Eram simples aqueles tempos.
Lembro-me de quando abrias aquela portada de madeira da janela do quarto. Recordo-me que, apesar de cinzenta ela ser de cor e de tentar enganar um pouco mais o que era inevitável, a luz do nascer do sol entrava e radiava de uma forma muito singular. Ao mesmo tempo que iluminava o grande terço pregado àquela parede na cabeceira daquela cama, ela aquecia a leveza do teu sorriso mudo que ficava no ar.
Que bom era!
Ali, os sinais dos jogos da noite anterior de não querer adormecer ainda eram bem visíveis nos lençóis e cobertores agora revolteados. Os movimentos residuais e inconscientes daqueles três irmãos de sangue para ganhar o lugar junto da parede eram ainda notórios.
Enquanto isso, do outro lado da rua bem junto ao portão de entrada da casa, a água translúcida da fonte corria. Aquela que nos iria lavar o rosto, os olhos e o sorriso. A clareza de como se conseguia ouvir o canto do galo predestinava mais um dia com odores cheios a terra.
Que bom era!
O cheiro de pão torrado nas brasas de lume aceso brilhante que nos aquecia (e que ainda hoje aquece) barrada a banha de porco que tiravas com todo o carinho de um pequeno pote de barro e que guardavas por detrás de um cortinado de pano, enchiam o nosso olhar e sorriso genuínos de crianças.
Eram simples aqueles tempos.
Tão simples de acordar.
Tão simples de saltar da cama e ser levado pela tua mão para aqueles campos.
Tão simples de encontrar quem já nos esperava por lá…
Tão simples de brincar…
Tão simples de aprender e de se ser ensinado.
Eram simples aqueles tempos.