Estarão as universidades a dar resposta aos novos desafios que o mundo actual apresenta? O que é necessário alterar neste sistema?
O que se passa com a educação superior em Portugal? Será que está assim tão afastado da realidade ou será de facto o nosso ensino superior uma referência?
Sempre tive como opinião que o nosso ensino superior é de referência e que os nossos alunos saem devidamente preparados e com um leque de competências alargado e que os permite estar a par dos melhores do mundo.
Tendo em conta que o meu filho optou por estudar fora, talvez por não ter o curso que queria em Portugal, talvez por uma questão de começar já a estudar no País referência para o seu futuro emprego, ou talvez e tão simplesmente por querer ser autónomo, poder gerir o seu tempo e um part-time num País onde de facto se consegue poupar, eu não sei opinar sobre o estado atual do Ensino Superior.
Contudo, não seria isso que me impediria de escrever sobre o tema. Ora, após ter estado em amena cavaqueira com vários estudantes universitários e ter solicitado a um grupo deles que me respondessem – de forma anónima – a um leque de questões e das quais vos deixo aqui 3 breves amostras, terminarei este meu artigo com as conclusões que este pequeno estudo me permitiu retirar.
Assim, estas foram as questões colocadas:
- Idade.
- Qual a Licenciatura que tiraste?
- E Mestrado?
- Onde tiraste o teu Curso?
- Há quanto tempo concluíste o teu Curso?
- O que achaste mais importante durante a tua licenciatura e mestrado? E o que achaste menos importante?
- Quais as saídas profissionais do teu curso?
- Quando terminaste a tua Licenciatura sentias-te preparada para ingressar no mercado de trabalho? E após o Mestrado?
- Sentes que todas as ferramentas digitais que são aplicáveis à tua formação estavam ao teu dispor?
Transcrevo-vos agora as três entrevistas que foram selecionadas de forma aleatória.
1ª Consulta:
Idade:
24
Qual a Licenciatura que tiraste?
Biologia
E Mestrado?
Biologia Molecular e Genética.
Onde tiraste o teu Curso?
Faculdade de Ciências da Universidade de Lisboa.
Há quanto tempo concluíste o teu Curso?
Terminei a licenciatura em junho de 2015 e o mestrado em novembro de 2017.
O que achaste mais importante durante a tua licenciatura e mestrado? E o que achaste menos importante?
Penso que o mais importante na licenciatura terá sido a abordagem holística, pois tivemos muitas cadeiras que nos permitiam olhar para a biologia de diferentes pontos de vista. Por exemplo, cadeiras de física adicionavam o factor matemático a um processo biológico; já a cadeira de história do pensamento biológico, fazia-nos reflectir acerca de como o método científico se desenvolveu ao longo da História. Isto apenas para referir alguns exemplos. Menos importante na licenciatura terá sido a forma de ensino de algumas cadeiras que se focavam mais no “decorar” matéria do que efectivamente podermos pensar acerca dela. No mestrado, o mais importante foi, sem dúvida, o tempo despendido em laboratório, fundamental para quem pretende seguir carreira nessa área e se sentia em défice durante a licenciatura. No mestrado, não tenho pontos menos importantes a salientar.
Quais as saídas profissionais do teu curso?
Investigação académica ou em laboratórios de biotecnologia, análises clínicas, entre outros. A licenciatura também abre portas para parques naturais, empresas de conservação ambiental e museus de ciência.
Quando terminaste a tua Licenciatura sentias-te preparada para ingressar no mercado de trabalho? E após o Mestrado?
Após a licenciatura não me sentia preparada, pois sentia que me faltavam ferramentas para entrar no mercado de trabalho, sobretudo, por querer algo relacionado com investigação e não me sentir apta a estar em laboratório, dado o número diminuto de aulas práticas, possivelmente por falta de recursos. Após o mestrado e tendo tido dois semestres de trabalho de investigação para a tese que me fizeram crescer muito enquanto cientista, senti-me, pela primeira vez, capaz de entrar num laboratório de qualquer área de investigação e conseguir estar e trabalhar.
Sentes que todas as ferramentas digitais que são aplicáveis à tua formação estavam ao teu dispor?
