Quando nasce uma Mãe

Neste artigo, não vamos falar do nascimento de um bebé. Vamos olhar para o outro pólo e focar-nos no nascimento sim, mas de uma Mãe.

Até que um primogénito filho nasça, uma mulher vive a sua genética feminina. O momento do nascimento de um filho dita como que uma promoção à sua condição humana, elevando-se da mera genética de mulher, a Mãe. Muito mais que um estatuto, é o culminar do nascimento de uma nova forma do ser feminino. Já não se é Mulher, é-se Mãe e, além disso, Mulher também.

É certo e mais que sabido que o assumir do papel de mãe e, tal como por aí se diz popularmente, tudo muda. O Mundo reconstrói-se. As regas reescrevem-se. As prioridades alteram-se. As necessidades modificam-se. E as responsabilidades crescem. No entanto, o que muda afinal? Será apenas a conjuntura apropriada à integração de uma nova vida? Ou irá a mudança muito além da existência de um bebé?

As alterações são muito mais profundas, indo além do tangível, ultrapassando qualquer manual de primeira viagem. Começa sim, uma história interminável, sem proporções, sem limites, cabendo só e infinitamente apenas, no cérebro de uma mãe. Se a imensidão do Universo muda com o nascimento de uma estrela, imagine o quanto muda uma mulher com o seu próprio nascimento, enquanto Mãe. A analogia poderá até parecer algo exagerada, porém, na imensidão de uma Mãe cabe todo o Universo.

De mulher a mãe. O mesmo que, nesta nova Era tecnológica, fazer um upgrade ao software mental de um ser, tornando-o inesperadamente diferente do original, mais apetrechado e rentável.

O cérebro de uma Mãe aos olhos da ciência

A mudança de atitude perante a vida, por parte de uma mulher depois de ser Mãe, é motivo de estudo e curiosidade pela comunidade científica, nomeadamente por parte das Neuro-Ciências. A quase mutação de perspectiva de vida e de estar na vida é tão unanime que se abriu mote para estudos mais aprofundados e detalhados sobre o que realmente muda no cérebro de uma mãe. E, de hipótese em hipótese, se chegou a resultados deveras extraordinários. Na realidade, não muda apenas a acção instintiva de protecção de um descendente inofensivo.

Tudo começa no momento do parto. Tal como refere o neuro-cientista Pilyoung kim, num estudo publicado pelo Institute of Mental Health (EUA). No pós-parto, ocorrem grandes alterações hormonais na mulher. Mediante estas alterações o cérebro torna-se propenso à reformulação com o propósito de dar resposta à existência de um bebé. As respostas que poderão ser interpretadas como instintivas não serão mais do que um reflexo das mudanças que de facto ocorrem a nível cerebral.

Explicam-se, assim, os novos limites de tolerância de uma mulher depois de mãe. Aqueles momentos de angústia, cansaço, privação de repouso inerentes aos primeiros dias de cuidados a um recém-nascido, aquilo que se compara a um reflexo do Amor Incondicional que se vê enraizado na figura materna, cabe nas explicações cientificas.

A verdade é que o cérebro de uma mãe muda, literalmente. Segundo a American Psychological Association, estudos comprovam que crescem áreas ligadas à motivação, justificando os limites alargados ‘do suportável’ para uma mãe. Recorrendo a ressonâncias magnéticas, concluiu-se que, após o parto, em mulheres sem sinais de depressão pós-parto, estas apresentam um crescimento significativo em várias zonas do cérebro. Assim, escreve o neuro-cientista Craig Kinsley: “a motivação para cuidar de um bebé e os traços característicos da maternidade podem ser menos uma resposta instintiva e mais um resultado da construção activa do cérebro.”

Neuro-cientista acrescentam que no caso das depressões pós-parto, poderá implicar-se a redução das mesmas áreas cerebrais. Estudos decorrem nos mesmos moldes para mães adoptivas, quanto ao modo de alterações hormonais que ocorram com o vínculo afectivo e consequentes influências no próprio cérebro.

A Mãe e o Sexo

Além de toda a alteração no padrão rotineiro e rol de preocupações, após o nascimento de uma mãe, é o sexo que ganha pontos quanto a reajustamentos.

Quando antes o casal tinha o foco na parelha, o nascimento de um bebé desvia as atenções para si. Ainda assim e antes de tudo isso, alterações ocorrem no corpo feminino. Quase que uma nova identidade física emerge. Um novo corpo se veste, com mais ou menos alterações estéticas.

A verdade é que estas naturais alterações poderão ser motivo mais que suficiente para uma mulher não se aceitar, ou reconhecer nesse novo corpo que comporta. A dúvida de se ser ainda motivo de desejo físico e sexual poderá apoderar-se silenciosamente e de forma inconsciente, levando à frustração e dificuldade de manter intimidade física com o seu par. Este nível de insatisfação poderá ser mais que suficiente para o desentendimento de um casal.

A organização mental de uma Mãe é quase uma estrutura matemática, onde uma multiplicidade de variáveis entram em jogo e se influenciam. O nascimento de um filho desejado poderá também ser visto como algo de tal ordem sagrado, que se imponha uma rejeição de prazer sexual após o nascimento de um ser quase divino, sendo interpretado como uma atitude pouco digna e de desrespeito.

Soma-se a fadiga, a reestruturação de responsabilidades e o peso social de aproximação ao conceito de mãe-perfeita, imprimem na Mãe uma pressão à qual não consegue fugir. A gestão de todas as condicionantes poderão influenciar a própria libido e consequente disponibilidade sexual.

O assumir da maternidade impulsiona também sensações de plenitude que, associadas a uma gestão equilibrada de todos os factores que a mulher é obrigada a dinamizar, e uma aceitação tranquila das transformações físicas que o gerar de um filho implicam, dão serenidade na sua vida sexual. Muitas são as situações em que, pelo contrário do anteriormente explanado, a mulher se assume mais atraente e sexualmente feliz.

Ainda que possa parecer superficial esta matéria mais física, a verdade é que a forma como é encarado e aceite o corpo, depois do nascimento, dita grandemente a reorganização mental de uma mãe enquanto mulher, influenciando-a em todas as suas dinâmicas relacionais e comportamentais.

Uma Mãe, Um Novo Mundo

Basicamente, com o nascimento de uma Mãe, nasce uma nova mulher.

Aquele ser feminino que se passeava de forma mais ou menos elegante, mais ou menos apressada, mais ou menos descontraída, depois de Mãe traz dentro de si uma tolerância sem limites definidos, todos os seus sentidos mais apurados e mais o sentido de sacrifício de forma voluntária. E, quando se vir uma mulher como que a ignorar o seu cansaço, superando as barreiras da rotina, muito provavelmente é Mãe. E quanto a isso, nada mais haverá a dizer.

No cérebro de uma Mãe, nascem novas e infinitas formas de estar, de ver, de querer, de tolerar, de pensar, de decidir, de se elevar. No cérebro de uma Mãe, cabe todo o Universo. No seu coração, o Infinito. E assim é o cérebro de uma Mãe.

“A maternidade está próxima da divindade. É o serviço mais elevado e sagrado a ser assumido pela humanidade. Ele coloca a mulher que honra seu santo chamado e serviço perto dos anjos.”

David O. McKay

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Comments 2
  1. Fantástico artigo! Sentimentos à flor da pele e um primeiro parágrafo delicioso! Recomendo… sem dúvida! A escrita envolta em emoções… Ana Sírius no seu melhor! 🙂

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