Bacalhau, um peixe muito versátil e que veio a este país para matar a fome a muitos que dela padeciam. Pescado em lugares longínquos, o seu sabor e qualidades, tem conquistado até os mais resistentes.
Existem mil e uma formas de ser comido, ou laborado, ou apreciado e outras tantas ainda por divulgar. Uma espécie que permite esta miríade culinária terá, com toda a certeza, um lugar de destaque nos concursos que querem apurar a criatividade gastronómica.
O Natal aproxima-se e ele, o bacalhau, é o rei da consoada. Um monarca que tem subido ao trono com aplausos. Cozido e com couves, a marca de outros tempos menos bons, faz um par que se entrelaça com batatas, uma das maravilhas que veio de outro continente.
Curiosamente não se fala de presidente, um cargo que implica eleições, mas, sim, de um rei, cargo hereditário e sem mais delongas. O trono altaneiro é única e exclusivamente dele e não admite qualquer tipo de contestação.
Bacalhau, o peixe interessante e que se salga, um modo de conservação que impede logo a sua corrupção. Viaja de mares muito frios para lares quentes e acolhedores. Tem subido tanto no ranking alimentar que o preço a que chegou se assemelha a pornografia alimentar.
Carnudo, saboroso, em lascas deliciosas e bem atraentes, assim pisca o olho ao paladar. Bem encapado, de cor dúbia, exibe a sua luminosa cor que sabe como fazer salivar.
Uma tentação, este tipo com espinhas e ainda escamas. Despe-se, veste-se, troca-se e ainda continua a ser uma surpresa que encanta. Um lugar que não vai ser perdido pois a tão típica característica nacional, o desenrasca, resolve todas as falhas.
O tipo é mesmo sexy e atrai com facilidade os incautos que se deixam levar pela sua fibra, ou posta, ou lasca ou rabo ou uma outra parte do dito, qualquer uma serve.
Esse magnetismo supera as barreiras básicas e todos os outros alimentos se apaixonam por ele. Batatas, outras multifacetadas, couves, as saloias que se tornam finas, cebolitas para se fazer chorar (por mais), espinafres de saúde e força ou até mesmo broa.
Rico, num patamar superior, mas de mão dada com a ralé, aquela que lhe dá tanto charme e uma estrondosa sensualidade, o bacalhau é o que solta logo a faísca maior e se une com os que se mostram dignos de o fazer.
Despe a pele, num movimento lento e dengoso, se assim for o caso, ou num ápice, numa fúria que desconhece barreiras e salta à vista. Seja de que modo se decidir apresentar, o único e inigualável peixe, nunca deixa os créditos por mãos alheias.
Cada receita, sábia e que passa de geração em geração, por artes quase mágicas, leva em si, um pouco de cada um, uma essência que se agiganta e que se enche de emoção.
Cozinhar é um acto de amor, oferecer aos seus um pouco de si, uma memória eternizada e um paladar que, por vezes, se torna impossível de ser descrito. É a fibra de quem cozinha que se eleva e abraça quem come o que é feito com delicadeza, gosto e fulgor.
As batatas são as suas grandes parceiras e assim, tão singelas, podem ser cozidas, fritas ou até mesmo salteadas, para o aconchegar. Ele, o tal de bacalhau, sabe envolver tudo com azeite, o ouro alimentício, para as papilas gustativas se colocarem a dançar.
Ovos, células perfeitas, às rodelas ou inteiros ou ainda desfeitos, nadam livremente com este herói da culinária e rodopiam até se cansar. E as couves? Meninas de os mirar e desafiar.
Que dizer da broa e dos espinafres? Festins de comer e chorar por mais. Tudo muitíssimo bem embrulhado, num swing de elevar o palato e o deixar bem abananado a clamar por mais.
Bacalhau, o tal, do gostinho especial. Com sal ou sem ele, um travesti de requinte culinário, é o que faz digladiar ricos e pobres, como se de uma donzela virgem e ingénua se tratasse.