No livro Tornar-se Pessoa o seu autor, Carl Rogers, aborda um aspecto central apreendido pelo mesmo e que, como refere, teve uma grande importância para si:
(…) atribuo um enorme valor ao facto de poder permitir-me a mim mesmo compreender uma outra pessoa. “e continua colocando a pertinente questão: “Será necessário permitir a si mesmo compreender outra pessoa?” à qual responde “Penso que sim.
Na visão de Carl Rogers, para compreendermos o “Mundo” do outro, como se fossemos o outro mas sem perdermos de vista que o que é percepcionado é do outro, há que haver um espaço entre uma reação mais imediata, que pressupõe um juízo que tem por base a realidade individual, e um estado de compreensão:
A nossa primeira reação à maior parte das afirmações que ouvimos os outros é uma apreciação imediata, é mais um juízo que do que uma tentativa de compreensão. Quando alguém exprime um sentimento, uma atitude ou uma opinião, a nossa tendência é julgar imediatamente, na maioria das vezes: “É justo”, ou “que estupidez!”, “não tem sentido”, “é falso”, “não está bem”. Raramente permitimos a nós mesmos compreender precisamente o que significa para essa pessoa o que ela está a dizer.
Este processo é quase automático. Muitas das vezes, perante um acontecimento, diálogo, comentário, etc., mesmo que não seja dita verbalmente por nós qualquer palavra, mentalmente desencadeamos um rol de apreciações e ditamos logo de “nossa sentença” não equacionando todo um Mundo experiencial e vivencial que leva aquele outro a tal comportamento, atitude, etc…
O que é interessante na exposição de Carl Rogers é a sua teorização sobre o facto de a compreensão do outro não ser um processo automático, como o é o juízo de valor feito por cada um, mas sim, algo que tem que “ganhar terreno” dentro de nós, algo a que nos temos de “permitir”, pois a compreensão do outro implica uma mudança e esta é muitas vezes temida pela maioria de nós.
Se me permito a mim mesmo compreender, na realidade, uma outra pessoa, é possível que essa compreensão acarrete uma alteração. E todos nós temos medo de mudar.
Como é que a compreensão do outro nos pode mudar?
Quando experienciamos e percepcionamos a realidade do outro, compreendendo-a e sentindo-a, trazemos para a representação individual da realidade, informação diferente daquela que teria sido por nós percepcionada se estivéssemos naquela mesma situação ou vivido o mesmo acontecimento. Apesar de não o termos vivido ou experienciado directamente, enriqueço-me com esse outro “Mundo”, com as suas vivências e percepções e isso muda o nosso quadro de referências internas, tornando-nos mais sensíveis e empáticos às realidades alheias à nossa. Ao permitir-mo-nos abraçar a mudança que essas novas percepções trazem permitimo-nos viver a dádiva da experiência dada por uma outra vida. Saimos do terreno do Medo e entramos no terreno da Benção da experiência de Ser Humano.
A Benção é maior quando o outro percepciona esta nossa compreensão da sua própria experiência e, nesse momento, é como se os campos de vivência individual se juntassem numa comunhão de percepções, deixando de haver campos individuais de realidade para haver um campo de realidade alargado resultado da equalização dos dois, somada à experiência individual.
Ao permitir-mo-nos estar neste estado de abertura acedemos a uma consciência alargada que nos enriquece, nos expande e nos faz crescer individual e colectivamente.