Madrid, Hala Madrid!

– Madrid ou Barcelona?

– Madrid!

É a pergunta que invariavelmente todos fazemos, com a nuance de, ao dizer a alguém que adoro Madrid, me devolvem quase sempre Eu prefiro Barcelona. Se Barcelona é a boémia, Madrid é o clássico, ainda que Espanha seja, toda ela, uma força bipolar entre o arrojo de fazer diferente e o peso da tradição, entre a movida e o patriarcado, a união e o separatismo, o deserto de Almeria e a verde da Galiza, praia e montanha, Madrid e Barcelona.

É um país que comecei a amar muito antes de o ter visitado como deve de ser (as viagens de barco para Aiamonte, nas férias da infância em Vila Real de Santo António não contam) quando aos dezoito li Fiesta! e formei a ideia de ir às festas de San Firmino (eu, que não ligo puto a touradas) pelo prazer de mergulhar naquela década de vinte Hemingwayana.

Comecei em 2009, numa viagem solitária pelos feriados de Dezembro, onde deambulei pelo centro – Puerta del Sol e Plaza Mayor, Mercado de San Miguel e Plaza de Santa Ana, La Chueca, Gran Via, Callau e o Reina Sofia, onde Guernica me enfeitiçou e mostrou não ser mito podermos passar dez ou vinte minutos a apreciar um quadro. Não voltou a acontecer, e não foi indiferente o tema: a Guerra Civil – sempre a história do séc. XX – e o enquadramento, quer com os esboços de Picasso, quer com a exposição fotográfica de Robert Capa e A Morte do Soldado Legalista.

Fazia frio e o El Gordo estendia filas pelas esquinas da cidade onde quer que houvesse uma papelaria. Entre os enfeites de Natal, juntou-se mais tarde a Lisi, amiga de ocasião, que me acompanhou pelo Prado (quatro horas resumidas na Isabel Velada de Torreggiani e em alguns Goyas… não, As Meninas não me falaram), Retiro, o Paseo del Prado com a feira do livro permanente, Cibeles, Puerta de Alcalá e Colón e do outro lado, Plaza de España e a Catedral de Almudena (ou de Santa Maria). Ainda houve tempo para um concerto de jazz no Café Central e um Real-Barcelona num bar da cidade.

Na verdade, a primeira vez havia sido em 2003, numa paragem do autocarro a caminho de Barcelona – cinco horas, das dezanove à meia-noite – onde conheci essa forma de estar tão espanhola: o gosto pela rua, faça sol ou chuva, frio ou calor, eles “atulham” a rua de passeios domingueiros, copos depois do trabalho, botellones, compras e cultura.

Em 2005 voltei para visitar o Joel, um amigo que fazia Erasmus, e conheci outro lado de Madrid, da boémia e das festas multilingues, das casas partilhadas – dois argentinos, um mexicano, uma francesa e dois portugueses – álcool, a Chocolateria San Ginés e o parque Warner.

Após 2009, voltei em 2011 no meio de um desgosto amoroso, onde conheci o lado mais alternativo da cidade (eu disse que Madrid era clássico?) na companhia da Sónia e do David: Lavapiés e uma antiga fábrica transformada em centro cultural boémio (uma espécie de Braço de Prata) de que não recordo o nome (La Tabacalera?), a Puerta de Toledo e o El Rastro.

Em 2008 entrei na cidade como um lorde – viagem de trabalho – e tudo subiu de nível – quatro estrelas para cima – alojamento e shop shop, com as estrelas a brilharem também nos preços, de que recordo um restaurante hoje extinto, o Teatriz (era o antigo teatro Beatriz) que já na altura me custou o olho do cu – € 157,00 para quatro (quase €40 por pessoa…em 2008!) foi a rasgar o plafond até ao osso! Lembro-me bem porque fui eu quem pagou essa refeição e passei o jantar a fazer contas de cabeça, com medo que o saldo do cartão não chegasse…

Seguiram-se mais algumas viagens, em trabalho ou lazer, a última de visita à Laura e ao Pablo, por volta de 2017/2018, onde além do Templo de Debod andámos pela cidade. Encontrámo-nos com a Vânia (amiga da Marinha Grande que então vivia na capital Espanhola) e com o André.

Não é a minha cidade favorita, mas fui estabelecendo com ela uma amizade colorida. Sem compromisso, sinto-me bem cada vez que visito Madrid. Em lazer ou em trabalho (e nunca pelo tempo suficiente para que as garras do quotidiano finquem as raízes na rotina madrilena), Madrid deixa-me sempre aquele encanto agridoce de que deveria ter ficado mais dias, sentindo ao mesmo tempo que demasiado tempo na sua companhia estragaria esta excitação das primeiras vezes que me invade a cada visita.

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