Quer seja no carro, no telemóvel, no computador, em casa ou no trabalho, é pela rádio que ouvimos maioritariamente música e que acedemos aos diversos estilos de música e é pela rádio que ouvimos a maior parte das vezes uma música pela primeira vez.
A forma como selecionamos a rádio ou rádios que ouvimos é aleatória: é pela empatia com a voz do outro lado, pelo nosso estado de humor, pelas circunstâncias da atualidade e pela oferta disponível.
Perante este jogo de combinações, cruzarmo-nos com a música de Capitão Capitão na rádio é uma feliz coincidência.
O Projeto Capitão Capitão nasceu em 2010 pelas mãos e voz de JP Mendes. Até ao início deste artigo, apenas terei ouvido deste músico o tema “O lugar”, na Compilação dos Novos Talentos da FNAC de 2012, e outros temas que integraram o projeto “A música Portuguesa a gostar dela Própria”.
A escolha do alter-ego, Capitão Capitão, surgiu do extrato do poema de Walt Witman, eternizado no filme “Clube dos Poetas Mortos” da década de 90 com a famosa expressão “Oh Captain, my captain!”.
Após o lançamento de dois EP (por curiosidade, EP – Extended Play, gravação demasiado longa para ser um single e demasiado curta para ser um álbum), “Capitão Capitão” em 2011 e “II” em 2013, Capitão Capitão lançou em 2016, através de um processo de crowdfunding, o seu primeiro álbum intitulado “32”.
JP Mendes é um autodidata, influenciado pelas bandas na berra dos anos 90. É arquiteto de profissão e mau em relações. “32” foi lançado no ano em que fez 32 anos. É um álbum de algum modo não biográfico, mas antes uma sumula das vivências e questões etéreas na existência de JP e desaparecimento humano. O álbum “32” revela a inevitabilidade de algo acontecer.
As músicas de JP são melódicas e dramáticas, caraterizam-se por um início expectante e dramático que é perenizado pela parte vocal. Elas criam um espaço. É um desenho de ilusões e desilusões, que se entrelaçam à medida que a música nos entra no corpo.
Quando ouvimos pela primeira vez uma música, procuramos sinais como pêlos eriçados, alterações no batimento cardíaco, adoçamento do rosto, brilhozinho nos olhos, o pezinho a bater, movimentos nos ombros, ou embalarmos no refrão até nos sentirmos confortáveis para verbalizar uma opinião ou arrancar o pé do chão, mas a música é muito mais do que isso. Tem uma parte oculta.
A música não existe, porque gostamos dela. A música existe, porque alguém é impelido a criá-la. A distância entre o momento em que a música é criada e as vivências de quem a cria e o momento em que a ouvimos e as nossas vivências, é uma boa metáfora para o karma do desencontro que este álbum oculta.
A música de JP Mendes não é para se gostar, é para ouvir e vaguear.
E se descobrir a música de JP Mendes é uma feliz coincidência, ouvir uma música nova por dia, nem sabe o bem que lhe fazia.