O canibalismo é o acto de comer indivíduos da própria espécie e pode ser observada em várias espécies de seres vivos como um comportamento habitual. Na Psicologia, descreve-se este acto como sendo resultado de impulsos agressivo-orais, não controlados, sendo um acto antissocial fruto do desejo de dominação.
Os casos particulares de canibalismo na nossa sociedade actual relacionam-se principalmente com situações extremas, tais como a fome, as guerras, os crimes macabros e os problemas mentais. Porém, não serão esses os exemplos sobre os quais este artigo se irá debruçar, nem sobre o canibalismo no reino animal. Falemos sim do canibalismo a nível tribal e antropológico.
Voltando no tempo, não se sabe exactamente quando os seres humanos adquiriram o hábito da antropofagia. Na Europa, especificamente na França e na Alemanha, estudos feitos em marcas de ossos humanos mostram que aqui se practicou o canibalismo e que, por exemplo, o Homo antecessor tinha esta prática alimentar há 800.000 anos, sendo esta a referência histórica mais antiga sobre o canibalismo.
No antigo Egito, no final do terceiro milénio A.C., devido a uma longa e terrível seca, a fome levou as pessoas a várias revoltas e também ao canibalismo, ficando esta época conhecida na história egípcia como “os anos dos chacais”.
Também na época das descobertas e aventuras pelos mares, os conquistadores relataram várias vezes o canibalismo e inclusive parte da tripulação de James Cook foi devorada na Nova Zelândia pelos maoris.
Durante a conquista do México, entre os povos aliados e adversários de Hernán Cortés, a prática do canibalismo era habitual em certas cerimónias religiosas e até era costume os indígenas levarem sal para o campo de batalha para conservar melhor a carne inimiga. Desta forma, os corpos aguentavam sem apodrecer até que pudessem voltar para as suas casas e fossem repartidos como “alimento” entre os seus familiares.
Os índios Guaranis praticavam o canibalismo com fins religiosos e acreditavam que era uma maneira de adquirir características e aptidões das vítimas. Por isso, não se alimentavam de qualquer um. Alimentavam-se apenas dos melhores guerreiros, ou dos líderes inimigos, para, assim, obterem as melhores qualidades.
Se já para nós o canibalismo soa como algo bizarro e aterrador, para aqueles homens que foram com os seus barcos para novas terras por descobrir e que, por sua vez, eram tão apegados às suas crenças religiosas, pensemos como deve ter sido verem com os seus próprios olhos e viverem pela primeira vez o canibalismo. Deve ter sido sem dúvida uma experiência pavorosa, uma das obras mais macabra do diabo, pelo que a o canibalismo foi uma das causas que justificou as práticas brutalíssimas colonialistas.
Antropólogos afirmam que actualmente o canibalismo nas tribos é algo praticamente inexistente e que há apenas alguns casos pontuais. Outros afirmam que há um grande número de tribos afastadas da globalização sobre as quais não sabemos nada e nas quais acredita-se que o canibalismo seja ainda praticado.
O caso actual mais conhecido ocorre na Nova Guiné, onde habita a tribo Korowai. Esta tribo confessa ter um ódio enorme contra outra das tribos da região, os Khakhuas, e só devoram membros desta tribo, que, por sua vez, são também canibais. Contudo, quando os Korowai praticam o canibalismo, tudo é feito sob um ritual no qual não participam crianças, nem mulheres grávidas e onde se aproveita quase tudo do inimigo, com excepção dos ossos, das unhas e dos genitais e deve dizer-se que o cérebro é a parte mais cobiçada.
Estudos mostram que o ser humano está evolutivamente programado para evitar o canibalismo, devido a questões puramente biológicas – comer outras pessoas, especialmente o cérebro, pode originar numa doença conhecida como Kuru. A tribo Fore, também da Nova Guiné, durante a primeira metade do século XX viu-se a braços com uma epidemia desta doença. O Kuru é uma doença cerebral degenerativa e mortal, que aparece por causa da ingestão de outros seres humanos e que é ocasionada por prião, assim como a doença das vacas loucas. Os infectados por Kuru sofrem de perda de memória, de mudanças de personalidade, de convulsões e normalmente morrem um ano depois de terem contraído a doença. Inicialmente, médicos e antropólogos não sabiam a razão que tinha levado esta doença a espalhar-se pela tribo Fore, mas, em 1950, descobriu-se que a infecção era transmitida em cerimónias fúnebres, onde membros da tribo comiam os seus familiares mortos como sinal de respeito. Após esta descoberta e da morte de quase toda a tribo, abandonou-se este ritual.
Para além destes casos mais actuais na Nova Guiné, na região amazónica, acredita-se que as tribos dos Korubo e dos Shamatari possam praticar o canibalismo, enquanto que na Ásia talvez seja praticado pelos Ostiaks da Sibéria e os Dayaks e Bataks de Sumatra e Bornéu. Contudo, das suposições à realidade há uma grande diferença, apesar de todas estas tribos serem bastante agressivas contra qualquer estranho que se aproxime.