Consta dos registos oficiais que o número de “eleitores-fantasma” ronda cerca de um milhão. Quem serão estas almas penadas que pululam sobre as urnas de voto, rendendo-se assim à vontade dos restantes eleitores? Este cerca de um milhão resulta do cruzamento de várias fontes.
Muito recentemente temos os dados dos indicadores demográficos obtidos pelos Censos de 2021. Desta pesquisa de habitantes do território português, resultou que a “Ocidental praia Lusitana” conta com cerca de 10,35 milhões de habitantes. A este número é preciso subtrair os habitantes que não têm direito a voto, que são os cidadãos com menos de 18 anos de idade – cerca de 1,63 milhões, e os estrangeiros – cerca de 555 mil. Assim, serão cerca de 8,16 milhões os putativos eleitores em Portugal. Este número é depois cruzado com o número de eleitores previstos para as próximas eleições para a Assembleia da República.
No total, são 10,82 milhões. A estes teremos ainda de descontar os inscritos nos círculos da Europa e fora da Europa, porque vivendo estes no estrangeiro, não contaram para os Censos 2021. Desta operação resulta o número de eleitores apenas em Portugal – 9,3 milhões. Chegamos assim aos “eleitores-fantasma” – 1,14 milhões, cerca de 10 por cento do total.
As sondagens e os resultados eleitorais são comunicados e divulgados, porque a soberania em que se baseia o Estado de direito democrático reside no povo. E o povo exerce essa soberania manifestando a sua vontade política através de eleições. O Estado de direito democrático integra regras que reforçam a ideia de sujeição do poder a normas jurídicas, garantindo assim aos cidadãos liberdade, igualdade e segurança. Destas regras advém a transparência pela qual se regem os partidos políticos, as campanhas eleitorais e os resultados finais. Esta transparência, enquanto princípio decorrente do Estado de direito democrático, integra essencialmente uma vertente ética. Porque proíbe a opacidade do funcionamento e da atuação da Administração. Ou seja, o princípio da transparência obriga a que a organização e o procedimento administrativos estejam regulados e ordenados, e que a Administração sempre se comporte de forma a que se dê publicidade ao que a Administração faz.
Assim, o recenseamento eleitoral é oficioso e obrigatório, querendo isto dizer que todos os cidadãos nacionais, maiores de 17 anos, são automaticamente inscritos na base de dados do recenseamento eleitoral, devendo essa informação ser obtida por cruzamento com os serviços do cartão de cidadão. Por conseguinte e porque o curso da vida sofre alterações, são eliminadas as inscrições no recenseamento daqueles que não gozem de capacidade eleitoral ativa estipulada nas leis eleitorais, dos cidadãos que hajam perdido a nacionalidade portuguesa nos termos da lei, de eleitores que hajam falecido, dos cidadãos eleitores estrangeiros que deixem de residir em Portugal ou que, por escrito, o solicitem e de cidadãos nacionais no estrangeiro quando duplamente inscritos.
Reflita-se. Os dados numéricos apresentados decorrem de meses de pesquisa. Entretanto, a esfera eleitoral de cada cidadão é suscetível de sofrer alterações, porque a vida não é estanque. Tal como a elaboração das leis acompanha e ficciona a vida em sociedade, que se apresenta sempre mais célere, a administração também não tem capacidade de acompanhar, a não ser periodicamente, as alterações aos cadernos eleitorais.
Parece, assim, quanto ao alarmismo causado pelos níveis de abstenção nas eleições, que “a montanha pariu um rato”. Pois que, desde que esteja assegurada a liberdade do direito de voto dos cidadãos, e a transparência no cenário das eleições, não será afetado o funcionamento do Estado de direito democrático. Veja-se até que o regime do recenseamento eleitoral ressalva este aspeto, não permitindo que os cadernos eleitorais sejam alterados nos 15 dias anteriores a qualquer ato eleitoral, garantindo assim a preservação dos mesmos, tendo em vista a sua segurança e certeza jurídicas, essenciais à confiança no sistema de eleitores.