Há algumas temporadas, Webber conduziu Derek e Callie durante o processo de desligar o suporte de vida e Mark. Nesse episódio, Callie interrompeu-o a meio para relembra-lo de que este processo não era algo novo para eles. Webber sabia disso perfeitamente. “Eu não vos estou a descrever o processo, porque necessitam de o saber”, respondeu. “Estou a descrever cada passo, porque, mesmo que vocês pensem que estão preparados para o que está prestes a acontecer, garanto-vos que não estão. O vosso cérebro não consegue entender tudo o que estamos a fazer neste momento. Mas ao dizer-vos isto, estou a dar-vos a oportunidade de conseguirem acompanhar todo o processo.”
As últimas duas semanas têm sido, de certa forma, uma preparação para o que estava para acontecer. No instante em que a série estabeleceu que Derek estava desaparecido, tornou-se óbvio que a personagem estava na mira de um final trágico. Anatomia de Grey é conhecida pelos seus twists, mas fazer com que o desaparecimento de Derek era afinal um caso em que ele estava a chorar as suas mágoas num bar seria algo cruel para se fazer aos fãs. Porém…
Se ainda não fui claro o suficiente (SPOILER ALERT), Derek faleceu. Posso dizer a mim mesmo milhares de vezes que Derek é uma personagem de ficção, mas isto não tornará escrever que está morto menos fácil. Contudo, é verdade e, por isso, vou começar por relembrar o que acabou por ser um dia muito, muito, muito mau em Seattle.
Derek estava a conduzir para o aeroporto, quando vê o acidente de viação a acontecer à sua frente, quando um carro desportivo e uma carrinha familiar chocam, com o primeiro a explodir em plena auto-estrada. No meio desta confusão, não só Derek consegue sobreviver, como também decide parar e ajudar as vítimas, em vez de conduzir para longe daquela confusão. Primeiro, vai ao carro familiar, que tem uma mãe e Winnie, a sua filha, que pensa estar morta. Só que o neurocirurgião de Seatle sente o seu pulso e relembra-a de que, enquanto ela o sentir, é sinal de que não está morta (boa dica). De seguida, vai alternando entre os dois carros, até que o carro desportivo explode, criando sinais de fumo que ele espera serem suficientes para que chegue alguma ajuda. Quando as ambulâncias chegam, todos são levados para o hospital, excepto Derek, que dá um abraço à pequena Winnie, entra no seu carro e procura o seu telemóvel no chão do mesmo. É então que acontece: um camião embate contra o carro.
Quando o voltamos a ver, ele está deitado numa maca e a chegar a um hospital que não o quer receber. Não, não estou a exagerar: o hospital quer rejeitá-lo como paciente, porque não está preparado para tratar de casos como este. Porém, os enfermeiros das urgências insistem e Derek é levado para a ala das urgências, onde é prontamente… mal tratado para a sua condição.
Neste ponto, ele não consegue falar, mas nós conseguimos ouvi-lo através do seu monólogo interior. Nós conseguimos ouvi-lo a avaliar a sua condição. Nós conseguimos ouvi-lo a dizer aos médicos o que fazer e o que não fazer, mas os médicos não estão preparados para trata-lo. Eles continuam a fazer asneiras atrás de asneiras, como não lhe fazerem a TAC que necessita. “Eu vou morrer, porque estes médicos não estão devidamente preparados”, pensa Derek. E tem toda a razão.
Estes médicos não são só incompetentes no que toca a doentes nestas condições, como o neurocirurgião de serviço não compreende bem o conceito de estar de “estar de serviço”, pois só aparece uma hora e meia depois de ser chamado. Quando finalmente aparece, já é tarde de mais. Não havia nada que se pudesse fazer para salvar Derek. Era o fim.
Como esta meia hora da série não brincou o suficiente com as nossas emoções, Grey’s Anatomy decide oferecer-nos um embuste: a polícia aparece em casa de Meredith e a cena seguinte mostra-nos como ela entra no quarto de hospital de Derek e a falar com ele. “Não estejas com medo”, diz-lhe ele. “Não vou a lado nenhum.” Isto, no entanto, só acontece na imaginação de Mer. Na realidade, os polícias estão a dizer-lhe que houve um acidente. Meredith leva os seus filhos para o hospital, onde descobre que o seu marido está em morte cerebral. Sim, o neurocirurgião está em morte cerebral. Que ironia engraçada, Shonda Rhimes!
Ao sair do quarto, encontra-se com o médico que tomou muitas más decisões sobre a forma como deveria ser tratado Derek. Dirigindo-se a ela, pede-lhe desculpas: “O meu trabalho era salvá-lo e falhei. E agora ele vai morrer, porque eu não fui bom o suficiente para mantê-lo vivo.”
