Babel

É uma história complicada que resulta dum incidente trágico e que gera uma cadeia de acontecimentos em quatro famílias e em quatro continentes. O que parece impossível de acontecer torna-se o cenário mais macabro e assustador que estas pessoas acabam por viver.

Certamente que o nome terá sido atribuído devido ao facto da língua se tornar uma barreira e a própria cultura ser limitante. Todos têm histórias diferentes para contar, mas a que os une é, no mínimo, estranha e muito perturbante.

Numa zona de Marrocos, nas montanhas, uma família sobrevive do negócio de cabras. Os filhos mais velhos são pastores, uns meros adolescentes, mas a vida é dura e firme. Como forma de se defenderem dos predadores que atacam o rebanho, o pai compra uma espingarda a um vizinho que costuma ser guia em caçadas. Esta foi-lhe dada por um japonês como uma forma de agradecimento por uma generosa caçada.

Os miúdos disputam a pontaria e numa brincadeira ridícula um tiro é disparado e acerta numa americana que está num autocarro repleto de turistas de várias nacionalidades. Pensa-se que é um atentado terrorista e gera-se o pânico entre todos. A aldeia mais próxima não tem condições e aguarda-se a chegada de uma ambulância.

Nos Estados Unidos uma ama mexicana cuida com desvelo e amor dos seus meninos americanos que viu nascer e crescer. O casamento do filho, em Guadalupe, é no dia seguinte e ela faz questão de estar presente. Recebe a notícia que a patroa foi baleada e que está mal. Tenta desesperadamente que alguém cuide as suas crianças naquele dia.

O sobrinho vai buscá-la e ela acaba por levar os preciosos meninos consigo. Divertem-se todos e o casamento é uma festa de arromba. Ao invés de ficar no México decide regressar nessa noite e na fronteira as coisas complicam-se, porque ela não tinha autorização dos pais para levar os menores para fora do país. É considerado um rapto. Em desespero o sobrinho foge e ficam no deserto.

Percebendo que terá de buscar ajuda urgente, vê-se na condição de abandonar as crianças. Consegue que a polícia a encontre e os meninos são resgatados em situação dramática. No final é repatriada, mesmo com tantos anos de Estados Unidos, de modo a esquecer o incidente.

É terrível a cena onde se reencontra com o filho. Ainda tem o vestido que levou ao casamento, um momento tão feliz, mas que redunda numa situação tão negativa. Não mais saberá dos seus amados meninos e terá de recomeçar uma vida estranha e mais que ingrata.

Em Tóquio, conhecemos uma adolescente surda-muda que se tenta encontrar. A mãe já morreu e o pai tudo faz para que ela leve uma vida normal para a sua idade. Sente-se diminuída e aproveita-se da sua sexualidade para se expressar. Está perdida na vida e o pai ainda navega em águas mais incertas.

A mãe suicidou-se, com um tiro, sendo a filha a pessoa que a encontrou. A polícia procura-o, mas o assunto é outro. Querem saber se tinha uma espingarda com um determinado calibre. Ele diz que sim, mas que a ofereceu a um guia marroquino há muito tempo. Já não caça e desde que ficou viúvo que a sua vida se alterou.

A jovem fragmenta-se e busca a sua identidade, o seu mote de vida. Não será diferente por ser surda, mas sim, porque é órfã de mãe e sente imenso a sua falta. Um hiato que nunca poderá ser preenchido e que o pai, muito a medo, avança e recua com o seu amor. O verdadeiro e sincero.

Ficamos a saber que os americanos estavam de férias para esquecer um evento atroz da sua vida: a morte de um filho bebé. Ele acusa-a de incúria e ela de abandono. No meio da desgraça do tiro percebe-se o amor que os dois vivem e a forma altruísta com que ele a cuida. Aquilo que procuravam acaba por ser encontrado de modo bem negativo.

A polícia marroquina descobre quem tem a espingarda, depois de “interrogar” o antigo guia. A família já saiu do seu local e fica aprisionada nas montanhas. O filho mais velho é atingido numa perna e torna-se impossível prosseguir. O mais novo, rapaz inteligente e desembaraçado, assume a culpa e pede para salvarem a vida ao irmão.

Um apelo tão forte e tão estranho que deixa as autoridades estupefactas. O mesmo que a menina japonesa faz com a sua vida e sabe que será cuidada quando o pai a abraça. O abraço que o filho dá à sua mãe, no regresso não desejado ao México, de onde havia saído. E sabemos, então, que os americanos se amam quando ele lhe pega ao colo e, contra todas as adversidades, consegue salvar-lhe a vida.

Uma história de desamor, de solidão e de filosofia que redunda no sentimento maior: amor. Interpretações magistrais que nos levam a pensar como seria o nosso comportamento se tudo acontecesse do mesmo modo à nossa frente.

Share this article
Shareable URL
Prev Post

Seis graus de separação

Next Post

Sobre a Coragem de se ser Feliz no Século XXI…

Deixe um comentário

O seu endereço de email não será publicado. Campos obrigatórios marcados com *

This site uses Akismet to reduce spam. Learn how your comment data is processed.

Read next

Ted 2

Seth MacFarlane incutiu uma parábola na sua primeira longa-metragem, um homem impedido de crescer, devido à…

As avós nunca morrem

No tempo em que a minha avó ainda por cá morava, tudo se resolvia com a maior das facilidades. Onde ela…