Cinema

Titanic – A obra prima de James Cameron

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Titanic foi o filme que mais me marcou no coração da minha infância/pré-adolescência, tinha eu 11 anos de idade. Foi o primeiro filme com um argumento romântico excepcional que vi na minha vida. Antes disso, por influência do meu pai (que adorava e ainda adora filmes de acção), a minha cultura cinematográfica resumia-se aos filmes do Jean Claude Van Damme, Bruce Lee, Stallone, Steven Seagal e Chuck Norris e certos filmes animados e filmes da Disney por influência das minhas tias maternas.

Um amigo de infância emprestou-me a cassete do filme e na minha rua quando souberam que eu tinha a cassete do filme, alguns vizinhos vieram a minha casa ver o filme e ainda tive de levar a cassete à casa de um tio meu porque ele estava ansioso por ver esse filme da qual tinha muitas informações e conhecimento. Num espaço de 15 dias, vi o filme de 3 horas e 14 minutos 4 ou 5 vezes. Uma loucura! Só Titanic fez uma coisa destas na minha vida. Titanic é Titanic! Tive o privilégio de ver esse filme na altura em que ele saiu no coração da minha infância. Comecei a ver o Cinema de outra forma a partir daí e por isso é que este filme é tão especial para mim e tem um grande significado emocional para mim. E pressuponho que para muita gente da minha geração também.

Titanic foi uma das produções mais caras do Cinema que foi suplantado por Avatar de 2009, também realizado por James Cameron. Custou 200 milhões de dólares, mais do que o próprio Titanic que custou 130 milhões de dólares. Envolveu milhares de figurantes, a gravação de cenas de elevada complexidade, a construção no México de uma réplica do Titanic original, mais um tanque com 60 milhões litros de àgua. O processo de pré-produção foi muito moroso e a planificação da produção foi muito complexa. James Cameron, o realizador, fez várias expedições, a 4 km de profundidade do nível do mar e utilizou uma câmara especial para gravar ali. Só eram possíveis 12 minutos de gravação nessa profundidade. Numa das cenas do filme, em que era preciso gravar a cena em que a àgua inundou toda a escadaria, só era possível gravar essa cena num take, não havendo lugar a repetição. Isso diz muito da complexidade do trabalho técnico que James Cameron teria pela frente.

O filme foi realizado, escrito e co-editado pelo canadiano James Cameron, que sempre demonstrou ser um dos realizadores mais experientes, rigorosos, exigentes e metódicos da sua geração. Ficou famoso por realizar filmes como o Exterminador do Futuro e Allien. Em Titanic ele relata a perfeita simbiose entre o desenvolvimento de um trágico acontecimento histórico responsável por milhares de mortes com uma inolvidável história de amor que marcou para sempre a História do Cinema.

Mas, antes de mais, convém fazer uma breve resenha histórica do navio Titanic, construído há 111 anos, em Março de 1909 e que se afundou em Abril de 1912 no Oceano Atlântico devido a uma colisão com um Iceberg:

O RMS Titanic foi um navio de passageiros britânico operado pela White Star Line e construído pelos estaleiros da Harland and Wolff em Belfast. Foi a segunda embarcação daClasse Olympic de transatlânticos depois do RMS Olympic e seguido pelo HMHS Britannic. Projetado pelos engenheiros navais Alexander Carlisle e Thomas Andrews, a sua construção começou em março de 1909 e ele foi lançado ao mar em maio de 1911. O Titanic foi pensado para ser o navio mais luxuoso e mais seguro de sua época, gerando a lenda de que era “inafundável”. De forma soberba e insensata, muitos responsáveis pela sua construção afirmavam que nem Deus poderia afundar este navio. Mas mal colidiu com o Iceberg, o Titanic demorou duas horas e quarenta minutos para afundar completamente.

Devo também acrescentar que os destroços do navio só foram encontrados 73 anos depois, em 1985. Além do mais, eles estavam a cerca de 600 km da costa de Newfoundland situada a sudeste do Canadá. Além de estarem também a quase 4 km abaixo do nível do mar.

Para poder diferenciar os dois irmãos, o Olympic foi construído com seu casco inteiramente branco enquanto o Titanic foi construído com um casco preto. Os trabalhos de armação de sua estrutura progrediram em um bom ritmo e foram completados no início de 1911.

Feita a breve resenha histórica, vou escalpelizar o filme que relata o trágico acontecimento de 1912.