Primeiro, quão egoísta é que se consegue ser para se ir ter com uma mulher que está prestes a perder o seu marido e dizer-lhe isto? Segundo, o que é que ele espera que ela lhe diga? “Não faz mal”?
Meredith, apesar de estar em choque, dá a este médico a melhor resposta que consegue. “Tem razão. Falhou. Não foi bom o suficiente”, começa a dizer, até se lembrar que existe sempre um novo dia a começar. “Portanto, aprenda com esta situação, torne-se melhor e, na próxima vez, seja melhor.” Todo o discurso que ouvimos é poderoso e tenso, terminado com um pouco mais de tough love. “Você não pode desperdiçar o que poderia ter sido o resto da vida do meu marido a ser um desistente. Por isso, volte lá para dentro, porque não está a salvar nenhuma vida ao estar aqui fora.”
Quando volta para junto do seu marido, para poder desligar o seu suporte de vida. Chasing Cars, dos Snow Patrol’s, começa a tocar. “Derek”, sussurra Meredith, “não faz mal. Vai tu. Nós ficamos bem.” Uma montagem dos melhores momentos do casal começa a passar à nossa frente e, eventualmente, acabamos por regressar àquela sala, àquele casal que tanto apoiámos, durante 11 anos, onde a enfermeira pergunta a Mer se está pronta. “Não”, responde ela. “Mas prossiga.” E, assim, sem grandes cerimónias, Derek deixa de existir.
Foi este um bom episódio? Nem por isso. E, sinceramente, isso é o que mais me chateia. Derek tem estado na série desde o seu início. Na temporada 1, no episódio 1, no minuto 1, Derek estava presente. A Christina também esteve connosco desde o início, mas teve direito a uma saída maravilhosa: despediu-se de quem tinha de se despedir, dançou a saudade com Meredith e seguiu o seu caminho em direcção ao final feliz que procurou. Por seu lado, tudo o que Derek teve direito foi a um grupo muito mau de médicos, que não conseguia perceber como poderiam salvá-lo.
A actual temporada tem sido muito importante para o seu relacionamento com Meredith. Discutiram, fizeram as pazes, experimentaram ter uma relação à distância e acabaram por se aperceber que queriam passar o resto das suas vidas juntos. Há dois episódios, ele disse à sua mulher que a ama muito e pediu-lhe que esperasse por ele. Olhando em retrospectiva, esse momento é um demasiado óbvio prenúncio de que algo de errado estaria para acontecer. Aliás, foi assim que grande parte deste episódio se desenvolveu. Basicamente, todas as conversas mantidas com Derek, durante as cenas do desastre de viação, eram um sinal de que nem tudo iria terminar bem. Existe uma linha ténue entre a criação de pronúncios inteligentes e os desagradáveis e este episódio recai claramente nesta ultima categoria.
Apesar de estar aborrecido com o que estava a ver, fiquei com lágrimas nos olhos, quando a polícia apareceu à porta de Meredith. E fiquei ainda pior, quando começou a tocar Chasing Cars. Isso aconteceu não porque o enredo estava bem desenvolvido (não estava), ou porque a história apresentada era poderosa (também não era), mas porque eu conheço Derek Shepherd há 11 anos.
Seguir uma série durante 11 anos requer uma boa dose de compromisso, uma certa ligação aos personagens e é esta a magia de Grey’s Anatomy – os seus personagens tornam quase irresistível a criação dessa ligação. Claro que existiram muitos momentos fracos e ainda existem muitas personagens que gostaria que nunca tivessem sido criadas, mas existem vários momentos em que Meredith, ou Derek, ou Webber têm cenas que me lembram o que me leva a continuar a seguir esta série e a nunca ter parado de o fazer. Portanto, ver uma dessas personagens desaparecer magoa. Mesmo!
O descritivo do Twitter de Shonda Rhimes diz “Lembrem-se, nada disto é real, ok?” Ela tem razão, porque nada na série é real. Porém, as emoções que ela nos faz sentir provam o poder que estas personagens têm sobre nós. Racionalmente, sei que nada disto é real, mas isso não impede que sinta uma espécie de luto, por um bocado.
Enfim, esta temporada ainda não terminou e acredito que nos próximos iremos ver muitas personagens a passarem pelo seu luto e talvez o regresso de uma Meredith mais pessimista. No entanto, por agora, lembremo-nos de Derek Shepherd em toda a sua glória. Grey’s Anatomy nunca mais será a mesma sem o seu McDreamy. Iremos sentir a tua falta.