Se há época em que não me canso de viver é a minha. O mundo transforma-se a cada segundo perante os meus olhos que já não se contentam com fotografias incolores e descobertas sem sons. Hoje queremos mais do que pensávamos ser possível ter, á uns meros 15 anos atrás. Esta é a década das descobertas, quando tudo já foi criado.
Desde o estrear de filmes em tempo recorde, passando por momentos presenciados ao minuto, não por uma ou duas famílias de telespectadores, mas por todo um globo, este é o momento em que tudo que acontece no típico e aborrecido quotidiano é surpreendente. As últimas décadas deste século XX presenciaram certamente uma evolução mais intensiva que qualquer outro século se poderá orgulhar. É certo que, ainda, não experienciou nenhuma revolução ou qualquer catástrofe digna de “atómica”, mas experienciou aquilo que nunca se pensou: uma aldeia global.
A aproximação rápida, de todos os lados, de todos os continentes já torna muito científico a simples referência ao “norte” e ao “sul”, ao “oeste” e ao “este”. Uma autêntica globalização, acontecendo pelo mundo inteiro, fazendo-o agir tal e qual o seu formato: uma bola que gira e vai rebolando, sem nunca parar, e sem ser possível distinguir o seu início do seu fim. Não que as diferenças tenham deixado de existir, mas cada vez mais é aquilo que nos une do que aquilo que nos separa (já cantava a eterna voz enrouquecida de Rui Veloso, ao recordar o Primeiro Beijo). Numa aparente onda de paz e curiosidade, sem a qual o ser humano nunca teria descoberto para que serviria uma pedra – lá se iria o fogo e a roda -, os povos aproveitaram a liberdade extrema de fronteiras territoriais, a superior liberdade de expressão e os meios de comunicação mais avançados – este mesmo que me permite escrever, hoje, para vocês, caros leitores – para se porem em contacto. Afinal, se nos queremos criticar e perceber em que falhamos nada melhor do que desenvolver a tal “empatia” que a humanidade por vezes se esquece. A globalização permitiu-nos trazer de volta o carinho dos povos – digno de um canto celestial ou milagre abençoado – e uma maior atenção a quem nunca teve esperança de se explicar, pelos seus costumes e a sua cultura.
Mas nem tudo são pétalas, porque até a bela rosa é feita de espinhos. Um autêntico pau de dois bicos, esta globalização que nos invadiu os rádios com musicas estrangeiras – do qual o leitor, provavelmente, não entende nada da letra -, as televisões com programas, supostamente, de entretenimento, mas que não se enquadram nem um pouco na nossa cultura e que nos causa sentimentos de choque e frustração. Mais do que isso, comprar roupa tornou-se algo diferente e um pouco como ir para uma guerra: qual fazer á “sua medida”, como a costureira ou a sua mãe tanto insistiam; esta é a época onde tudo vem pronto e o corpo deve adaptar-se ao formato das peças de vestuário. Uma uniformização que nos invadiu as paisagens, com cada vez mais prédios altos, quais monumentos magníficos e imponentes que transpiram frieza e impessoalidade. Os Estados Unidos lá vão sendo fintados pela China e, entre uma coca-cola e um arroz chao-chao, digamos que ser português é algo menos importante.
No meio disto tudo, muitas culturas vão ganhando destaque. E já que estamos na época em que as revoltas acontecem, na maioria, em livros – estilo 007 e Hunger Games – vai nascendo um movimento que prima pela originalidade. Chamam-lhe de Glocalização e juram que nada mais é do que ser criativo através das suas raízes. Uma criatividade que muitos poderiam obstar por nada mais ser do que o repetir de muitas tradições e o regressar de muitas outras. Porém, neste mar de calças justas de ganga, confesso que usar as saias tradicionais de rancho me parece não tão só um acto de ousadia, como de verdadeira originalidade.
Entre tachos e copos, lá se vai produzindo uma mistura de tudo um pouco que, por fim, se serve. Neste momento, estamos todos na cozinha, ainda a preparar uma fornada de algo que ninguém sabe bem o que é, mas que todos vão contribuindo com o contacto multicultural e constante fluxo opinativo, sobre tudo um pouco. Só os próximos 15 anos nos poderão revelar, prato por prato, o que daqui sairá. E você, caro leitor? Pronto para juntar o seu tempero único ao mundo?