A verdade é que atravessamos uma crise à escala global motivada pelas alterações climáticas. Estamos inseridos num universo individual, de cada um por si, não olhando para um futuro, quanto mais para um futuro conjunto. Estamos demasiado centrados no eu, ignorando os problemas reais da Humanidade com H grande, descrevendo-os — aqueles que, pelo menos, estão atentos a esses flagelos — como ilusórios e sobrevalorizados. Isto dos incêndios na Amazónia não é mais que um aviso da Natureza quanto à veracidade mais que comprovada dos maiores problemas do nosso tempo, nomeadamente, a conservação das espécies, do nosso alimento universal: o oxigénio da vida.
Isto tudo se consegue relacionar com a maior crise de identidade do século XVI: numa sociedade fútil, clamando, acima de tudo, por materialidade, os egos movimentam a desumanidade, a (des)ordem das coisas, dos acontecimentos… o caos. Saramago dizia na epígrafe do seu livro Homem Duplicado que “o caos é uma ordem por decifrar”. Isto significa que, por mais que estejamos perdidos, carentes de causas e motivações maiores, basta um momento, um insight, para repor, pelo menos teoricamente, o status quo natural, genuíno, «correcto», da nossa casa.
Poder-se-ia dizer que isto é tudo de natureza política, de negligência diplomática, mas a verdade é que se trata, no fundo, de uma crise de valores. O poder demissionário de Bolsonaro, ignorando por completo os incêndios no Brasil que, deflagrando sem controlo nem diligência, puseram em causa a maior floresta tropical e o maior centro de biodiversidade do mundo. E nesse prisma estamos nós implicados, enquanto sociedade e o todo, que deve — ou devia — ser maior que a soma das partes…
Falta saber exactamente como resolver tudo isto. Provavelmente, nunca vamos poder arranjar uma solução precisa, imediata, com efeitos a longo prazo. Até lá, só nos resta dar um sentido ao caos — e encontrar, pelo menos por breves instantes, um bocadinho de humanidade.