“I like to be in America, Okay by me in America”
Estes versos ecoam no imaginário coletivo e nem todos temos presente que pertencem ao grande musical da Brodway – West Side Story (WSS) –, um Romeu e Julieta made in NYC, epítome da imigração americana dos anos 50 e 60.
O filme parte da rivalidade territorial entre dois grupos, os Sharks, grupo composto por porto-riquenhos recém chegados, e os Jets, descendentes anglo-saxónicos, “americanos de verdade” e proprietários do pedaço oeste da Big Apple, degradado e em vias de ser outorgado à classe burguesa.
2021 permitiu levar aos cinemas o remake do filme de 1961, através do argumento de Tony Kushner (baseado na obra original) e das lentes de Steven Spielberg. De Spielberg? Há algum género em que ele não ponha as mãos? Bem, segundo ele faltam os westerns! Desta vez, o seu arrojo focou um musical – género menos consensual -, com a premissa de o revitalizar ao incluir atores latinos no casting, ao aprofundar os dramas pessoais das personagens (para uma maior conexão?) e ao proporcionar igual tempo de ecrã entre gangues (um brinde à equidade, ausente na versão homónima de 61). A exploração da xenofobia, da pobreza e delinquência juvenil condensam a teia do drama musical.
Vi o filme na semana passada naquela louca demanda pré-Óscares, e antes disso questionei-me, se devia visualizar primeiramente o seu antecessor. Neguei-me a isso, queria descolar-me de qualquer comparação e ir de espírito livre.
A cena inicial fez-me duvidar de imediato que estivesse a ver a versão mais recente. “– Obrigada, Spielberg por me transportares para a época do filme e para Nova Iorque!” Gostei deste punch dos fifties na fotografia, da lens flare (por vezes, um pouco abusada) e dos cenários ora opacos e sombrios em contraste com um vigor colorido e celebrativo, ainda assim, insuficientes para instigarem o meu sistema sensorial.
“E o que mais gostaste?”
Diria que pouco. O casting é efetivamente talentoso e representativo mas… faltou-me algo ali. Saliento a inclusão de duas novas personagens: Anybodys, interpretada por Iris Menas, uma personagem não-binária em luta pela pertença no grupo dos Jets, e Valentina, interpretada pela atriz Rita Moreno (a Anita do primeiro elenco de WSS que ganhou um Óscar com esse papel), que vive a dualidade de quem pertence às duas comunidades e não quer tomar partido.
Além disso, tenho a destacar sem dúvida alguma:
- As coreografias insanas de uma energia incrível que faz falta nos argumentos e até nas disputas corpo a corpo. A música e vestuário exultam sobretudo a vibe latina que faz qualquer pessoa arregalar os olhos e ter vontade de ir de férias para um país desse meridiano cultural;
- A personagem Anita, brilhantemente interpretada por Ariana De Bose. Uma entrega e força total. She makes it happen in every scene;
- A voz angelical e a presença da protagonista Maria (Rachel Zegler), debutante nestas Em contraste com Tony (Ansel Elgort), o seu par romântico e (bom) pendent vocal, que de resto é totalmente perdulário, sem textura, um Ken;
- O rufia-mor dos Jets, Riff (Mike Faist) que encarna satisfatoriamente o sacaninha territorial pré-rockabilly e o rufia-mor dos Sharks, Bernardo (David Alvarez), defensor da honra porto-riquenha;
- Já mencionei a Ariana DeBose? Já, e repito propositadamente: simplesmente mag-né-ti-ca. Nomeação para óscar de atriz secundária mais do que justificada.
Chegada ao fim, e depois de ver o filme original, sinto que Kushner e Spielberg (re)contam uma versão mais representativa e inclusiva em termos de género e etnia. Há mais cenários de luz, ouve-se mais espanhol e há uma visão empoderada do imigrante e do seu papel na construção de Nova Iorque. Contudo, considero o filme olvidável e questiono a nomeação para os Óscares se não fosse um remake de um clássico sobre a chancela de Spielberg, porque passados uns dias só recordo a coreografia ao som de “La, la, la, la, la, America”.
Não fiquem amargos com a minha opinião, mas, numa era com demasiado conteúdo para anos de vida útil, considero este WSS relevante para os amantes de musicais, para o debate da identidade americana e quiçá para cinéfilos de temporada Oscariana porque torna fácil escolher o(s) preterido(s).