Penso que sim. Durante o curso sempre tivemos acesso a recursos digitais, nomeadamente a plataforma moodle (e, posteriormente, fénix) onde os professores nos disponibilizavam o material das aulas e outros, mas também nos foi possível aceder a protocolos laboratoriais, a softwares de pesquisa de artigos científicos (NCBI) e a programas de tratamento de DNA (DNASTAR, PRIMERDESIGN, etc.) e dados estatísticos (STATISTICA). Sem qualquer uma destas ferramentas, teria sido mais complicado e moroso o estudo e, posteriormente, o trabalho em laboratório.
2ª Consulta:
Idade:
24
Licenciatura em:
Bioquímica
Mestrado em:
Tecnologia e segurança alimentar
Onde tiraste o teu Curso?
Licenciatura – Universidade de Évora
Mestrado – FCT / universidade nova de Lisboa
Há quanto tempo concluíste o teu Curso?
Terminei o mestrado em outubro de 2018
O que achaste mais importante durante a tua licenciatura e mestrado? E o que achaste menos importante?
- Plano curricular bem estruturado.
- Intercalar os conhecimentos teóricos com a parte prática
- Apoio dos professores
Quais as saídas profissionais do teu curso?
Laboratórios, indústrias alimentares, centros de investigação, etc., etc…
Quando terminaste a tua Licenciatura sentias-te preparada para ingressar no mercado de trabalho? E após o Mestrado?
Quando terminamos, temos sempre algum receio, pois são trabalhos de muita responsabilidade. Ter os conhecimentos teóricos é essencial, mas a prática também ajuda muito. No entanto, a experiência vem com o tempo.
Sentes que todas as ferramentas digitais que são aplicáveis à tua formação estavam ao teu dispor?
Quanto às ferramentas digitais, depois do CCP (Curso de Formação Pedagógica Inicial de Formadores – Certificado de Competências Pedagógicas), fiquei a conhecer muita coisa que até então não tinha conhecido.
3ª Consulta
Idade:
33
Licenciatura em:
Ciências da Comunicação, não fiz Mestrado.
Onde tiraste o teu Curso?
Na Universidade Nova de Lisboa
Há quanto tempo concluíste o teu Curso?
Há 11 anos.
O que achaste mais importante durante a tua licenciatura e mestrado? E o que achaste menos importante?
O mais importante o prestígio do curso; o menos importante ser demasiado teórico.
Quais as saídas profissionais do teu curso?
Jornalismo, marketing, publicidade, comunicação estratégica.
Quando terminaste a tua Licenciatura sentias-te preparada para ingressar no mercado de trabalho? E após o Mestrado?
Sim, senti-me preparada após a licenciatura.
Sentes que todas as ferramentas digitais que são aplicáveis à tua formação estavam ao teu dispor?
Não senti que estivessem ao dispor ferramentas digitais.
Ora, após ter analisado as diversas respostas às minhas questões e com o conhecimento próprio de algumas situações, eis as minhas conclusões sobre o Ensino Superior em Portugal:
- Ainda se valoriza mais a teoria do que a prática;
- O nosso Ensino Superior é de referência, mas os alunos não se sentem totalmente preparados para o mercado de trabalho após a conclusão da sua Licenciatura;
- Em 11 anos, denota-se uma evolução na aposta nas ferramentas digitais, pese embora ainda muito atrás do que acontece nos EUA ou Reino Unido, por exemplo;
- Faz falta estágios curriculares aos nossos alunos universitários;
- Os nossos alunos conhecem bem quais as saídas profissionais dos seus Cursos;
- À semelhança da nossa sociedade atual, a vida no campus das universidades portuguesas é regida por «Chicos-espertos» onde o chauvinismo e a prepotência são ditames de sucesso e onde certas e determinadas praxes são espelho dessas características;
- Em certos Países Europeus, há programas de financiamento aos alunos, onde – sem qualquer necessidade de intervenção dos «ganhos dos País» – as Propinas são pagas pelo Governo diretamente às Universidades e os alunos só iniciam o pagamento deste empréstimo após estarem a trabalhar e receberem acima de 29.000,00€/ano (e pagam mensalidade de cerca de 100,00€/mês).
Ora, com base nestas conclusões, parece-me que o nosso Sistema Universitário reflete a sociedade actual e que, pese embora um ar sombrio e austero, é detentor de um ensino de referência, sendo que a reestruturação mais importante a fazer será a de implementação de mais prática, ou estágios curriculares, que ajudem os alunos a não terem receio de enfrentar o mercado de trabalho.