Há quanto tempo não se permite a fazer absolutamente nada? Nada! Apanhar sol na cara, observar a cidade? Sem ler a última revista da área ou o livro que está em espera há meses. Estar só por estar. Fazer absolutamente nada! Arrisco-me a dizer que há bastante tempo e eventualmente não falho por muito. Pelo menos comigo é assim!
Numa sociedade em que se valoriza o overworking, não fazer nada parece um ato de revolta e de desafio à nossa própria natureza. Estudar para ter bons resultados, trabalhar para ser bem remunerado, ser eficiente para progredir na carreira. Passamos de um objetivo para outro, praticamente sem saborear a conquista. Não descansamos. Não podemos. Quando tivermos tempo, fazemos. Os momentos de ócio, fundamentais para a produtividade e bem-estar, são vividos com pesar e vistos como símbolo da nossa própria preguiça sistémica. Não podemos. Não temos tempo! De repente é socialmente mais aceitável passar o fim de semana a trabalhar do que num convívio saudável e lúdico. Ousámos viver?!
“Anda. Vamos despachar, não temos tempo!” Quem nunca repetiu estas palavras a uma criança expectante por brincadeira numa manhã de escola é porque simplesmente não as tem ou porque vive à margem desta realidade social. Vivemos na constante demanda por alcançar o tempo, e no caminho acabamos por permitir que este nos escape por entre os dedos. Fazemos o nosso melhor, mas perdemo-nos a nós e ao essencial.
Christopher Robin é um fantástico lembrete disso mesmo.
O emotivo live-action da Disney de 2018 leva-nos de volta ao Bosque dos Cem Acres de Winnie de Pooh e Companhia, numa mistura delicada entre fantasia e realidade, quando Christopher Robin (Ewan McGregor) é obrigado a regressar ao bosque da sua infância para reunir Pooh com os restantes animais. Nesta viagem, Christopher, um adulto infeliz, sério e enfadonho, é obrigado a redescobrir a sua criança interior e o seu lado mais leve e divertido que se perdeu ao longo dos anos.
A história vive da nostalgia que suscita, seja através das personagens muito ao estilo dos anos de 1950, seja pela auto-análise que sugere ao espectador. Como somos enquanto adultos, enquanto ex-crianças, de que forma nos estamos a sair nesta luta da vida adulta? Torna-se impossível que não nos questionemos sobre a nossa própria postura e atitude face aos acontecimentos que vão sendo retratados.
Christopher Robin é um adulto que num tempo e num espaço diferente do nosso, sente as mesmas angustias e pressões que nós. É um trabalhador dedicado e no limite, que na tentativa de se superar e não falhar na profissão, falha consigo mesmo e com quem lhe é mais próximo. Na luta pela excelência e eficiência, transmite, ainda que inconscientemente, essas pressões e angustias a quem o rodeia. Identifica-se?
A vida adulta e os vários acontecimentos que lhe sucedem, empurraram a sua criança interior para o lugar mais recôndito da sua essência, acabando por se perder e desequilibrar. Pooh e os amigos reaparecem num momento fundamental, obrigando-o a se reconectar com essa sua faceta que ele próprio julgava perdida. As cores tornam-se mais limpas e vibrantes, a vida ganha uma nova magia. Deixemo-nos inspirar!
Temos uma existência tão cheia de regras, em que não nos permitimos à pausa e à reconexão connosco e com o que nos rodeia. Vivemos já no amanhã, na ânsia de tornar o hoje memorável. Cada vez mais conectados e eficientes, esquecemos ou ignoramos o básico. Não nos permitimos saborear, descansar ou aproveitar. Esquecemo-nos de que às vezes o melhor a se fazer, é não fazer nada…mas isso é tão difícil!