Liberdade, palavra doce e com som musical. Liberdade, o custo e sangue que tantos derramaram e outros, os mais novos, esqueceram. Liberdade, a luta que ainda não parou e que voltou. Liberdade, o que leva tantos a quererem que seja cortada, estilhaçada, vilipendiada e assassinada.
Estamos a comemorar quase meio século de Liberdade e nunca este vocábulo teve tanto sabor como agora. Em nome da suposta liberdade, tudo se corta e, mais grave, proíbe. Onde reside, então essa dita liberdade? Numa clausura de nome prisão e que aprisiona os que a amam e defendem? Onde se fecham as vozes que gritam sem medo?
Não restam mais cavaleiros andantes para salvar as suas damas, mas a informação, a que é real e verdadeira, deve chegar a todos. O tempo do lápis azul, um triste eufemismo usado para se falar da censura, já devia ir longe e ter ficado fechado num passado que serve para retirar as devidas ilações.
Contudo, está bem vivo e os que querem ser honestos e sinceros correm o sério risco de serem espancados e, quem sabe? queimados em praça pública. A verdade é apenas uma e não existe a minha, a tua nem a de mais ninguém. É a verdadeira. Verdade é um grito que não pode ser mudo.
Já houve jornalistas que fizeram cair pessoas poderosas por terem provado as suas artimanhas e falcatruas. Alegavam os visados, pensando nunca serem apanhados em flagrante provado, que estavam inocentes. Também o clamava o maior carrasco e, no entanto, continuava a matar, cumprindo ordens, dizia ele.
Mal vai uma sociedade que se deixa comprar por um pacote de bolachas e um sumo doce. Com isto pretende-se afirmar que as cunhas e as bajulações, as ditas graxas, sobrepõem-se ao mérito e ao valor. O lápis azul é o instrumento para os censores decidirem o que deve ser noticiado ou divulgado.
A Comissão da Censura, do antigo regime, o salazarista, tinha um enorme poder nos seus funcionários. Eram eles que desempenhavam o papel de ler e avaliar tudo o que poderia, ou não, ser publicado. Assim sendo, os jornais eram obrigados a enviar a esta comissão quatro provas de página e a não deixarem em branco o espaço das notícias censuradas, que seriam a sua maioria.
Mais tarde, com Marcelo Caetano à frente do governo, numa Primavera frouxa, esta muda de nome para Comissão do Exame Prévio, mas, na prática, mantém o mesmo lápis e o mesmo sentido censório. Como se costuma dizer na voz popular, só mudaram as moscas pois o recheio putrefacto seria o mesmo e com vontade de ficar.
Se a esperança teve força nesta época, num ápice desapareceu deixando um rasto de tristeza. Tudo o que se desejou caiu por terra pois a falta de coragem, ou a mera e simples manipulação, ocupou um lugar de destaque em todas as vidas, que tiveram que se sujeitar a um regime podre e que não queria mudar.
A Liberdade de imprensa é um direito. Existe para que se informe a população de tudo o que se passa no seu país e no mundo. A Liberdade de imprensa não cria raízes nem laços com poderes políticos sejam eles quais forem. Exige-se isenção, como primordial e verdade, a tal palavra que se alia a liberdade. Como se pode anuir que existam mordaças e palas nos olhos?
Será possível que se permita que os órgãos de comunicação social sejam afectos a quem quer que seja? Se os partidos ou qualquer agente, puderem controlar a verdade, é um sinal muito grave de doença aguda social. Padece de uma espécie de cancro que vai minando as bases até chegar ao topo. Ou será que começa pelo topo?
Um jornal é um agente público que presta um serviço colectivo e eficaz. Tal como uma revista, digna desse nome, ou ainda qualquer outra forma escrita de divulgar os passos da humanidade. O lápis azul está de volta ou há sangue vivo e forte, para derrubar as barreiras e seguir até à meta final, mesmo que daí possam vir a ocorrer consequências de carácter irreversível?
Um jornalista é o instrumento, o ser vivo que mexe, remexe, volta a mexer e depois de bem baralhado, dá o naipe que importa para que o jogo prossiga com as regras certas. O mesmo se aplica ao articulista que, em bom português, sabe como escarafunchar no que interessa e partilha com quem sabe e quer ler.
Saber ler é interpretar, essa arte quase caída em desuso. Nos tempos idos da Idade Média, as cantigas de escárnio e maldizer, tinham o condão de fazer rir e ridicularizar, em praça pública, os vícios privados das figuras proeminentes. Estaremos de regresso às trevas?
A Liberdade certamente que continuará a passar por aqui e as portas que, um dia, foram abertas, de par em par, jamais poderão ser fechadas para que a tão desejada informação, a verdade e a isenção continuem a brilhar. Quem censura é um ditador e a Liberdade não tem amarras!
A escrita tem um poder fantástico!