A história do Lobo (Mau)

“Quem tem medo do lobo mau, lobo mau, lobo mau”. Quem ao narrar ou ouvir a história dos três porquinhos não trauteia esta música? Mas afinal de onde vem esse medo que valeu ao lobo o epíteto de mau? Talvez os mitos e contos que se propagaram ao longos dos séculos estejam relacionados com a sua ferocidade aliada à sua descrição morfológica; ao seu uivo característico; aos seus hábitos noturnos / crepusculares e à sua vida em alcateia.

Contudo, a perseguição a que esta espécie foi sujeita tornou os ataques a seres humanos extremamente raros, sendo que se perde na névoa do tempo o relato mais recente. Em países, nos quais Portugal se inclui, onde as batidas levadas a cabo por multidões armadas foram comuns, o lobo evoluiu naturalmente tendo apenas os exemplares mais receosos do Homem sobrevivido.

O habitat do Lobo Ibérico (Canis lupus signatus) até ao início do século XX estendia-se por toda a Península Ibérica. Atualmente em Portugal existem cerca de 300 (ou menos) indivíduos distribuídos por dois núcleos populacionais separados pelo rio Douro. Com o despovoamento de algumas regiões a sua presença torna-se mais visível.

Poucos, mas bons, continuam a desempenhar o seu papel de predador de topo contribuindo para a seleção natural dos exemplares mais débeis ou doentes. Ao consumirem javalis e veados reduzem os prejuízos que estes causam nas culturas agrícolas e florestais, evitando que transmitam ao gado doenças como a tuberculose e a brucelose. Como superpredadores contribuem para a diminuição de outros carnívoros como a raposa, a geneta, o texugo ou a fuinha minimizando o impacto destes nos animais domésticos e na caça. A sua presença afugenta os cães vadios ou assilvestrados que causam prejuízos avultados no gado, não compensados pelo Estado.

O lobo é uma peça fundamental para a manutenção do equilíbrio do ecossistema.

Conscientes da sua importância na natureza será que nos convívios em alcateias, em noites de lua cheia, os lobos também trocam entre si histórias e relatos sobre as ações do Homem que ameaçam a sua sobrevivência?

Na sua ementa já não existe a abundância de presas naturais de outrora. O seu habitat está fragmentado e deteriorado devido à construção de estruturas (barragens e autoestradas); a destruição da vegetação nativa e incêndios causa a fragmentação da população lupina, dificultando a dispersão dos animais e a permuta de indivíduos entre alcateias, tendo como consequência a perda de fertilidade e maior suscetibilidade a doenças. O sossego de alguns dos seus refúgios foi perturbado pela abertura de caminhos que permitem acesso ao ser humano a essas áreas. Arcam com as culpas de ataques a animais domésticos por parte de cães vadios ou assilvestrados com quem têm de competir por território e alimento.

Felizmente nas histórias que os lobos trocam entre si aparecem super-heróis que criam leis para garantir a proteção e conservação do Lobo Ibérico; e projetos que promovem a redução de conflitos com as atividades humanas como o correto maneio do gado não o deixando vulnerável à noite ou sem a companhia de um pastor, construção de vedações eletrificadas e a presença de cães de gado eficazes de uma raça como o Cão da Serra da Estrela.

Share this article
Shareable URL
Prev Post

Crepúsculo

Next Post

Qual a cor da liberdade?

Comments 2
  1. Um texto diferente para nova abordagem simples de mais um problema que nos afeta e ignoramos

Deixe um comentário

O seu endereço de email não será publicado. Campos obrigatórios marcados com *

Este site utiliza o Akismet para reduzir spam. Fica a saber como são processados os dados dos comentários.

Read next

Uma história simples

A Lili sempre viveu comigo. Quando chegou, mínima, minúscula e quase careca, fazia lembrar uma caricatura e não…

Alzheimer com Amor

Dias de sol fazem-se alternar com os dias pintados a nevoeiro. Mais um Verão, mais um Inverno e os dias, em…