Tinha 15 anos, quando em 1998, estreou a série norte-americana “Sex and the City”. Era uma série de emancipação feminina em que 4 amigas que vivem em Nova Iorque contam as suas aventuras amorosas enquanto jantam em restaurantes fancy, vestidas das últimas tendências da moda. As 4 personagens estereotipam mulheres distintas. A personagem principal é Carrie Bradshaw, escritora e colunista, viciada em moda, especialmente em sapatos e apaixonada pelo empresário Mr. Big. Charlotte York, galerista, romântica incurável que espera o seu príncipe encantado e acredita em contos de fadas. Miranda Hobbes, advogada, mulher prática e céptica relativamente ao amor. Por último, a minha personagem preferida, Samantha Jones, trabalha em relações-públicas, é uma mulher descomplicada e livre que vive de forma plena e sem tabus a sua sexualidade.
Passei boa parte da minha juventude a admirar estas mulheres e apesar de as saber ficcionadas e caricaturadas, todas tinham características que eu achava que tinham de ser replicadas na minha vida quotidiana.
A série terminou em 2004, mas o fenómeno continuava tão vivo que ainda foram realizados 2 filmes apesar de não terem sido propriamente sucessos de bilheteira.
Passados 20 anos, procurei online um corte de cabelo que me lembrava de ter gostado na personagem Samantha. O algoritmo registou a minha busca e tem bombardeado as minhas redes sociais com pequenos excertos da série que vou revendo, curiosamente, com algum espanto. Ver “Sex and the city” com 40 anos e à luz da sociedade actual é uma experiência completamente diferente daquela que tive há 20 anos. A personagem principal, Carrie Bradshaw, vive numa relação inconstante e tóxica com o Mr. Big e o que na altura me parecia um amor louco e romântico é afinal uma relação desequilibrada e pouco saudável. Ao longo de toda a série (e também nos filmes), Carrie sujeita-se a desconsiderações, infidelidades, humilhações e faltas de respeito em nome de um suposto amor irracional e louco que tudo suporta.
Enquanto as restantes 3 personagens têm experiências amorosas infelizes, mas dentro dos limites do razoável, Carrie vive presa a uma dinâmica amorosa que é tudo menos saudável. Se há 20 anos, a relação de Carrie Bradshaw com o Mr. Big parecia-me tumultuosa, mas aceitável, agora parece-me tudo menos um exemplo a seguir. É neste sentido evolutivo e de caminho firme que me sinto orgulhosa da minha condição feminina. Sei que com 20 anos aceitava coisas que hoje jamais aceitaria e que as mulheres que hoje têm 20 anos têm um nível base de exigência bastante mais alto.
Uma série como “Sex and the city” a ser realizada hoje teria de dar a mesma importância a uma relação justa e enriquecedora que a de há 20 anos dava à roupa da moda. Acaba por ser algo triste que uma série que fez as delícias das jovens mulheres da minha geração tenha como cenário principal uma relação doente e uma personagem principal romanticamente submissa e insegura. Há 20 anos, queríamos todas os sapatos da Carrie, hoje sabemos que queremos tudo menos andar nos seus sapatos.