Localidade fronteiriça e partilha, com a aldeia alentejana de Marco, uma outra característica única, que é ser atravessada a meio pela fronteira internacional entre Portugal e Espanha, com ambas as partes conhecidas pelos seus habitantes como “povo de acima” e “povo de abaixo”.
A verdade é que não se distinguem como dois povoados diferentes, mas sim como um só. É também, juntamente com as Terras de Miranda, Guadramil e Quintanilha, um dos territórios de língua leonesa em Portugal. A fala de cada lado é curiosa, com trejeitos ancestrais, pois parece que parou no tempo.
A parte espanhola do território, que tem apenas 25 habitantes, é designada oficialmente de Rihonor de Castilla, mesmo que esteja em Leão e pertence ao município de Pedralva da Pradaria. Até cerca de 1850, constituía um município próprio, situação que se alterou, o que em nada muda a vida destas gentes.
É comum observar gado atravessando a fronteira livremente. Para as cabras ou ovelhas não existem barreiras. As populações de ambos os países possuem muitas vezes terras do lado oposto da sua nacionalidade, trabalhando-as como se fossem do seu lado da fronteira. Partilham também um pasto comunitário, onde se alimenta um rebanho único de cerca de 300 ovelhas e 100 cabras.
A partilha de recursos mostra que tudo se faz para que nada falte, ou seja, partilha-se de diversas formas. Um bom exemplo é o caso da gestão da água. As águas residuais são tratadas do lado português, oferecendo em troca, os espanhóis, água potável no Verão, quando há problemas de abastecimento.
A povoação é composta por antigas casas de pedra com dois andares. A vida familiar ocorre no andar de cima, ficando o gado, os cereais e outros produtos no andar de baixo. Ainda hoje usam o nome de loja e felizmente que estas designações não se perderam no tempo.
São casas que têm muita vida e histórias que poderiam ser contadas com calma. Ali se lutou pela vida, com condições adversas, numa terra que estava longe de tudo e tinha como vizinhos, falantes de outra língua que labutavam de igual modo. A raia, aqui, deixou de fazer sentido.
É atravessada pelo Rio Onor, um afluente do rio Sabor que nasce na Serra da Culebra. Junto ao rio, zona mais aprazível é possível aproveitar a paisagem e ouvir os sons das muitas aves que por aqui passam. A tranquilidade não tem som, mas entranha-se e chega à alma que a acolhe.
Rio de Onor subsiste, e muito bem, como uma aldeia comunitária. Esta forma de estar, vinda dos tempos antigos, ensina o que é a partilha e a entreajuda de todos os habitantes, o que pode ter variadas formas. Tudo se partilha, o forno, os terrenos agrícolas, onde todos devem trabalhar, o rebanho e o boi cobridor, este muito requisitado e com marcações extensas.
Na verdade, este povoado singular assume, para além de um regime de governo próprio, um dialeto próprio e quase extinto, pertencente ao grupo do asturo-leonês, à semelhança da língua mirandesa. As falas escutadas soam a um certo cantado e o segredo deve ser esse, viver quase isolado precisa de alegria.
Uma visita pela terra é uma frescura de espírito. As mulheres cuidam de todos os afazeres e dos netos, sentadas nas soleiras das portas, onde ainda se cantam alguns restos de cantigas de amigo e de amor mesmo que não saibam o que isso possa ser. Os homens, mais afastados dessas lides, carregam os seus dias ao sabor do tempo e do clima.
Tudo é de todos e a ponte, antiga e carregada de beleza milenar, é um posto de observação que não deve ser desperdiçado. Se quiser pode participar nas múltiplas atividades, mas atenção com os horários, o campo não sabe da vida na cidade e vive em autonomia, logo o sol é que manda.
Com igrejas dos dois lados, pode ouvir missa em línguas curiosas e saltitar entre um país e o outro onde, outrora, se acoitavam alguns que lutavam por uma vida melhor para todos. A terra tem zonas nacionais e espanholas e as pedras que as assinalam, pintadas de branco, não querem disso saber.
Um passeio por estas terras é uma viagem no tempo, aquele que foi deixando marcas em cada um dos lados. Os mortos são cuidados com o amor e carinho merecido e os vivos continuam as labutas de sempre, o sobreviver numa terra que é inóspita, mas que continua a ter aquela estranha magia que não os deixa de lá sair.