
Todos os homens que não conseguem ver com os olhos de uma mulher são tolos. E eu, durante todos aqueles anos em que estivemos juntos, nem com os meus próprios olhos consegui ver-te.
Tu sempre soubeste que eu não era o homem da tua vida, mas, no início, achavas piada a este meu jeito desajeitado, a esta minha rapidez rara de pensamento, tantas vezes estagnado e a esta minha sensibilidade, quase sempre gelada.
Trombudo, macambúzio, dramático, inoperante, desinteressado, resmungão, stressado, alienado e, de quando em vez, muito bem-humorado.
Ciumento, doentio, desleixado por natureza, preguiçoso sadio e perfeccionista relaxado.
E, ainda assim, tu achavas-me piada.
Sentias-te protegida, incompreendida e mal-amada, mas ambos sabemos que não há nada melhor do que dormir acompanhada.
Um homem sempre ajuda, quando não atrapalha, e nas noites geladas de inverno, sempre te aquecia a cama, mesmo sabendo que o que apregoava não passava de exacerbada fama.
E, ainda assim, tu achavas-me piada.
Depois fui embrutecendo, gritando, criticando, exigindo, pressionando, perseguindo, controlando, grunhindo, desaparecendo do teu pensamento e tu logo cuidaste de soltar a vela assim que sentiste o primeiro ulular romântico do vento.
Hoje, já não me achas piada nenhuma, mas ris-te de mim, não porque eu tenha graça, mas porque percebeste que continuar comigo era pior do que cair em desgraça.