Não terás prazer (Mutilação Genital Feminina)

Num mundo de autoridade masculina, é negado o prazer às mulheres. São reduzidas à sua capacidade reprodutiva. Como tal, tantos abusos são cometidos contra as mulheres. São objectificadas. Servem para servir, servir ao homem e às suas necessidades. As próprias mães, anciãs, outras mulheres, continuam a perpetuar esta prática em várias partes do mundo. A mutilação genital feminina (MGF) sai do seu berço, mas continua a ser praticada, porque esta cultura não está só nas tribos ou grupos étnicos, está na mente de quem a recebeu e aceitou.

A prática surgiu como tentativa de controlar a sexualidade da mulher e em conceitos sobre pureza, modéstia e estética. É normalmente realizada por mulheres, que a vêem como motivo de honra, receando que as filhas e netas possam ser excluídas da comunidade, caso não passem por este ritual. Note-se que a mutilação genital feminina, conhecida também por circuncisão feminina ou corte genital feminino, consiste na remoção de parte ou de todos os órgãos sexuais externos femininos. Geralmente é feita com a utilização de uma lâmina de corte, com ou sem anestesia. A maior parte das jovens é mutilada antes dos cinco anos de idade.

Assustador, no mínimo. E isto continua a ser perpetuado aos dias de hoje. Segundo dados da UNICEF, existem 30 países na África, na Ásia e no Médio Oriente onde se verifica a existência desta prática. Já repararam no nome? Mutilação ou corte. Involuntário, sem consentimento, obrigatório. O que isto significa em termos de direito à integridade física, emocional e intelectual, bem como à dignidade e liberdade pessoal? Um atentado a todos eles.

A MGF tem efeitos negativos na saúde física, sexual, psicológica e social das mulheres, a curto, médio e longo prazo. Pode, inclusivamente, levar à morte. As consequências para a saúde dependem do procedimento, mas geralmente incluem infecções recorrentes, dor crónica, dificuldade de urinar ou escoar o fluxo menstrual, dificuldade em engravidar, complicações durante o parto e hemorragias fatais. Não são conhecidos quaisquer benefícios médicos.

A MGF é reconhecida internacionalmente como violação dos direitos humanos das mulheres e raparigas e como forma extrema de discriminação e violência dirigida exclusivamente a raparigas e mulheres, com base no sexo. A prática é crime em todos os estados membros da UE. Apesar disso, qualquer menina nascida dentro de uma comunidade onde se pratica a MGF está em risco de ser submetida a este procedimento.

O que nos cabe a nós fazer? Denunciar estas práticas, não aceitá-las, saber que elas continuam a existir aos dias de hoje e termos conhecimento delas. Ficarmos indignados, atentos. Não só relativamente a este assunto em específico, mas a todos os abusos cometidos contra as mulheres, toda a violência de género, assédio, perseguição, desrespeito aos direitos de dignidade e integridade, privacidade e direito ao prazer.

A mulher tem direito ao prazer sexual. A mulher tem direito à liberdade. Tem direito a não ser discriminada, tem direito à vida, à saúde e à segurança pessoal. Tem direito a escolher o que quer e o que não quer. Tem direito à liberdade de expressão e opinião. Tem tantos direitos quanto qualquer outro ser humano, e são tantos que não os vou mencionar a todos aqui. Há uma Declaração Universal dos Direitos Humanos. Vale a pena ler.

Acerca da liberdade: ela existe, só não existe para toda a gente e em todo o lado. O mundo ainda é grande e existem ainda muitas desigualdades sociais, raciais e relativas ao género. A mulher tem sido, desde sempre, massacrada com abusos e violações diversas. Que a MGF seja uma delas a ficar no passado. O aumento da consciência faz-se necessário. O não ficarmos indiferentes, o termos sensibilidade e responsabilidade perante estes assuntos e temas. Participarmos de petições, de causas sociais, donativos. Denunciarmos práticas de abusos.

Estes assuntos devem revoltar-nos, devem fazer-nos pensar. Devem, igualmente, fazer-nos ser rebeldes sociais de certa forma, não nos conformarmos a práticas ilógicas só porque elas existem ou foram sendo repetidas através da história da humanidade. Olharmos para essas práticas com naturalidade ou indiferença, sem espírito crítico.

Precisamos tomar uma atitude nas nossas vidas pessoais, profissionais e sociais. Não permitir ou tolerar abusos de qualquer espécie. Ensinarmos a quem nos rodeia, educarmos a quem nos rodeia, de que isso não é permitido. Abusos à individualidade, ao direito de expressão e liberdade pessoal. Não permitir que eles sejam cometidos a nós ou à nossa frente. Uma sociedade esclarecida e informada, não tolera práticas funestas. É nessa sociedade que queremos viver. É essa a sociedade que queremos (e devemos querer) criar.

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