Titanic é uma história de amor que desafia a desigualdade de classes contada em forma de analepse por Rose DeWitt Bukater (Gloria Stewart) de 106 anos que viajou no Titanic há 87 anos aquando dessa horrenda tragédia. É a história que viveu com Jack Dawson (Leonardo DiCaprio), um pobre artista, que ao ganhar num jogo de poker consegue ganhar o passaporte para embarcar no Titanic, o luxuoso navio que fazia a viagem entre Southampton e Nova York a partir do dia 10 de Abril de 1912 e que se afundou no dia 14 de Abril de 1912. Mas é também a história de uma Rose (Kate Winslet) pertencente a uma família aristocrática, noiva de Cal Hockley (Billy Zane), um aristocrata autoritário, arrogante e desprovido de sentimentos e que a tratava mal. Cal é o vilão da história que não olhava a meios para destruir a relação de Jack e Rose, revelando indiferença pelo sofrimento dos tripulantes no momento do naufrágio.

Rose não amava Cal e um dia pensa em suicidar-se. Jack vendo que ela está prestes a fazê-lo, demove-a e convence a não fazê-lo. A partir dai, cresce a cumplicidade entre ambos.

Começam a frequentar-se e Jack mostra-lhe os desenhos e retratos de prostitutas que foi conhecendo ao longo da vida. Rose diz-lhe que ele tem um dom e que ele vê as pessoas. Mas Rose começa a desanimar quando se apercebeu que ele é de uma classe social inferior e que a sua família não o aprova. Afastam-se, mas Rose diz a Jack que mudou de ideias quando vê um Jack solitário e desanimado a olhar para o mar. Jack diz a Rose para fechar os olhos. Ele segura os braços de Rose, levanta-os e estica-os e pede-lhe para abrir os olhos. Ela vê o mar e sente-se a voar ao som da maravilhosa e épica banda sonora de James Horner, dizendo de forma entusiasmada e apaixonada: “I’m flying Jack“. Esta é provavelmente a cena mais romântica da História do Cinema. Foi no último por do Sol antes do Titanic colidir com o Iceberg que resultaria na morte de milhares de pessoas, sobretudo homens da terceira classe que não detinham a prioridade de salvamento em relação aos tripulantes da primeira classe, crianças e mulheres. E também no consequente afogamento do Titanic que se desdobrou a meio. De forma trágica, Jack não consegue salvar-se  a não ser na memória de Rose durante 87 anos que resolveu contar a história quando tinha 106 anos de idade. O filme termina com a cena final do reencontro no luxuoso Navio depois de Rose ter adormecido ou presumivelmente morrido. Não se sabe se James Cameron definiu aquela cena final como um sonho de Rose ou um encontro na outra vida depois de Rose ter morrido.

Titanic é um romance trágico. Tem cenas sublimes e brutais a nível de realização técnica e a nível de romantismo e sentimentalismo. É uma espécie de Romeu e Julieta embutido num filme realizado com a mais espantosa tecnologia digital dos anos 90, com a diferença de que neste enredo o Romeu morre, mas a Julieta sobrevive para contar a história 87 anos depois. Rose disse que Jack viveu e morreu por causa dela. James Cameron já nos tinha surpreendido com filmes futuristas como: Terminator 2: The Judgement Day e a saga Allien. Fica sempre patente nas suas obras cinematográficas o surrealismo tecnológico que nos leva para mundos nunca antes imaginados, onde a adrenalina e o terror vivem no mesmo universo como se fossem irmãs gémeas. Cameron voltou com esse diapasão em 2009 com a realização do filme Avatar.

Adorei quase todas as cenas do filme desde as mais românticas às mais trágicas. Adorei os desenhos de Jack (que foram desenhados pelas mãos do próprio James Cameron), a cena em que ele desenha Rose nua e onde têm ambos relações sexuais num automóvel e onde a marca da mão de Rose continua nesse automóvel ainda hoje, a cena onde Rose disse que quando desembarcassem iriam embora juntos, os beijos tórridos que ambos davam, as festas boémias da terceira classe onde participaram, os profissionais de violino que não paravam de tocar mesmo quando o navio iria afundar, a cena em que Rose quebra com um machado as correntes que acorrentavam Jack e que o levariam a ser afogado, a cena onde Rose abandona o bote de salvamento para ajudar a salvar Jack. A cena em que Jack morre e diz a Rose que ela iria morrer numa cama quente e não naquelas águas geladas do Atlântico. Foram várias cenas a explicar e a demonstrar o que é o amor e o que é o altruísmo genuíno.

Kate Winslet e Leonardo Di Caprio foram os  atores perfeitos para protagonizar este filme. Leonardo DiCaprio foi uma escolha de James Cameron que vetou atores como Christian Bale ou Matthew McConaughey. Leonardo DiCaprio tinha e tem um carisma único. Sabe ser cómico, sabe ser dramático, é um ator versátil que dá ideias para melhorar a narrativa das longas metragens onde participa. Foi ele que deu a ideia de escarrar para o mar com Rose e foi dele que saiu a célebre frase “Eu sou o rei do Mundo” quando finalmente embarcou no Titanic.

