Felicidade humanizada ou robotizada?

Há inúmeras variantes matemáticas teorizantes, tanto como de absoluta realidade humana e nas quais é passível e possível de encontramos felicidade. Seja de que forma for, se for para ser feliz, tenta-se! Seja através da cegueira do atropelo do outro, seja através de pequenos momentos criados sozinhos. Seja em abono da verdade ou em abono da mentira a felicidade existe das mais variadas formas. Uma e outra concentram-se e ajudam-se mutuamente, num equilíbrio salutar e dinamizador, como forma de sustentabilizar esse conceito de felicidade. O pressuposto da felicidade justa ou injusta não cabe em nenhuma sala de tribunal. Ainda que entre ganhos e perdas de justiça social ou emocional o final, esse, é sempre desigual, sempre desesperante e preponderante naquilo que somos.

A felicidade na idealização que fazemos tem muito a ver com o ambiente que nos rodeia. A forma como fomos criados, a estrutura mental, a educação, os objetivos transmitidos, a cultura ganhadora, o conceito familiar em que vivemos, as metas que diferem uns dos outros. Em que nos baseamos como foco de felicidade. Em nós? Nos outros? Na sociedade? Nos média? Na família? Para muitos a felicidade está em ter alguém. Para outros a felicidade está em não ter ninguém. Nesta conjuntura entre ter e não ter, a cada individuo cabe a noção intrínseca da sua idealização de felicidade. O projeto de felicidade não é eternizado nem nunca o será. Ele é volúvel, inconstante e mormente deveras desequilibrado.

O pressuposto da felicidade tem chaves deveras importantes. E chegamos à pergunta: Afinal de contas o que nos torna felizes? Para mim, há três funções inerentes à felicidade: A visão, a audição e a comunicação.

A visão serve essencialmente para captares tudo o que está à tua volta. A forma como olhas o mundo, como o visionas, como agregas todos os detalhes inerentes ao mesmo é de fulcral importância. As guerras que vês, as lutas, as alegrias, as consequências. Como comtemplas a tristeza, como adornas os momentos através dos acontecimentos.

Na audição tens a capacidade de escutar toda a informação com o qual o mundo partilha contigo todos os sofrimentos, as informações de cada pessoa, momentos, opiniões, conselhos, informação diversa, tantas vezes desconexa, desproporcional, desregulada, desprendida de sentimentos e agregada ao tribunal do mundo.

A comunicação é o resultado da conjunção do que viste e ouviste e como deves, tendo contigo toda a informação necessária comportar-te perante ti mesmo e todos os outros. O caminho para a felicidade depende desta conjuntura. Depende da separação necessária que deve ser feita tendo como ponto de partida o que viste de mal, o que ouviste incorretamente e o que foi comunicado de forma totalmente desapropriada, desadequada e que não te leve a fazer juízos de valores ou julgamentos sumários. É importante haver a informação correta, salutar, alegre, definida, bem construída.

O conceito reside em ver bem, escutar melhor…e comunicar de forma feliz e em liberdade. O pressuposto da felicidade bem antes da conjunção de dinheiro versus bens materiais é criar seres humanos conscientes, sabedores e felizes. Ou melhor dizendo, de consciências elevadas.

Com um espirito forte, com uma capacidade de resposta inteligente, sagaz e compreensiva, baseado na partilha, baseado na cumplicidade, baseado na verdade, baseado no amor. A dedicação a ti mesmo como forma de ponte, de link de mudança, de alteração de conceitos, muitas vezes aprisionados, muitas vezes moribundos e tantas vezes, teimosamente destituídos do humanismo que outrora nos caracterizavam, necessitam de aprendizagem sistemática. E aqui reside a diferença entre os camelos que vagueiam pelo deserto teimosamente e os leões que desbravam caminhos rumo às mudanças.

Somos seres tremendamente industrializados. Há um certo roubo da nossa própria humanização, que robotizou as nossas consciências. Dependemos de dinheiro para sermos felizes, dependemos de lugares, de viagens, de prendas para nos sentirmos felizes, de sermos agraciados com alguma espécie de reconhecimento sistemático, seja num trabalho, estudos, família, amores, amigos, conhecidos. Dependemos do outro para a limpeza das nossas feridas.

E ainda assim dependendo de todos, somos apenas nós sempre sozinhos os verdadeiros desbravadores de caminhos. Não morremos acompanhados da felicidade. Morremos acompanhados desse mesmo vazio que é a morte. Precisamos de um bom carro, uma boa casa, uma bela mulher. Precisamos de ser ressarcidos com mais dinheiro, necessitamos de comprar mais e mais coisas, para que a nossa vida dê sentido a ela mesma. Nós não queremos que a vida dê sentido a nós mesmos. Nós desejamos que a vida por si mesma se torne digna para ser vivida. E cometemos inúmeros erros neste caminho de encontro ao cálice da vida, simplesmente porque não percebemos nada nem de amor, nem de felicidade.

Quando olhamos para nós colocados neste mundo, neste planeta recheado de belezas naturais fantásticas, onde essa conjunção entre natureza e humanismo se abraçam como um só, deveria ser o pressuposto daquilo que supostamente chegaria para a casualidade imposta sem demagogias de pura felicidade. O ato de estar vivo reflete a bênção que nos foi dada pela mãe natureza. É uma simbiose de cores e sabores que nos foi facultada como um direito nosso, sem necessidade de compra de propriedade. Ao invés disso, relativizamos a humanização, dessa partilha, desse segredo da vida, dessa cumplicidade humana e desafiamos a mesma, destituindo-a como nosso amor verdadeiro. Os homens acabaram cegamente por criar formas destituídas da pureza e essência como forma de dizer: “ Só podes ser feliz se comprares”.

Passamos à compra dos produtos, à compra de amores de pessoas, agarramo-nos aos bens materiais, financeiros, conceitos desnutridos, desvirtuados da real capacidade de amar, de ser feliz. Há uma teimosia mundial unificada na selvajaria do poder. Somos mais felizes com carros melhores, com roupas mais vistosas, com casas mais bonitas, com salários mais altos, com bens adquiridos que possam dar sentido real a uma felicidade que mais não é do que um conceito de fast-food limitante e desestruturante. E ainda assim o medo tremendo da perda, do sentido que tudo isto pode causar não tendo acesso aos mesmos é assustador.

Não nos pode assustar a perda de bens materiais. Antes isso do que o bem da vida. Os Gurus da India não vivem felizes pelas ruas e becos? Os Budistas do Tibete não vivem felizes no alto das suas montanhas? Os esquimós do polo norte não vivem felizes nos seus iglus?

Não perguntes de que forma podes ser feliz. Pergunta-te antes, se a forma que usas para ser feliz é ungida na humanização ou na robotização? E se a resposta dada for na robotização, lamento, mas esse tipo de felicidade, rápida, liquidificada não te faz sentir vivo, não carrega o sabor da vida, dessa harmonia necessária. As robotizações da felicidade, essas fast-food de fábricas de sonhos gigantes são o motivo da falência da vida, da verdadeira contemplação.

Mas se és humano… se não és insano… da pureza que pintas, crias a obra que és.

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