cometeram violações graves e afirma que poderá encerrar parcerias com aqueles que não resolverem os problemas. Os defensores dos direitos dos trabalhadores argumentam que isso não toca a raiz do problema. Afirmam que as empresas de moda rápida, como a Shein, são os grandes responsáveis por pressionar os fabricantes a produzir cada vez mais rapidamente a preços baixos, o que torna as más condições de trabalho e os prejuízos ambientais quase inevitáveis.
A empresa enfrenta um enorme escrutínio ético, por um lado, e, por outro, outras empresas copiam agora este modelo de negócio que prescinde de lojas físicas. Estará a Shein preparada quer para a concorrência, quer para o julgamento do seu principal público-alvo – a geração Z – que cresceu a ouvir lições de Greta Thunberg?
Outro desafio que a Shein enfrenta é a possibilidade de usar têxteis provenientes de Xinjiang, uma região chinesa associada ao uso generalizado de trabalho forçado pela população uigur. Não há provas concretas de que a marca venda produtos fabricados nesta região mas a probabilidade existe. Tal como para outras marcas mundialmente conhecidas como a Zara, a H&M, a Adidas e a Nike. A cadeia de abastecimento no oriente é muito complexa e utiliza modelos de subcontratação que podem ocultar a origem completa das peças.
A legislação nos Estados Unidos da América proibiu a importação de produtos fabricados em Xinjiang mas é difícil cumprir a lei em encomendas enviadas por correio. A União Europeia não possui uma lei específica mas tem expressado reservas quanto às violações dos direitos humanos na região e tomou medidas. Em 2021, a UE impôs sanções a indivíduos e entidades chinesas envolvidas em quebra de direitos laborais em Xinjiang. Essas sanções incluíram a proibição de viagens e o congelamento de ativos. Para além disso, a União Europeia trabalha pela transparência e responsabilidade na cadeia de abastecimento global para garantir que os produtos importados não tenham sido produzidos com recurso a exploração da mão-de-obra. Já no último trimestre de 2022 a Comissão Europeia propôs a proibição da entrada na UE de produtos comprovadamente produzidos nessas condições. Mas a verdade é que as encomendas desta chamada moda rápida continuam a encontrar os destinatários na Europa.
A Shein também enfrenta críticas em relação ao roubo de design. Vários designers independentes denunciaram que a empresa copiou as suas criações sem autorização para aplicar esse design nas peças vendidas pela marca. Há vários casos expostos nas redes sociais desde 2021 mas não se encontram referências a condenações por plágio. Sabe-se que no caso do uso indevido do símbolo da Levi’s em camisolas vendidas pela Shein, a Levi Strauss abriu um processo em tribunal mas as marcas terão chegado a acordo e a verba nunca foi divulgada. Outras acusações, caso tenham tido fundamento, tiveram certamente o mesmo desfecho e não chegam a julgamento.
Regulamentos e expansão internacional: Adaptando-se às restrições aduaneiras e à nova realidade dos mercados
E eis que recentemente surge a marca Temu. Uma plataforma de compras online que pertence ao gigante chinês PDD Holdings ligado ao comércio eletrónico. A Temu tem um objetivo de vendas muito chamativo para os resultados de 2023 na América do Norte. A marca pretende chegar a, pelo menos, um dia de vendas que supere os resultados da Shein. Isto entre o passado mês de Março e o 1º de setembro deste ano. Foi no primeiro dia de setembro de 2022 que a marca entrou nos Estados Unidos e essa é uma data simbólica para a marca. A Temu sabe que a Shein é a sua maior rival no curto prazo e pretende ultrapassá-la nos próximos anos.
Como reage a Shein a estas movimentações? Em dezembro de 2022 foi divulgado que a Shein explora a possibilidade de se transformar numa rede global de mercado online. A ideia é permitir que outros comerciantes vendam diretamente em vez de estarem dependentes da marca Shein. De acordo com um memorando para investidores publicado no The Wall Street Journal:” Essa plataforma de mercado disponibilizará uma variedade de mercadorias e opções de envio adicionais com o objetivo de criar um maior envolvimento e satisfação dos clientes”.
Então, se a Shein não é imparável, também se conclui que não está sentada à espera do cumprimento dos objetivos da concorrência. E nem estancou perante o potencial estreitamento de regulações de comércio internacional que a possam limitar. Atualmente com sede em Singapura, a Shein começou a fabricar na Turquia e está a alugar e operar armazéns na Polónia. Desta forma envia encomendas para a Europa sem restrições aduaneiras.
Preço, poder de compra e a busca pelo equilíbrio: Desacelerar sem comprometer a competitividade da Shein
A marca continua a ganhar popularidade em todo o mundo, especialmente em países como França, Irlanda, Islândia, Egito, Sudão, África do Sul, Arábia Saudita e China. Quando Drew Afualo, uma influenciadora do TikTok com quase 8 milhões de seguidores, enfrentou críticas online por colaborar com a Shein, ela defendeu a parceria e argumentou que “nem todos podem comprar apenas com base em critérios de sustentabilidade”. “A moda sustentável é um privilégio”, escreveu a jovem de 26 anos em resposta. E não é mentira. Não esqueçamos que vivemos um ciclo em que as economias no mundo ocidental se ressentem devido à taxa de inflação em crescendo e à diminuição do poder de compra. Neste contexto, o preço importa.
O sucesso passará por desacelerar a moda rápida, mas sem um incremento de preço que a coloque ao nível de outras marcas; talvez apenas levantar um pouco o pé do acelerador.
A Shein tem a oportunidade de liderar uma mudança positiva nesta indústria se adotar práticas mais sustentáveis e garantir condições de trabalho justas. Se provar ao mercado que age em nome dessas preocupações e que trabalha com respeito pela propriedade intelectual, a Shein será bem-sucedida.