Educação: A Revolução de Crato

As escolas já reabriram para o ano lectivo 2012/2013, mas nem mesmo assim a cortina da Educação deixa de ser objecto de mudanças e novas polémicas. Para Filinto Lima, dirigente da Associação Nacional de Directores de Agrupamentos e Escolas Públicas (ANDAEP), bastou que o ano lectivo arrancasse para se aperceber que “acabou a pobreza envergonhada” e que os pais começassem a falar abertamente sobre o que os desespera e as dificuldades que passam para ter os filhos a estudar.

Os pedidos de ajuda, embora diferentes, vêm de muitas famílias que ora pedem que lhes dêem os manuais escolares afixados nas pautas à entrada das escolas, ora mais apoios da acção social escolar. Se antes as refeições faziam parte de uma maior preocupação com crianças mais carentes, agora o cuidado e atenção espalham-se muito mais. “Temos preocupações com aquilo que vão ser os apoios da Acção Social Escolar (ASE), em função do levantamento que a Segurança Social está a fazer à situação das famílias e dos apoios sociais”, disse à agência Lusa Albino Almeida, presidente da Confederação Nacional das Associações de Pais (CONFAP), onde têm chegado receios de famílias que terão “grandes dificuldades em manter os filhos na escola”, se não tiverem apoio para manuais escolares, materiais didácticos, alimentação e transporte, nos casos em que as escolas “ainda não estão habilitadas para poder responder”.

Já Manuel Pereira, da Associação Nacional de Dirigentes Escolares (ANDE), garante que o desespero dos pais foi identificado, sobretudo, pela maior e mais crescente presença dos encarregados de educação na primeira reunião de arranque do ano lectivo. O clima de instabilidade que o país atravessa tem levado a que os pais se tenham apoiado nos recursos mais próximos de si, e a escola dos filhos não foi excepção à regra. Apesar de os esforços das duas associações estarem em sinergia, os dirigentes têm sérias dúvidas quanto à real ajuda que poderão dar a estes pais, quando a situação escolar interna está numa maré não mais favorável.

O cenário que se vive no seio dos professores é aflitivo e pode-se reflectir nos alunos. Existem os que têm horário zero, vivendo num clima inconstante, e os que fazem horas diárias de caminho para chegarem ao seu local de trabalho. O dirigente da Confederação Nacional Independente de Associações de Pais (Cnipe), Rui Martins, garante que “vivemos este ano uma escola triste, com actores tristes”, onde a oferta educativa é cada vez mais selectiva. “Em vez de optar pela redução do número de alunos por turma, o que permitiria uma melhoria no processo de aprendizagem, decorrente de um acompanhamento mais próximo, o Governo não só não reduz, como ainda aumenta o número de alunos por turma”, contestou Jorge Pires, da Comissão Política do Comité Central do PCP.

Em Maio deste ano, Nuno Crato, o Ministro da Educação e da Ciência, anunciou que os estabelecimentos públicos de ensinos pré-escolar, básico e secundário teriam um reforço da legitimidade e mais autonomia com a flexibilização de planos curriculares próprios e organização dos tempos lectivos. Já a figura do Director da escola será, de hoje em diante, cada vez mais olhada como um gestor da comunidade escolar daquele estabelecimento. A alteração do regime jurídico da gestão dos estabelecimentos públicos de ensino foi feita em regime consensual entre os sindicatos, conselho de escolas, associação de municípios e associações de pais, com vista a potenciar a continuidade de bons níveis de ensino num cenário de menor alento.

No ensino superior, o Ministro da Educação e da Ciência, Nuno Crato, assegurou que todos os cursos que ocupem menos de 20 cadeiras de uma sala terão um financiamento mais reduzido no ano lectivo 2012/2013. A Federação Nacional de Associações de Estudantes do Ensino Superior Politécnico garante que os novos critérios impostos pelo Ministério da Educação e Ciência vieram dificultar o acesso ao ensino superior, sobretudo aos cursos de engenharia. O aumento das propinas tem sido “generalizado ao longo da última década”, aponta o presidente da Associação Académica de Coimbra, Ricardo Morgado. O valor tem mantido sempre a tendência de subida e neste ano lectivo já vai ultrapassar, em muitas universidades, os mil euros. “Começa a estar em causa a sustentabilidade do sistema”, adverte o representante dos estudantes da universidade mais antiga do país. Tanto mais que o corte do financiamento público faz com as instituições dependam cada vez mais do valor pago pelos alunos.

As medidas levadas a cabo pelo Ministério da Educação têm sido contestadas por João Dias da Silva, Presidente da Federação Nacional de Educação (FNE), que, em declarações à agência Lusa, assegurou um descontentamento e “discordância com opções de organização curricular e opções do despacho de organização do ano lectivo», por não potenciar «a melhoria da qualidade» do ensino. Manifestou ainda o desacordo com a «redução da componente prática e experimental» e exigiu que estas medidas fossem reavaliadas quanto às consequências a médio e longo prazo, salvaguardando que, nos anos lectivos que virão, serão necessários acordos prévios para evitar situações desta ordem.

Já no que aos professores diz respeito, a Federação salienta que o sistema educativo superior tem de assentar em pilares motivadores e vinculativos do corpo docente, evitando contratações sem processos vinculativos, situações de precariedade e desmotivação.

As escolas têm necessidade de, cada vez mais, se adaptarem às contingências e realidade actuais. A meta é a procura incessante de propostas educacionais que formem os alunos e garantam a ampliação de conhecimentos, numa articulação permanente do processo de conhecimentos, dos educadores e dos educandos. A desmotivação está a imperar, de uma forma crescente, nos corredores das escolas e das universidades. As sucessivas tentativas de melhoria estão a travar o contentamento dos que estudam e dos que ensinam num cenário económico que não facilita as muitas dificuldades que as famílias estão e vão ultrapassar.

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