Hoje em dia, quando entramos numa sala de professores de qualquer escola do país, o normal é encontrarmos pessoas grisalhas, a conversar sobre medidores de tensão, medicamentos e consultas médicas, queixando-se dos diabetes altos, do colesterol desregulado ou das dores aqui e acolá. A verdade, é que a maioria dos professores já não vai para novo, as estatísticas estão por aí a comprová-lo. Estão em exercício profissional numa idade em que, há uns bons vinte anos, já estariam todos reformados.
A falta de docentes nas escolas começa já a ser visível para a opinião pública e motivo de notícia nos jornais, apesar dos profissionais da área já estarem a alertar para o problema, antes mesmo deste começar a acontecer. O fenómeno nem sequer é inédito, estando como sempre Portugal na cauda da Europa (o que até nos dava oportunidade de antecipação) e de termos também já sofrido necessidade de professores, nomeadamente a seguir ao 25 de abril de 1974, mas por outros motivos.
Seria lógico que os jovens universitários procurassem estudar para ser professores, uma vez que é uma área deficitária, contudo parece não estar a acontecer, apesar dos apoios que o estado está a conceder atualmente (não pagarem propinas nas licenciaturas e nos mestrados em ensino*). Uma área em que os profissionais de certa forma vivem ainda uma certa liberdade de atuação na sua profissão, em que somos os líderes numa sala de aula, em que o recrutamento é feito a partir de uma nota de classificação (nota final de curso em conjunto com tempo de serviço) e não por entrevista, que poderia estar a atrair pessoas com um determinado perfil, mas não está.
É que, ao mesmo tempo, das coisas boas que a profissão traz (e não são ter supostamente mais férias que nas outras profissões), a verdade é que são muitos os aspetos negativos, e que estão a afastar os jovens. A burocracia no local de trabalho é muita. Muitas escolas precisavam que lhes entrasse lá um engenheiro industrial e acabasse com o trabalho repetido (como inserir classificações em diferentes plataformas e documentos). A burocracia é tanta que, por vezes, temos a sensação de que só fazemos aquilo e não preparamos aulas. Aliás, todo o trabalho de preparar aulas já vem mastigado das editoras.
A indisciplina é crescente e lutamos pela atenção dos alunos contra as novas tecnologias. Poderia falar em muita coisa que faz parte do dia-a-dia de um professor, mas falo daquilo que tem sido conhecido de todos: a instabilidade, as colocações longe de casa, os ordenados insuficientes para fazer face a todas as despesas (que incluem material de trabalho – material escolar, livros).
As novas gerações têm a ensinar às mais velhas que já não é tempo para certos sacrifícios nos locais de trabalho. Por isso não procuram a profissão docente, e o ministério escalfa-se a tentar arranjar soluções, a tentar contratar professores reformados ou professores estrangeiros, o que não tem tido sucesso! É junto dos mais novos que o ministério precisa de trabalhar, criando condições para desejarem ser professores. É que, se a seguir ao 25 de abril de 1974 muitas pessoas estiveram dispostas a isto, agora não estão!
*Lembro que para ser professor do 3.º Ciclo do Ensino Básico e do Ensino Secundário é necessário ter uma licenciatura numa área científica, e que só no Mestrado em Ensino se profissionalizam enquanto professores. Estas áreas científicas necessitam de corresponder a áreas de ensino, como Matemática, Biologia, português, inglês. Um licenciado com um curso como Gestão Turística ou Fisioterapia pode não ter na sua licenciatura créditos suficientes nas disciplinas exigidas para entrar no Mestrado em Ensino, e necessitar de voltar à Universidade para realizar disciplinas avultas. Por isso pode ser importante, logo à partida, a escolha da licenciatura. A estratégia do Ministério da Educação, de tentar atrair profissionais doutras áreas, pode embater nesta dificuldade.