The Habitat Podcast- Humanos em Marte, e agora?

Perdida algures, numa montanha do Hawai, uma cúpula de branco imaculado distingue-se por entre as rochas negras empilhadas e o terreno avermelhado de um vulcão adormecido. É neste sítio inóspito que a NASA, desde 2013, está a levar a cabo o projecto HI-SEAS (Hawai’i Space Exploration Analog and Simulation). O objectivo é, da maneira mais realista possível, simular o dia-a-dia de astronautas em Marte.

Vista do Habitat

Vim a saber deste projecto muito recentemente, através do podcast The Habitat, pela Gimlet Media. São 8 episódios, cada um de cerca de meia hora, perfeito para se ouvir numa longa viagem de carro entre fronteiras, ou no comboio a caminho do trabalho. No meu caso, ouvi-o de uma assentada só, entre Lisboa e Alicante (Espanha). Acreditem que tornou a morosa viagem, infinitamente mais suportável.

O podcast, publicado em Abril de 2018, tem como host a divertida Lynn Levy, uma jornalista que segue de perto o projecto da NASA no Hawaii. Ao longo da duração de um ano, tempo que dura a experiência, Lynn enviou perguntas aos “astronautas” e foi recebendo gravações áudio como resposta do que é o dia-a-dia destes marcianos na Terra. São seis, os habitantes do Habitat. A energética e desportista Carmel Johnston (EUA), que será a comandante da equipa. A cientista Christiane Heinicke (Alemanha). A pragmática Dr. Sheyna Gifford (EUA). O engenheiro aero-espacial Andrzej Stewart (EUA/UK), o cientista Cyprien Verseux (França), e o arquitecto espacial aka “palhaço-da-turma”: Tristan Bassingthwaighte (EUA). Não são astronautas, mas foram cuidadosamente seleccionados para serem o mais parecidos possível. Seis estranhos, todos muito diferentes, enfiados num espaço que não mede mais que 33 passos de diâmetro, durante um longo ano… O que poderá correr mal? Algo género Lord of the Flies, talvez?

Tal como as futuras expedições a Marte, a equipa está completamente por sua conta. Neste ambiente de espaço reduzido, estes seis aventureiros terão não só de aprender a manter a paz entre eles, como também empregar tarefas tão rotineiras como cozinhar para a equipa, manter o espaço limpo ou manter-se em forma (o espaço inclui uma passadeira rolante). Outras menos comuns como amostras de urina ou simular uma sala de descompressão, antes de uma expedição ao exterior, fatos completos de astronautas incluídos e tudo. Lá fora, o ar é venenoso e as temperaturas podem chegar a 100 graus negativos Celsius… isto se acreditarmos que estamos realmente em Marte.

Os quartos “espaçosos” no Habitat

De episódio em episódio, escutamos como o positivismo inicial rapidamente declina. Neste espaço, a privacidade é quase zero. Mesmo fechando a porta dos minúsculos quartos, o barulho arranja forma de entrar, de incomodar. Seja alguém a correr na passadeira, seja um ukulele entusiasmado, seja alguém que grita “Tortilla” todos os domingos, enquanto cozinha o pequeno-almoço… nunca há completo sossego. O espaço apertado começa a parecer como o mundo inteiro e as outras pessoas, as com quem terão de viver até ao fim dos tempos.

A parte mais complicada de uma possível missão a Marte, com a hipotética formação de colónias, não será como lá chegar, como construir as infraestruturas, nem como sobreviver ao ambiente hostil do planeta. Não há nada mais complicado do que o ser humano. Os que decidirem deixar a Terra para trás, talvez em busca de uma aventura, talvez em busca de um significado para a sua existência, não se iludam. Para onde quer que vamos, levamos connosco as nossas coisas, os nossos problemas, as nossas particularidades, enfim, a nossa humanidade. Onde existirem humanos, haverá sempre conflito, faz parte da nossa natureza. O que procura, tão brilhantemente, a NASA com esta experiência é descobrir os meios para reduzir a possibilidade de conflitos e garantir o bem estar humano. Isso vai muito mais além de oxigénio e três refeições por dia… Até agora, apenas uma das 6 missões teve a duração de um ano, sendo a mais recente, de Fevereiro do ano passado, apenas durado 4 dias, devido a um acidente com um dos “tripulantes”.

Ainda estamos um pouco longe de pôr humanos em Marte. Portanto, até lá, deixemos a nossa imaginação divagar pelas colinas desérticas do planeta vermelho, enquanto escutamos este podcast que deixo aqui como recomendadíssimo.

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