Tem um ar jovial e brincalhão. Isso permitiu-lhe encarnar na perfeição o típico homem pobre das primeiras décadas do século XX, um homem que se refugiava numa vida boémia, sem grandes preocupações, refugiando-se na diversão para fugir à dor de uma vida difícil e cheia de problemas. Leo DiCaprio sabe ser simples e genuíno e tem aura de sonhador.  Ele expressa essas facetas no olhar. Uma das cenas em que ele manifesta isso é quando ele olha para as estrelas e acredita que a sua vida vai melhorar a partir do momento em que conseguiu embarcar no Titanic. Faz-me lembrar a personagem Alladin da Disney. Pobre e sonhador, mas puro. Sem malícia e segundas intenções. Apenas quer ser feliz e fazer feliz quem mais ama. Leo Di Caprio demonstra no filme que ser pobre não significa ser inferior a ninguém em termos de carácter e talento. A verdadeira riqueza está no interior de cada um e que a verdadeira desvantagem da pobreza está na desigualdade de oportunidades. Jack era pobre mas tinha mais talento e mais alma que muitos tripulantes da primeira classe. Di Caprio teve a capacidade incrível de demonstrar isso.

Kate Winslet era em 1997 uma atriz de uma beleza estonteante. O olhar dela e o sorriso dela apaixonam qualquer homem. Tem uma voz agradável. Sabe exprimir emoções de forma genuína e não forçada. Sabe ser dramática quando tem de ser e o seu estilo de representação casa muito bem com o de Leonardo DiCaprio pois é uma atriz de sorriso fácil, que sabe se posicionar numa mulher divertida e infantil quando necessário.

A química entre eles foi qualquer coisa de surreal. Entraram para a imortalidade com as suas atuações. Não ganharam nenhum Óscar, apesar do filme ter ganho 11 estatuetas douradas. Só Ben Hur (1959) e senhor dos anéis, o Regresso do Rei (2003) conseguiram igualar tal proeza. Leo DiCaprio viria a ser premiado com um Óscar de melhor ator na sua atuação em “The Revenent” em 2016 que na minha opinião pecou por tardia.

Leonardo DiCaprio não era o favorito da 20th Century Fox para interpretar Jack Dawson. A produtora queria ver Matthew McConaughey, que havia brilhado em Tempo de Matar. James Cameron não aceitou a imposição da produção e contratou DiCaprio, que já havia se destacado em produções como Romeu e Julieta e Diário de um Adolescente.

James Horner, que esteve na origem da banda sonora de “Braveheart, coração valente” foi o compositor escolhido para compor a canção “My Heart will go on” como sendo apenas uma música de fundo que tocaria em várias cenas de Titanic. Ele então queria que houvesse uma versão com vocais, para ser usada no final do filme, junto com os créditos. O diretor James Cameron não queria uma canção assim, mas Horner seguiu em frente mesmo assim e pediu a Will Jennings para compor a letra. Céline Dion, a cantora mezzo-soprano canadiana foi a cantora escolhida para interpretar a canção. Ela foi sublime e extraordinária tal como tinha sido na interpretação da canção oficial do filme “Beauty and Beast” em 1992. Ela é uma cantora muito amada em França e ganhou o festival da Eurovisão da canção pela Suíça em 1988 com uma música francesa (Ne partez pas sans moi) e vê-la a interpretar essa canção foi um motivo de grande regozijo e satisfação para mim pois sou luso-francófono. Na letra da canção ela canta que o amor nos “toca uma vez e dura uma vida inteira”. Ela atingiu notas muito altas na interpretação da canção e transformou a melodia numa verdadeira obra prima musical, casando muito bem esta música sentimental com o espírito do filme. Ganhou o Óscar de melhor canção original. Grande canção, grande letra!

Titanic é um filme mágico, uma verdadeira pérola preciosa da História do Cinema mas que nunca se perderá no imenso Oceano da História do Cinema. É uma história onde o amor não escolhe classes sociais, mas, sim, a sintonia de almas, pureza de sentimentos e o altruísmo verdadeiro que habita na alma de dois amantes apaixonados. Onde o amor é um poderoso jogo intuitivo onde não há espaço para a avareza, egoísmo, mesquinhez e arrogância e impossível de comprar com o dinheiro mas sim com o coração. Se descrevesse o filme Titanic com o nome de outro filme escolheria o nome do filme “Histórias que fazem o nosso coração crescer” que estreará nos cinemas a 5 de Março. Uma inesquecível obra prima do Cinema!

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Cris David Silva
Gosto muito de cultura e desporto. Tenho opinião vincada sobre várias matérias e gosto muito de refletir sobre os mais diversos assuntos. Sou apologista de que a vida deve ser vivida um dia de cada vez e com muita esperança e confiança, sabendo de antemão que a vida não é fácil e que é preciso muita força de vontade para conseguir dar a volta às situações difíceis.

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