Sobre o fim das propinas

A verdade é que o sistema educativo não é suportável para todos. Com a nova proposta do Bloco de Esquerda, a partir de 2020 o ensino universitário será “gratuito”. Contudo, importa reflectir sobre algumas questões adjacentes: primeiro, será esta uma proposta suportável pelo Estado? De que forma é que esta (suposta) boa notícia não terá consequências trágicas de cariz equivalente, ou superior em valor? É que o financiamento público, mais do que o pagamento individual mais entrosado, financeiramente, pode ser uma decisão mais tranquila e acertada.

O que quero dizer com isto é que “quando a esmola, é grande o pobre desconfia”. O fim das propinas muito provavelmente permite que o dinheiro (as poupanças) sejam realocadas para fins mais urgentes – e não que o sistema educativo não seja urgente, porque, de facto, o nosso sistema educativo tem muitas falhas ­–, mas a verdade é que é mais do que sabido que as instituições públicas em questão, hoje, ou pelo menos as de maior nome (que até temos algumas, internacionalmente), são auto-sustentáveis e auto-suficientes.

O problema aqui é: para onde vai, ou melhor, de que forma o Estado, ao tentar compensar, consegue ir buscar o financiamento? Mais uma vez, hoje em dia – e provavelmente desde sempre –, “ninguém dá nada a ninguém”, é mais que sabido. Então, muito provavelmente o fim das propinas será uma espécie de presente envenenado, no qual o Estado dá, para depois tirar imediatamente a seguir em impostos e taxas (mirabolantes).

O real problema é, precisamente, ou reside na ideia de que “o que o Estado dá, o Estado tira”. Nunca é um acto isolado. É algo que, mais do que nos tornar um país melhor (e importa reflectir com cuidado sobre o que é, para cada um, ser um país melhor), passa por nos tornar um país mais sustentável economicamente (pelo menos a curto prazo) – porque, como já se viu pela história, não há longo prazo (e a haver, nele, tal como dizia Keynes, “estamos todos mortos”).

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