Mário Alberto Nobre Lopes Soares nasce no dia 7 de Dezembro de 1924, no seio de uma família laica e republicana onde a instrução e o conhecimento estão em primeiro lugar. Tem uma vida agitada e cedo se dedica a causas políticas que o levarão a situações melindrosas.
Licencia-se em Ciências Histórico-Filosóficas, na Faculdade de Letras de Lisboa, em 1951 e depois em Direito, na Faculdade de Direito de Lisboa em 1957. Esteve ligado ao Colégio Moderno, fundado pelo seu pai, onde foi professor e responsável. Mais tarde a sua mulher, Maria de Jesus Barroso Soares e a sua filha Isabel, serão as continuadoras desta tarefa.
Enquanto advogado defendeu Álvaro Cunhal e a família do General Humberto Delgado, sendo que as suas intervenções se tornaram mote para os seguidores. Foram tarefas complicadas, numa época de ausência de liberdade e recursos demonstrando, claramente, que acreditava no que estava a defender.
Por influência de Álvaro Cunhal, em 1943, adere ao Movimento Nacional Antifascista e em 1946 é co-fundador do MUD Juvenil, Movimento União Democrática. Em 1949, pertence à Comissão de candidatura do General Norton de Matos, à Presidência de República e, em 1958, também se envolve na candidatura do General Humberto Delgado.
1955 é o ano em que se liga à Resistência Republicana e Socialista e é candidato a deputado, à Assembleia Nacional do Estado Novo, pela oposição democrática, em 1965, pela CDE e, em 1969, pela CEUD. A 19 de Abril de 1973 torna-se co-fundador do Partido Socialista.
Foi preso 12 vezes e cumpriu 3 anos de cadeia. Deportado para S. Tomé, em 1968, não teve direito a julgamento. Salazar assim o decretou e aí permaneceu até 1970, quando Marcelo Caetano lhe “permite” a ida para França. Foi professor nas Universidades de Vincennes e Sourbonne, sendo agraciado com o título de Honoris Causa. Adere à Maçonaria, em França, mas, posteriormente, passa para a situação de “adormecido”, nas suas próprias palavras.
Regressa a Portugal no dia 28 de Abril de 1974 e no período seguinte, o chamado PREC, torna-se um político de destaque. Consegue, em 1975, uma grande vitória socialista para a Assembleia Legislativa que teria como missão a elaboração da Constituição da República.
A sua actividade política é intensa: Ministro em vários Governos Provisórios e Primeiro Ministro nos I, II e IX Governos Constitucionais. Atingiu o expoente máximo, como Presidente da República, em 1986. Esteve no cargo durante 10 anos, ou seja, 2 mandatos seguidos. Depois desta data, tornou-se mais recatado, uma vez que os 72 anos já lhe pediam algum descanso.
Este homem teve uma origem curiosa, no mínimo. O pai tinha sido sacerdote e Ministro das Colónias, na I Republica, o que o motivou sempre para grandes tarefas. A mãe, professora primária, cedo o instruiu nas letras e no conhecimento em geral. Cresceu num ambiente propício ao desenvolvimento intelectual.
O seu casamento, com Maria Barroso, realizou-se por procuração, na prisão, no dia 22 de Fevereiro de 1949. Desta união nascem 2 filhos, João e Isabel Soares. O filho terá, igualmente, uma carreira política, chegando a Presidente da Câmara de Lisboa e a filha continuará com o colégio da família.
A política é um bichinho que rói e se manifesta de várias formas. Em 2005, é convidado para ser candidato, novamente, à Presidência da República. Tem 81 anos e ainda muita vontade de poder. Fica num humilhante 3º lugar, com 14% dos votos, por uma mera coincidência, na data do aniversário do seu casamento.
Aos 89 anos, foi eleito como personalidade do ano pela imprensa estrangeira sediada em Portugal. 3 anos antes tinha recebido o Doutoramento Honoris Causa, pela Faculdade de Letras, coincidindo com o centenário da implantação da República.
No 40º aniversário do 25 de Abril, recebeu das mãos do Presidente da Câmara, as chaves da cidade de Lisboa, honra máxima que se pode desejar. No seu currículo, constam outras condecorações: Grã-Cruz da Ordem Militar Cristo, em 1981, Grã-Colar da Ordem Militar Torre e Espada, em 1991, e ainda o Grã-Colar da Ordem da Liberdade, em 1996.
Este homem também era mundano e gostava de cuidar de si. Tinha por norma ir ao mesmo cabeleireiro masculino, onde a sua aparição suscitava verdadeiras tertúlias. A sua presença era impossível de passar despercebida não só pela figura em si como também pelo modo como se deslocava. A humildade nunca foi o seu forte.
O seu nome ficará, para sempre, ligado ao processo de descolonização. Ainda hoje, passados tantos anos, existe uma enorme dificuldade em aceitar que ele foi apenas um interveniente e que o erro tinha começado na colonização. Pode não ter sido perfeito, mas foi o possível, o modo de evitar mais perdas e prejuízos.
Como em qualquer questão, existem os dois lados e raramente se encontra o chamado consenso. Mário Soares constará nos anais da História como uma pessoa polémica não só pelas posições que tomou como também pelo comportamento que mostrou.
Pode ser apelidado de arrogante e de convencido, de altivo e ditador, mas teve um papel de relevo na política portuguesa dos últimos anos. Se o Presidente da República tem um mero papel decorativo, a ele se deve, à sua insistência para lhe retirar poderes, enquanto Primeiro Ministro, situação que nunca foi corrigida.
Para um republicano mostrou sempre um comportamento estranho, mesclado de monárquico e até mesmo czarista, rodeando-se de familiares influentes, ou com cargos atribuídos, lembrando um núcleo feudal, um sistema senhorial muito próprio, um autêntico nepotismo. O certo é que o cerco estava sempre bem fechado.
Figura da política, onde exerceu todos os tipos de cargos, desde Deputado a Presidente da República, passando por Ministro e Primeiro Ministro, a sua acção foi sempre direccionada em prol da sociedade portuguesa. Não houve cantinho que lhe escapasse e nunca a verborreia foi insuficiente para se manifestar sobre o que quer que fosse.
Polémico o suficiente, acabou por perder a noção do que o rodeava e fazia questão de se imiscuir em todos os assuntos, mesmo não estando dentro das verdadeiras e reais circunstâncias. Ficará para sempre com esta aura de mal amado, odiado pela direita e mal visto pela esquerda. Nem o slogan “Soares é fixe” o ajudou nos últimos tempos.
Ironia do destino: o homem que mais defendeu o serviço público de saúde morre a 7 de Janeiro num hospital privado. O velho provérbio “Bem prega Frei Tomás, faz o que ele diz e não o que ele faz” aplica-se na perfeição.