A explosão de canudos ocorrida, a partir da década de 90 no nosso país, não se reflectiu em mais desenvolvimento e mais riqueza, como era de esperar, mas antes, numa geração claramente frustrada, que cresceu a escutar: “estuda, faz um curso superior e um dia serás recompensado”. Ao fim de três, quatro, cinco anos de formação superior, os jovens deste país encontraram um campo minado de políticas económicas mal estruturadas, responsáveis por anos de ilusão. Agora, de pouco vale lamentar o passado, é hora de arregaçar as mangas. Para alguns, a estratégia passa por adulterar o curriculum vitae e ingressar por profissões que não estão minimamente relacionadas com a sua formação, para outros, passa por percorrer o mesmo trilho dos pais e avós, e partir à procura de valorização noutro país, e ainda, para outros, a vida profissional será sempre uma procura insaciável pela concretização dos sonhos em terras lusas. Parece que de repente uma licenciatura passou a valer menos que zero.
A história do ensino superior em Portugal teve início, em 1920, na emblemática Universidade de Coimbra. Naquela época, o acesso era restrito a quem tinha condições económicas e sociais, por isso mesmo, não é de estranhar que um doutorado era colocado num pedestal. Actualmente, é comum ouvir-se que “qualquer um é formado”. Compreende-se. Em dez anos, o número de licenciados duplicou. Na década de 90, eram cera de 284 mil, hoje em dia, ultrapassam o milhão, equivalendo a 12% da população residente. Não se pode dizer que é qualquer um, mas é quase.
O problema nunca será o de existirem licenciados a mais, o que está na verdade em causa é o falhanço total de um plano de ensino não adaptado às reais necessidades do mercado de trabalho. Criaram-se cursos que nunca seriam absorvidos e vagas em áreas com poucas ofertas, dois erros, que ditaram a situação lamentável a que chegámos. Nunca se trabalhou para o pior, mas antes, em prol das estatísticas. Quisemos mostrar ao resto da Europa que éramos um país de doutores e o resultado é uma geração, a mais formada de sempre, que se debate com a terceira maior taxa de desemprego na Europa, de cerca de 40%. A alternativa para estes jovens na casa dos 20 e 30 anos passou a ser a de procurar emprego fora de portas. O Reino Unido, a Angola, o Brasil, a Suíça e a Suécia são dos países que mais recebem jovens portugueses licenciados. Quem decidiu ficar por cá, já se acostumou a ouvir os relatos dos professores, que se encontram por de trás dos números alarmantes de desemprego. Só para se ter uma ideia, há um ano os docentes desempregados inscritos no Centro de Emprego eram 11874, neste momento, são 20130, perspectivando-se o pior para os próximos anos. Os enfermeiros, os engenheiros civis, os jornalistas, os psicólogos, os investigadores, os advogados, os realizadores de cinema, os radiologistas, são apenas mais alguns dos exemplos de profissões com sérias dificuldades em vingar no nosso país.
A educação democratizou-se, passou a ser praticamente obrigatório ter um canudo na mão. Não importava o curso, se era ou não o mais indicado, o que realmente importava era ter uma licenciatura. Contudo, o que à partida parecia ser uma receita infalível revelou-se um desastre, muitos jovens foram e continuam a ser atirados para as universidades sem saberem o que realmente querem fazer do seu futuro. Em alguns países, os jovens são incentivados a fazerem uma paragem nos estudos durante um ano, para viajarem ou trabalharem, e, assim, poderem reflectir e conhecer um pouco melhor as adversidades da vida, antes de envergarem por um curso superior. A chegada da crise , em 2011, apenas veio colocar a nu o falhanço de duas décadas de ensino.
Adaptabilidade passou a ser a palavra de ordem. O que se aprende nas instituições de ensino já não é suficiente para garantir um emprego duradouro. A globalização e as novas tecnologias trouxeram enormes mudanças ao mercado de trabalho: quem não se adapta corre o sério risco de ficar para trás. Ao contrário do que se passava há quatro, cinco anos, a experiência já não é determinante, hoje, o binómio qualificação/experiência é fundamental para conseguir uma colocação. Mesmo assim, dos mais de 20 mil jovens desempregados, números de Setembro, a tendência continua a ser a de melhores perspectivas de emprego a longo prazo para quem tem formação superior do que para quem tem o ensino secundário, ou um nível de ensino inferior.
Os empregadores exigem o domínio de uma segunda língua, conhecimentos de informática na óptica do utilizador, capacidade de iniciativa e liderança, criatividade, qualidades de bom relacionamento, bom senso e gosto pelo trabalho em equipa. Segundo, Amândio Fonseca, director da Egor Portugal, filial-Recursos Humanos, “cada vez mais se procuram profissionais que não trabalhem com base num horário, mas se proponham a atingir objectivos e se integrem na imagem da empresa”. O emprego fixo, também tenderá a desaparecer. “ A mudança de actividade ao longo da vida vai ser uma das características dos próximos tempos”, afirma.
O leque de competências dos jovens vai ter que ser necessariamente alargado. A evolução do mercado de trabalho da nossa economia vai implicar o florescimento e o declínio de alguns sectores. Poderá estar para breve o regresso ao sector primário, onde se integram actividades ligadas à agricultura, em decadência, como é o caso da pecuária, da silvicultura, da caça e da pesca. O ensino especializado em áreas mais técnicas, como por exemplo, electricista, serralheiro e condutor de máquinas, poderá vir a ser outra alternativa a ser adoptada. Entretanto, o governo já mostrou a intenção de reestruturar o sistema, uma vez que, segundo os resultados da primeira avaliação da Agência de Acreditação do Ensino Superior, mais de uma centena de cursos do ensino superior público e privado vão ter de encerrar. O curso de Medicina na Universidade de Aveiro é um dos exemplos de cursos a encerrarem, nos próximos anos. No entanto, seria necessário olhar de forma séria para a realidade que nos rodeia, antes de se efectuarem quais queres tipos de cortes, tal como evidenciou António Vicente, presidente do Sindicato Nacional do Ensino Superior (SNESup), numa conferência realizada no Diário de Notícias, no dia 13 de Novembro. Qualquer tomada de decisão relativa à reorganização e racionalização da rede e da oferta formativa não deve ser feita “de forma avulsa e sem ponderação”, mas antes “segundo um projecto do País para esta área”. Responsabilidade que, na primeira linha, “deve ser assumida pelo Ministério da Educação”, mas no âmbito “de uma concertação social no ensino superior”.
Numa altura em que a situação do país e a competitividade da nossa economia são o ponto de ordem da nossa realidade, Fernando Sebastião, presidente do Instituto Politécnico de Viseu (IPV), enfatizou, durante uma conferência, que para as empresas portuguesas serem competitivas “só é possível, se Portugal tiver profissionais devidamente qualificados e preparados para esse desafio.” Na perspectiva do Presidente do IPV, “para haver desenvolvimento económico é fundamental a aposta na qualificação das pessoas. A sua formação é determinante para a modernização do país e para o seu desenvolvimento.”
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