Tremeu a terra, um abalo. Ou abalado estarei eu? Ou tremendo está meu corpo? Seja qual for a cousa, a terra tremeu, a minha pelo menos. Se abalado estou – ou trémulo – é porque minha terra está em prantos. O que não sei eu é se estão as terras dos outros de modo igual. Se estiverem, é isto cousa da mãe Natureza. E contra ela nada pode o Homem. Nada. A mais verdadeira das frases feitas. Se ao acaso zangada está… nós, os mais frágeis dos seres, nada podemos. Morrerão alguns, muitos ou poucos, depende de quem esteja das mortes falando. Morresse eu apenas e à minha mãe, se isto perguntassem, morreram para ela muitos, todos, o mundo inteiro. Morresse eu e mais dois e a outro alguém – que nenhuma de nossas mães fosse – disto falasse, diriam que, apesar da intensidade da terra tremida, evitaram-se catástrofes maiores, perdendo a vida três pessoas. Três mortes para um abalo da terra desta magnitude, cousa pouca para os noticiários, cousa maior para as mães dos finados, filhos cadáver. Assim é a vida, perspetivas, diferentes lados, diferentes cousas. O lado positivo, vêm os de fora. É quase sempre isto assim. Atentemos se não o é.
Outra vez.
Agora ouço o desconsolo das vizinhas, pelos gritos. Não sou só eu que tremo. Calaram-se. Cum diabo, que confusão. Assomei-me à janela. Tudo calmo. Pois que estes gritos não tiveram nada a ver com o que sinto eu. Aborrecimentos delas, zangas. Logo me inteiro do que as arreliou. Afinal… confirma-se, sou eu quem está abalado e sou eu quem está tremendo, não minha cama. Aconteceu o que eu temia, é isto de mim apenas. Se fosse a mãe Natureza, não tinham meus quereres importância, mas se sou eu que assim estou… só o estou porque isto estou permitindo. Cus diabos! Assumir culpa não é cousa que se nos agrade. Se o fosse não disto, fugia o Homem a sete pés. Mais fácil me seria se fosse culpa da Natureza o abalo. Sendo minha, a mim me cabe o cessar do tremor de meu corpo. E isto é cousa que não aprende um Homem mal nasça. É preciso ter desta humildade para nos sabermos assim, ainda aprendizes.