The Fall of the House of Usher

The Fall of the House of Usher foi a mini-série perfeita para a “spooky season”, como se costuma chamar aos dias antes do Halloween. Sei bem que esta época divide a maioria das pessoas entre quem acha que não devíamos importar tradições estrangeiras, quem acha que é desrespeitoso para com a religião dominante e aqueles como eu, que preferem divertir-se e acham que qualquer desculpa para fazer uma festa é uma boa desculpa. Portanto, parte da tradição é procurar algo novo e assustador para ver nestes dias.

Dos mesmos criadores de The Haunting of Hill House, mas na minha opinião muito superior, trazem-nos uma história inspirada na obra de Edgar Allan Poe. No conto original com o mesmo nome, o narrador é convidado a visitar um velho amigo de infância, Roderick Usher, que vive na enorme casa de família com a sua irmã gémea, Madeline. Roderick explica ao narrador que ele e a irmã sofrem de uma doença de família que progressivamente enfraquecerá a sua saúde física e mental, até à morte. O narrador decide ficar, apesar de sentir que algo existe de sinistro na casa e achando estranho por vezes ver o vulto de Madeline, embora esta nunca interaja com ele. Alguns dias passados, Roderick comunica que Madeline faleceu e que se encontra sepultada dentro da casa. Ao continuar a sua estadia, o narrador vê o seu anfitrião a ficar cada vez mais perturbado, até que um dia ambos ouvem um barulho vindo de dentro da casa e Roderick confessa que suspeita que a irmã não estava morta quando a sepultou e que agora vem à sua procura. Nisto, uma porta abre-se e surge Madeline com roupas ensanguentadas que gritando, cai sobre o irmão, morrendo e levando-o com ela. O narrador foge em pânico, e do exterior assiste enquanto a Casa de Usher se desmorona.

A adaptação de 2023 traz uma abordagem bastante mais actual: Roderick e Madeline são dois irmãos órfãos que se tornaram milionários da indústria farmacêutica. O medicamento que lhes trouxe a fortuna é um analgésico suspeito de criar dependência e morte, mas apesar dos esforços de Auguste Dupin, o advogado do ministério público, tal nunca fica provado. Quando os filhos de Roderick, todos habituados a uma vida de excessos e indulgência, começam a morrer um por um em circunstâncias macabras, fica claro que a “sorte” da família Usher se está a acabar. Roderick então convida Dupin a encontrar-se com ele na sua antiga casa de infância com a promessa de uma confissão, e conta-lhe a história dos últimos dias, as circunstâncias das mortes dos seus filhos, e também a verdade sobre a forma como ele e Madeline alcançaram o sucesso.

Contudo, esta mini-série não se fica só por adaptar The Fall of the House of Usher. Para começar, cada episódio tem o nome de uma história do autor. Depois, quem conhecer a obra de Edgar Allan Poe vai encontrar referências à mesma por toda a série. O gato preto. Os artefactos egípcios. Os sons vindos de dentro das paredes. O corvo. A primeira mulher de Roderick chamar-se Annabel Lee. Todas estas histórias são misturadas com mestria e coerência pelo realizador Mike Flanagan.

Visualmente, a série está exímia, desde os cenários opulentos em que se move a família Usher, o guarda-roupa e até algumas das cenas mais gráficas, que não serão de todo adequadas a crianças ou espectadores sensíveis. Em destaque também está o elenco, todo ele fantástico, mas do qual saltam à vista Carla Gugino no papel de Verna, e Mark Hamill no papel do tenebroso advogado da família Usher, Arthur Pym.

Em suma, The Fall of the House of Usher é uma adaptação inteligente que resulta numa história tão boa quanto perturbadora. Se não a viram a tempo da “spooky season”, ainda vale muito a pena.

Nota: este artigo foi escrito seguindo as regras do Antigo Acordo Ortográfico.
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