Mães predadoras

Mãe

Que palavra linda

O nascer em serra

Eu nasci de ti

Como a flor da terra

Assim escrevia Miguel Torga, o humanista de olhos bem abertos. Simplicidade rústica que deixa um sabor de muita saudade. Ser que se molda para ser uno e atento à realidade que o circunda.

Mãe, a que carrega o futuro ser, o cálice frágil e protector onde a vida acontece. Mãe, a que tem a relação privilegiada com o pequeno ser que se vai desenvolvendo dentro de si. Mãe, a que nunca o deixa de ser.

Deixemo-nos de poesia e coloquemos os pés na realidade. As mães são diferentes no seu comportamento conforme os filhos. É justo. Não existem seres iguais. Contudo, o modo de educar os rapazes e as raparigas diverge em polos que não se tocam.

A mulher, que um dia será a mãe, seguindo as regras naturais da vida biológica, tem de se fazer à sua sorte e ganhar armas de defesa para ataques de inimigos. O chamado sexo frágil é dotado de armas especiais que não se vislumbram à vista desarmada. Querem que estejam aptas para todas as funções.

O homem será o eterno menino, o bebé que não se quer largar, a juventude em pleno e a pujança de viver. A eles tudo é permitido e essa perigosa ausência de penalizações, pode dar origem a falsas realidades. Esta é uma generalização. Nem todas as mães são assim.

Os filhos crescem. É inevitável. Faz parte da marcha da humanidade. O orgulho nos seus rebentos é legítimo. Refiro-me apenas a eles, os homens meninos de mães que têm alguma dificuldade em vislumbrar os horizontes. Sim, há de tudo como na farmácia, menos pão.

Pão, alimento para o corpo, tradição de tocar, puxar e mastigar. Pão, sustento que acalma o interior e apazigua temores. Vida que segue e sorri. Fome que fica sanada, alegria que se quer partilhar.

De há uns tempos a esta parte, tenho reparado num certo grupo de mães, enxutas e muito bem-apessoadas que, nos treinos de ginásio, fazem pausas para conversar. Os risos são de tom elevado e os “oh!!!!!” são bem audíveis.

A curiosidade pode ter morto o gato, mas o teor de chamariz é elevado. Que faziam, então, estas mães? Exibiam com muito orgulho, bem desmesurado, os corpos musculados dos filhos de vinte anos. Para muitas, era a foto de capa.

Que se orgulhem do percurso profissional ou ainda do pessoal dos filhos é compreensível, mas este tipo de fetiche é estranho. Ou talvez não. Só agora dei por tal. Será salutar continuar a ver o filho como pequeno, um pedaço seu. Só que o que mostram é o homem nu, os abdominais do seu gene e a mostra tem um pendor bem complexo.

Cada uma delas suspirava ou aiava mais alto que a outra. Tocavam nos ecrãs e passavam os telemóveis de mão em mão. Que nome, já que os rótulos fazem sentido, posso encontrar para esta fixação? Complexo ou Síndrome? Tara? Pornografia maternal? A sexualização deles era o andor da procissão.

É certo que os tempos mudam e novas formas de atenção se moldam às necessidades. O apelo sexual não morre com a idade. Desiluda-se quem assim pensa. Para tal, basta ver a quantidade de pais serôdios que enchem o peito com os seus descendentes. Cada vez se torna maior o número.

Desta feita são elas, as mulheres, que não se permitem envelhecer ou tentam manter uma falsa juventude num patamar muito peculiar e extremo entre fazer agachamentos e levantar pesos, salta logo a imagem do mancebo modelado e pronto a ser consumido em fantasias etéreas.

Esta adoração parece-me pouco saudável, um novo ritual que mexe com regras estabelecidas e agita, de que maneira, a libido. Algumas confessam que têm saudades de os amamentar e uma segreda, sem qualquer tipo de pudor, que deixou o filho dormir com ela até aos quinze anos.

Os olhares lânguidos das outras mães, ou até das legítimas, estão imbuídos de tempos que são para rever. Sexo, palavra que de proibida passou a imbuída de liquidez avançada e com carácter particular. A privacidade dos filhos pode ser violada desde que essa extraordinária visão lhes dê pica para se excitarem.

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