Senti que tinha uma missão a cumprir, que precisava desta experiência social de modo a perceber o que tinha acontecido ao longo dos anos. Onde falhámos e onde acertámos, porque certamente fomos responsáveis por ambas as situações.
Peguei nuns “pozinhos de perlimpimpim” e voltei a 1991. Não se espantem! Por mérito das tecnologias com que nos brindam atualmente, consegue-se tudo.
Neste ano entrava para a 1ª classe da escola primária, terminologia completamente obsoleta e glamorosamente substituída, nos dias de hoje, por 1º ano.
Lá estava eu, toda entusiasmada com a mochila às costas, cabelo pela orelha e franja bem aparada. Transpirava respeito pela professora e ambicionava ser uma boa aluna, aprender muito, ser a mais inteligente da sala, ter boas notas. O quadro de ardósia era um objeto maravilhoso e imponente que, na mesma medida, temíamos e admirávamos. Havia uma maquineta fantástica capaz de refletir imagens para a parede, os chamados slides, e esta era, na altura, a prima irmã mais próxima dos tablets ou computadores, ainda que não pudéssemos prever como ou quando viria a ser a sua existência numa sala de aulas.
Foi precisamente esse primo emprestado – o tablet – que levei para 1991. Ninguém sabia o que era, naturalmente. Ninguém sabia mexer nele e após os primeiros minutos de manuseamento e saciada a curiosidade inicial, quando deu o toque de aviso para o intervalo, todos saíram da sala e foram brincar à apanhada, às escondidas, à macaca, ao Rei Manda. Era fácil ser criança, era genuinamente mais gratificante ser professor.
Ao professor cabia o papel de ensinar, de dar a conhecer um mundo novo, uma série de janelas de oportunidades que, para a maioria de nós, não se abririam de outra forma. Era, objetivamente, beber conhecimento. Ao aluno pedia-se que aprendesse, que respeitasse o professor, que estivesse com atenção, que fosse um bom/boa menino/a.
Esta engrenagem funcionou durante muitos anos, até ficar ultrapassada.
Nesta geração, as crianças iniciam a escolaridade já com uma pontinha de disputa, porque, o acesso ao conhecimento se materializa de uma forma muito mais imediata. Tudo já foi visto online, já não há novidade, não há espanto, não há entusiamo. Engenham-se artimanhas para conseguir com que os miúdos estejam atentos e nutram real interesse por algo mais do que o Tik Tok, Facebook, Instragam, Bloggers ou Youtubers. E nem precisamos chegar ao 1º ano, basta-nos ver um bebé de dois anos (sendo muito simpática) pegar num telemóvel e manejá-lo como se sempre o tivesse feito. Conseguimos, até, achar algum encanto nas aprendizagens dos nossos rebentos — tais prodígios deste século — quando constatamos que o nosso filho ou filha já sabe dizer os números em inglês, as frutas ou as cores porque as aprendeu online.
Desta forma, que papel inglório têm os professores atualmente? Quer concordemos ou não, haverá a necessidade de se adequarem aos novos tempos e procurarem alternativas ao sistema educacional que vigora, que me parece arcaico tendo em vista o grau de exigência intelectual desta descendência. O quadro de ardósia deveria dar lugar aos projetores de última geração e os livros a tablets. Porém o problema escala quando não existe qualquer apoio por detrás disto, ou seja, se o professor decidir adequar-se aos novos tempos e proporcionar aos seus alunos uma alternativa que passa por entrar diretamente no mundo deles, aliando tecnologia a conhecimento, possivelmente conseguirá melhores resultados, mais interesse, e até — atrevo-me a dizer — mais respeito. Se, por outro lado, o professor, por ser de uma geração anterior e não tiver essa capacidade, ou simplesmente porque decide não o fazer porque a isso não é obrigado pelo Ministério que o rege, não o fará, continuando a impor um sistema retrógrado e que em nada estimula o aluno. Concordando ou não com a abolição de manuais, a verdade é que o objetivo principal do ensino se baseia, precisamente, na capacidade que um professor tem de conseguir estimular o seu aluno. Ora, se ele aprende e se sente entusiasmado diria que a missão terá sido bem-sucedida. Contudo, se insistirmos num método que em nada os entusiasma ou incentiva, o propósito perde-se, unicamente porque quem deveria agir, não muda nem tempos nem vontades.
Como explica Peter Gray, pesquisador, professor de psicologia e escritor do livro “Freedom to Learn”, teremos de conseguir comparar as tecnologias dos dias de hoje como uma ferramenta tão importante para a nossa sociedade, como os arcos e flechas foram para os nossos antepassados.
Posto isto pergunto-me: Quando estarão, então, os nossos professores munidos dos arcos e flechas necessários ao ensino do século XXI?