Quando, há uns tempos, os especialistas avançaram com a possibilidade de acontecer uma segunda vaga, poucos acreditaram; quando tentaram explicar que a segunda vaga chegaria mesmo e que seria terrível em comparação com a primeira, ninguém quis ouvir. Infelizmente, constata-se agora, de forma bastante dolorosa, que os especialistas tinham razão: a segunda vaga de Jorge Jesus no Benfica está, de facto, a ser muito pior do que a primeira.
Primeiro, em 2009, Jorge Jesus prometeu que os jogadores jogariam o dobro, passados onze anos garante que jogarão o triplo. Admiro o esforço criativo. Não sei se sou o único, mas sinto saudades dos tempos em que o treinador do Benfica tinha a desfaçatez de ser mais comedido nas promessas. Pessoalmente, preferia ver o Glorioso jogar apenas o dobro e não o triplo. Parecendo que não, ganhávamos mais vezes. Apesar do assinalável trabalho envolvido numa nova narrativa, Jorge Jesus parece ter adquirido irreversivelmente o espírito nobiliárquico que caracteriza a antiga aristocracia: a mania das grandezas. O treinador do Benfica transformou-se num ex-visconde que ignora os novos tempos e insiste em viver de uma riqueza que já não possui. Não se sabe onde adquiriu estas extravagâncias, embora se desconfie.
Não quero parecer maçador, mas a segunda vaga de Jorge Jesus no Benfica não é bem como uma pandemia, aparenta mais ser um pandemónio. Há, apesar de tudo, algumas promessas que estão a ser escrupulosamente cumpridas. Na conferência de imprensa de apresentação, Jorge Jesus prometeu fazer uma grande equipa e arrasar. Aguarda-se, com ansiedade, que consiga fazer uma grande equipa, porque, de facto, já consegue arrasar. Pelo menos, com a expectativa de milhões de adeptos. E com assinalável nota artística.
Por um lado, é admirável que um treinador de futebol tenha a sensibilidade necessária para cantar em público “Melhor de mim”, de Mariza e, por outro, a imprevidência de meter Otamendi, Chiquinho e Gilberto a jogar. Na verdade, os génios também são feitos destas contradições e bipolaridades.
Fala-se muito nos erros da equipa de futebol do Benfica, na instabilidade exibicional e nas tácticas, mas, lamentavelmente, ninguém aborda o mais importante: as estratégias profiláticas de Jorge Jesus. Se, para alguns, parece escandaloso o facto de o Benfica sofrer muitos golos e marcar poucos, para mim é bastante óbvio que Jorge Jesus se preocupa apenas em garantir um saudável distanciamento social entre os seus jogadores e as balizas. Há adeptos que implicam por tudo e por nada.