Liberdade algorítmica ou ilusão de escolha?

Num mundo cada vez mais tecnológico, onde os algoritmos são os novos oráculos da nossa rotina, é inevitável perguntar: será que ainda pensamos por nós? Ainda somos livres para escolher? Ou estamos apenas a reagir ao que nos é mostrado, sugerido, imposto? Quantas vezes procuramos algo na internet e, de repente, sem querermos, começamos a receber recomendações sobre o mesmo tema, como se a nossa curiosidade momentânea tivesse sido transformada numa preferência permanente? Roupa, viagens, estudos, hotéis. Tudo se torna viral num segundo.

Mas a verdade é que os algoritmos não são neutros. São projetados para nos manter cativados, para prever os nossos desejos antes mesmo de os formularmos. Mas até que ponto essa predição é genuína? Até que ponto somos influenciados por sugestões que aparecem, não porque as escolhemos, mas porque foram escolhidas para nós?

Acordamos com notificações que nos dizem o que aconteceu enquanto dormíamos. Os nossos feeds, cuidadosamente curados por sistemas que conhecem os nossos padrões melhor do que nós próprios, mostram-nos o que devemos ver, o que devemos ler, o que devemos comprar, quem devemos seguir, em quem devemos votar. Tudo parece ser escolhido, assim, como se fosse nosso desejo.

É subtil. Não obriga. Mas empurra. Suavemente. Todos os dias.

A tecnologia prometeu-nos liberdade. Acesso. Informação. Voz.

E, em muitos aspetos, cumpriu.

Mas também nos colocou numa bolha invisível, onde as nossas escolhas são moldadas por dados que já fornecemos, gostos que já clicámos, padrões que já repetimos. Chamamos-lhe personalização. Mas será isso liberdade? Ou uma ilusão cuidadosamente projetada para que nunca saíamos da nossa zona de conforto digital?

O problema é que o algoritmo não pensa. Calcula. E, ao fazê-lo, deixa de fora o inesperado, o contraditório, o diferente — exatamente aquilo que faz o pensamento humano evoluir. Se tudo o que vemos confirma o que já acreditamos, como podemos crescer? Se nunca somos confrontados com o outro lado, como podemos escolher?

Num mundo dominado por algoritmos, talvez a maior rebeldia seja parar. Mudar. Escolher conscientemente. Procurar o que está fora da curva. Ler o que não nos foi sugerido. Pensar fora da caixa. Falar com quem pensa diferente. Questionar por que razão estamos a ver isto… e não aquilo.

A tecnologia não é o inimigo. Mas também não é neutra. De todo. É um espelho das nossas preferências, mas também um filtro que oculta o que nos poderia desafiar. E por isso, cabe-nos a nós relembrar: a liberdade de pensamento não é um dado adquirido. É um exercício. Um esforço diário. Uma responsabilidade. Cabe-nos a nós continuarmos a mantê-la. Sim, a liberdade de pensar por nós.

Talvez a pergunta que devamos fazer não seja “se temos liberdade de pensamento”, mas sim: estamos dispostos a usá-la? Ou preferimos a comodidade de deixar que o algoritmo pense por nós?

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