Dezembro novamente. O ano escoa-se por entre os dedos como se fosse água. Evapora-se. O tempo vai e vem, mas o que se viveu não regressa. As neves cobrem as montanhas e o frio entranha-se. É o ano que se modifica e dá lugar ao que virá.
Por esta altura pensa-se em família, doces e prendas. Um hábito tão burguês que a educação judaico-cristã incute em todos. O dar e receber não tem o mesmo valor. O dinheiro não é limitação e faz-se das tripas coração. O depois logo se vê e siga.
Não devia ser assim. É ridículo que se crie uma data para se cuidar dos outros, para se ser humano e empático. É cretino, simplesmente. O homem é um animal social e está tudo dito. O que se passa é que o egoísmo ganhou terreno e recebe o prémio.
Vivemos em sociedade e é preciso saber lidar com todo o tipo de pessoas. Não é obrigatório que se goste de todas, aliás é dispensável, mas a boa educação é essencial. Defeitos todos têm, assim como qualidades e a melhor de todas é a civilidade.
Oferecer por ter de ser não é nada, é preciso que seja sincero e pensado para a pessoa em questão. Todos são diferentes e, por isso, o cuidado é a primeira oferta, o interesse e a vontade de aquecer a alma de quem a recebe.
Os comerciantes aproveitam esta época para equilibrar as contas, para mostrar as grandes novidades e convencer os clientes a comprar. É legítimo já que é o seu modo de vida. O que sucede é o deslumbre e o adulto, muitas das vezes, volta a ser a criança que se encanta com tudo.
Há que ter cuidado para não se cometerem excessos e criar situações aflitivas ou até mesmo complicadas. A ponderação é muito importante, tal como a planificação. O dinheiro, esse vil metal, é um ditador e torna algumas pessoas suas reféns.
Dar tem uma outra simbologia. O carinho e a dedicação remetem para o amor que se tem a essa pessoa, a que se quer presentear. É uma marca que fica, uma recordação que serve para eternizar quem ofereceu. A ligação é forte e tem laços de continuar.
Dezembro volta a ser a azáfama comercial, o juntar dos que se dizem, ou são, familiares e têm genuína vontade de se reunir. Outros terão de fazer um frete, de sorriso amarelo, a suportar o que lhes desagrada, mas fazem-no para não ficarem mal nas fotografias.
Natal é uma marca registada dos Cristãos, que olham para Jesus Cristo como sendo apenas seu e de mais ninguém. Não foi ele, Jesus, que se misturou com todos e não fazia distinção? Não era ele que arrastava multidões? Onde estão os que seguem a sua doutrina?
Esqueçam as datas, que são artificiais e sejam humanos e empáticos. A sinceridade é uma qualidade e quem se dá, de boa vontade, não espera de volta um louvor ou uma prenda. Sente que fez o que estava ao seu alcance e cuidou do seu semelhante.
Dizia o poeta, que Natal é quando um homem quiser e o nascer, milagre de renovação, deve ser celebrado por quem sente que o deve fazer. As datas são meras marcas da passagem do tempo, mas viver é uma constante. Há que o fazer com elegância e charme.
Que bom é estar vivo, ter saúde e ainda muita alegria para a repartir com quem se ama. Para os outros, aqueles que não são tão próximos, o coração continua bastante elástico e sabe, com especial mestria, como albergar quem dele possa vir a necessitar.
Natal é o abraço que se dá quando se sabe que o outro precisa de um porto seguro, de chorar, de rir, de falar e de conforto. Natal é todos os dias. Natal é saber amar. Natal é tempo de pensar e de deixar sair o mais íntimo que cada um possa ter, a alma.