“Qual é definitivamente a origem das nossas ideias do bem e do mal?”
Nietzsche
Sobre uma extensa região montanhosa, Ulrich Mott observa imponente, do topo, e na sua fantasiosa farda de Brigadeiro-General, as tropas iranianas que o saúdam, como se de um deus se tratasse. Uma antevisão das últimas cenas que se vêem aqui.
Este é o início de um filme, dramático, biográfico e policial que nos deixa, de coração aos saltos, pela verdade dos comportamentos e da condição malévola do Homem.
Baseado na história “O pior casamento de Georgetown”, de David Auburn e Franklin Foer, o Crime de Georgetown, filme de 2019, tem estreia prevista nos cinemas portugueses em 24 de Março de 2022. Uma história da alta sociedade e, do tanto que existem comportamentos desviantes dentro dela. Como forma de ambição, poder e crescimento, motivado para ser e estar entre a mentira, loucura e ilusão desta esfera e ambiência social, vista de fora como perfeita e intocável.
O realizador Christoph Waltz é Ulrich Mott, personagem principal e vencedor dum Óscar da Academia por este papel. Vanessa Redgrave é Elsa Breht, vencedora do Óscar da Academia, e Annette Benning como filha desta, no papel de Amanda Breht, nomeada para Óscar também.
Entre o ano da realização e o da apresentação nas salas de cinema, passa uma pandemia que nos impediu de aceder a esta história atempadamente. Porém, também, nos dá a oportunidade de aceitar uma condicionante do valor humano em defesa daquilo que é o poder de o concretizar, a forma como é elevado e as condições que se podem usar para atingir os seus propósitos.
Quase que se pode acreditar que uma pandemia ou situação de catástrofe deixa a mente humana embevecida de irreais suposições, que os desajustados métodos de ascensão na alta sociedade praticados por Ulrich, decididamente justificados pelo ambiente externo, limitando a expansão dos valores e da moral.
A verdade das coisas é sempre mais difícil de aceitar e ver, porque “coloca o dedo na ferida” e a faz sangrar.
Porém, também é verdade que a mentira é a “arma mais poderosa” de todas e o charme com que é usada, a bala que atinge os misericordiosos em redor.
Ulrich Mott é quem afinal? Enigmático, carismático, persistente, encantador, que vê em Elsa Breht, viúva, rica, e 40 anos mais velha que ele, um meio para progredir rápido na hierárquica sociedade, usando esquemas de influências ou falsa reputação.
E, afinal, qual é a meia medida a usar quando se nos deparamos com este tipo de comportamento?
Entende-se um casamento de “exploração mútua”, já que Elsa, uma idosa de quase 90 anos, se deslumbra pelo charmoso “charlatão”, perpetuando as festas e jantares da “haute société”, usando-o como “o mordomo perfeito”.
Em determinado momento, se assiste a uma conversa entre os dois, em que Elsa lhe pergunta:
“– Mott, você é o mordomo perfeito, mas é só isso que você quer ser?”
FICHA TÉCNICA Título original : Georgetown Género : BIOGRAFIA, CRIME, DRAMA Ano : 2019 Realizador(es) : Christoph Waltz Elenco : Christoph Waltz, Annette Bening, Vanessa Redgrave País(es) : EUA Duração : 1h 39m
Sim. Vi o filme! Este que me foi incitado a ver. Uma dura realidade para alguém como eu que rejeita a mentira, o jogo de faz-de-conta ou a criação de histórias ilusórias como comportamentos passíveis de serem aceites sem leviandade. E, que mais uma vez, incorre no espaço-tempo um adiamento à elaboração deste texto, provocado pela emoção gerada ao vê-lo e que necessitou de aceitação para dissociar e assimilar.
“A diplomacia é a arte de mandar alguém para o inferno de uma maneira que o próprio ainda pergunte o caminho.”
Ulrich Mott
Se dum lado, temos alguém que tem um comportamento fraudulento e de duas faces, no outro, temos outro alguém que o permite expandir e perpetuar esse estado de incoerência e irreal verdade. Será que é ingenuidade ou falsa sabedoria? Passividade, oportunidade ou sensaboria?
Será que se é vítima por ausência do aparente ou, pelo politicamente correcto, se é vítima da arte de ser do mal camuflado?
A última cena do filme representa a ilusão, sonho ou loucura de Ulrich a tomar forma do tanto que acredita ser que é e nunca foi.