Os 100 anos de Evita

Madonna, uma das mais ilustres moradoras de Lisboa, em 1997, ganhou o Óscar de melhor canção original e também o Globo de Ouro como atriz e também com a canção pelo filme Evita.

O filme retrata a vida de María Eva Duarte de Perón, que nasceu no povoado argentino de Los Toldos em 7 de Maio de 1919, há exatamente 100 anos. Assim como Madonna foi atriz, mas foi também líder política na Argentina, tornando-se primeira-dama daquele país.

A infância de Evita foi pobre, sua mãe, a costureira Juana Ibarguren era amante de um fazendeiro chamado Juan Duarte. O pai de Evita tinha outra família, legítima, na cidade de Chivilcoy, com outros 6 filhos. Depois da morte de Juan em um acidente de automóvel, Juana mudou-se com os filhos, todos do fazendeiro, de Los Toldos para Junin, fugindo das humilhações da condição de amante.

Em 2 de janeiro de 1935, com apenas quinze anos de idade, Eva partiu para a capital, Buenos Aires, onde foi morar com seu irmão Juancito. Passava o dia a procura de trabalho em rádios, revistas e, principalmente, uma oportunidade no teatro e no cinema. Depois de passar fome, se submeter aos assédios de cafajestes do mundo artístico, Eva conseguiu um papel no cinema, no filme “Segundos Afuera”. Nesse filme, no qual teve papel secundário, obtido graças à intervenção de um conhecido, ela pode mostrar ao mundo artístico argentino a total falta de talento para a carreira de atriz. Mas como o destino sempre se impõe, foi na relação com este mundo que ela conheceu um coronel chamado Juan, mesmo nome de seu pai, de seu irmão, da mãe, da sogra, da parteira e da cidade que motivou o encontro do casal: San Juan.

Era o Coronel Juan Domingo Perón. San Juan havia sido atingida por um terrível terremoto. O Coronel Perón, vice-presidente da República e Ministro da Guerra e Chefe da Secretaria de Trabalho e Previdência, organizou, no ginásio Luna Park, em Buenos Aires, um evento artístico para angariar fundos para as vítimas do terremoto.

Eva, que nessa época já tinha um programa de rádio onde declamava versos, participava de radionovelas e falava sobre a biografia de mulheres famosas, foi ao evento acompanhada de uma amiga com quem dividia um quarto de pensão. No evento ela se aproveitou de um ligeiro descuido de uma outra atriz principiante que se sentava ao lado do Coronel na primeira fila de cadeiras, tomou o lugar dela.

Encantada e embevecida por ter ao seu lado aquele homem de 1,90 de altura, porte atlético, sorriso irresistível e envergando um uniforme militar branco impecavelmente passado, ficou com as mãos suando, trêmula, mas segura o bastante para dizer a ele a frase que provavelmente tenha servido para mudar a história da Argentina pelos futuros 40 anos:

– Coronel, obrigada por existir. Era 22 de janeiro de 1944.

No ano seguinte, Perón foi preso por militares descontentes com sua política, voltada para a obtenção de benefícios para os trabalhadores. Evita, organizou comícios populares que forçaram as autoridades a libertá-lo. Pouco depois se casou com Perón, que se elegeu presidente em 1946.

Famosa por sua elegância e seu carisma, Evita conquista para o peronismo o apoio da população pobre, na maioria migrantes de origem rural a quem ela chamava de “descamisados”.

Por causa da personalidade arrebatada e por ser uma defensora incansável dos pobres, miseráveis e explorados, Evita muitas vezes foi confundida como sendo uma militante de esquerda, embora nunca o tenha sido. Ela rejeitava ferrenhamente este rótulo, tendo inclusive muitas vezes se indisposto com os comunistas ortodoxos da Argentina, que viam na ação assistencialista até mesmo um fator de atraso nas conquistas da classe operária. O voto feminino, por exemplo, reivindicação histórica das mulheres comunistas argentinas, foi implantado por um golpe de voluntarismo de Evita. Isso irritou profundamente a militância feminina comunista, que defendiam a tese de que a conquista deveria ser historicamente conduzida. Quando a lei do voto feminino foi sancionada por Perón elas disseram: “agora não queremos mais votar”.

O mais impressionante na história da vida de Eva foi o caminho meteórico que ela percorreu na vida pública. Entre a total obscuridade ao mais absoluto resplendor pessoal e político da vida e em seguida a morte, tudo ocorreu em apenas 7 anos. Nesse curto período, ela saiu do anonimato para se tornar uma das mulheres mais importantes e poderosas do mundo. Na sua breve existência, há muitos mistérios, muitos fatos obscuros mas há principalmente uma personalidade tragicamente marcante.

Às 20h e 25min de 26 de julho de 1952, morre aos 33 anos, de câncer de útero. Embalsamado, seu corpo ficou exposto à visitação pública até que, durante o golpe de Estado que derrubou Perón em 1955, seu cadáver foi ocultado e enterrado no Cemitério Monumental de Milão, Itália. Dezesseis anos mais tarde, em 1971, o corpo foi exumado e transladado para a Espanha. Ali foi entregue ao ex-presidente Perón, que vivia exilado em Madri.

Perón voltou à Argentina em 1973 e foi reeleito presidente, tendo a terceira mulher, Isabelita Perón, como vice. Após sua morte, em 1974, Isabelita trouxe o corpo de Evita para a Argentina onde foi exposto novamente por um breve período. Foi então enterrada novamente no mausoléu da família Duarte no cemitério da Recoleta, na capital argentina.

O filme com Madonna

Quando o diretor britânico Alan Parker chegou a Buenos Aires, no começo dos anos 90, para escolher as locações do filme “Evita” (1996), espantou-se com as pichações nos muros que diziam “Fora Madonna” e “Morte a Alan Parker”.

Seria apenas o início das dificuldades que teria para gravar a história de Eva Perón na Argentina, com Madonna representando a protagonista. Parker foi, então, encontrar o presidente, o peronista Carlos Menem (1989-1999), para pedir ajuda. Relata que, ao chegar à residência de Olivos teve a impressão que estava visitando Marlon Brando nas instalações dos Corleone.

A Madonna também não sabia que boa parte da população argentina não estava lá muito feliz com as filmagens, marcadas por protestos e até ameaças de bomba. Entre os motivos: o Peronismo, uma visão política centrada no apoio ao trabalhador e nos direitos sociais pouco propensa a interpretações estrangeiras do pensamento de Perón; o Mito Evita, que tinha identificação popular, organizou marchas e movimentos de apoio aos trabalhadores e aos mais necessitados e ver uma artista polêmica e extrovertida como Madonna a interpretando causou grande insatisfação entre os mais conservadores. Durante as gravações, Madonna estava grávida de sua primeira filha, Lourdes Maria, o que contribuiu mais ainda para a ira dos peronistas fanáticos, que veem Evita como uma espécie de santa.

Pouco diplomática, Madonna fez críticas aos argentinos. Em entrevista para a revista “Vanity Fair”, chamou o país de “não civilizado” e criticou o comportamento do então presidente Carlos Menem.

A reação do presidente e de peronistas enfurecidos, que atacavam a equipe de Parker pelos jornais e em manifestações, fez com que os produtores pensassem em levar a gravação para outro lugar. Ao final, decidiram fazer apenas algumas cenas nas ruas de Buenos Aires e na cidade de Los Toldos, levando a maior parte do longa para ser filmada em Budapeste, na Hungria.

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