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Quando o “amor” magoa uma criança mais do que uma chapada

“Sou médica pediatra e violento os meus filhos!” Esta frase infelizmente nunca será ouvida. Gostava que fosse. A pessoa em questão precisa de ajuda urgentemente e só porque é Médica e Pediatra a sociedade não se atreve a dizer nada. Eu atrevi-me e vivo consequências devastadoras até hoje.

Não é preciso ser psicóloga e ter agregação à Ordem dos Psicólogos para perceber algumas coisas. Não é preciso ser licenciada em psicologia sequer para perceber outras coisas que daí advém. É preciso ter sensibilidade e perceber que uma criança não tem filtros que permitam compreender algumas coisas. Se gritar e berrar com um adulto dá o que dá, o que dará com uma criança?

“Sou pediatra e berro com os meus filhos até me cansar”

Sabe quais são os impactos documentados de gritar com crianças? Vou mencionar 11, mas poderia mencionar 111:

  1. Gritar não é, nem nunca será uma estratégia de educação parental, mas sim, manifesta um completo descontrolo emocional da mãe (neste caso), que grita porque está irritada, frustrada, impaciente e não sabe o que fazer para alterar o comportamento da criança no momento e por isso grita.
  2. Acreditar que “a minha filha ou o meu filho só me ouve quando eu berro com ele” não permite refletir e procurar alternativas pedagógicas, educativas, construtivas e de negociação mais eficazes para lidar com o problema de forma calma, firme e eficaz.
  3. As dificuldades em fazer-se ouvir pela criança, em lidar com as emoções que isso lhe provoca e recorrer aos berros provoca um enorme desgaste físico e psicológico, da criança, da mãe e de todas as pessoas que observam.
  4. Berrar tem efeitos negativos no ambiente familiar, que se torna tenso; prejudica a vinculação e relação pai-filho e mãe-filho e tem um enorme impacto negativo no desenvolvimento da criança.
  5. A criança estará mais atenta à forma como está a falar com ela (aos gritos, aos berros, ao gritar) do que ao conteúdo da sua comunicação e da sua mensagem (o que lhe diz) e só vai parar o que esta fazer quando ouve os pais berrarem, por temer uma reação mais agressiva dos adultos.
  6. Quando não conseguimos lidar com as emoções, um tom de voz alterado e o estado emocional alterado pode (e em muitos casos acontece mesmo) fazer-se acompanhar de palavras injustas, pesadas, graves e até de agressividade física e emocional, por vezes.
  7. Comunicar, fazer pedidos ou dar ordens recorrendo aos berros provocará na criança uma reação mais impulsiva e desafiante (em algumas crianças) e a total subserviência noutras. A criança crescerá para ser um adulto e uma adulta emocionalmente desequilibrada.
  8. Gritar é uma prática contraproducente, que é ineficaz e muito impactante a médio e longo prazo, uma vez que a criança vai passar a ignorar os berros, e só vai gerar um enorme ciclo vicioso. Muitas crianças aprendem a desafiar violentamente a autoridade (polícia, empregos, etc.) em virtude de uma mãe ou pai violento nas palavras.
  9. A criança está a aprender formas desadequadas e violentas de comunicação. Facilmente passará também a berrar em casa e este comportamento pode generalizar-se para outros contextos, como a escola, por exemplo. A criança não tem filtro para saber se quando berrar está a violentar outra criança, já que a mãe o fez. Como a criança modela a mãe, irá considerar que berrar é uma forma adequada de comunicar e conseguir o que quer.
  10. Ao contrário de estratégias parentais eficazes, berrar não ajuda a criança a aprender a lidar com as suas emoções desagradáveis, nem a desenvolver a capacidade de resolução de problemas, empatia, respeito ou colaboração.
  11. Na falta enorme de compreensão que os berros trazem, a criança vai procurar apoio emocional fora, o que se pode traduzir, por exemplo, em muitos “namoradinhos” em tenra idade. A criança vai mendigar afeto e compreensão fora de casa.

Não sou mãe. Não sei o que é ser mãe. Sei o que é ser tia. E sei bem o que berrar pode fazer com um adulto. Estudar o que fará com uma criança não é difícil.

Se os meus argumentos não forem suficientes, com tudo o que estudei, sendo licenciada em Psicologia e pelos professores que tive, posso citar de uma forma fácil e fluída muitos autores de renome que invocam estes argumentos também.

“Sou pediatra e comparo-me com a minha filha de 9 anos”

“Disse à minha cabeleireira que quero o meu cabelo como o dela”; “Já olharam bem para ela? É gira a miúda (por outras palavras e não foi usado “miúda” foi outra coisa bem mais pejorativa), “Queria ser exótica como ela”.

Diriam: duas miúdas a serem miúdas, não é? Seria quase verdade, se uma não fosse criança e a outra tivesse acima de 35 anos.

O impacto psicológico de um adulto se comparar a uma criança, para a criança é enorme.

Até vou citar uns autores para ganhar dimensão o que digo, já que este assunto está menos falado e mais no limbo.

Segundo Papalia e colaboradores, a autoestima é o julgamento que cada pessoa faz do seu próprio valor, podendo esta ser alta ou baixa. Paralelamente a esta ideia, Lima e Fragnani, (1998), definem autoestima como a certeza que o ser humano deposita na sua competência para pensar e encarar os desafios e dificuldades da vida. Alcântara (1997) aprofunda esta questão, definindo a autoestima como uma atitude, uma atitude para a própria criança, na medida em que é a forma habitual de pensar, amar, sentir e comportar-se consigo mesmo, ou seja, é a disposição permanente com a qual ela se confronta com ela própria. Para Rogers (cit. por Alcântara, p. 17) a autoestima é o núcleo base da personalidade. A autoestima não é inata, esta adquire-se consoante a história da pessoa. Uma vez formada, a autoestima torna-se estável, consistente, difícil de remover e mudar, mas isto não significa que a sua natureza seja estática, ela é altamente dinâmica e por essa razão pode enraizar-se mais intimamente, pode crescer, interligar-se e ramificar-se com outras atitudes nossas; ou pode empobrecer-se e debilitar-se.

A autoestima como um componente cognitivo, deve-se ao facto de este indicar crenças, opiniões, ideias, processamento e perceção da informação. O autoconceito é a forma como percecionamos a própria personalidade e conduta, aquilo a que Markus chamou de “autoesquemas”, precisamente por se tratar da organização das experiências passadas para reconhecer estímulos do ambiente social. “Acho determinante o valor da autoimagem para a vitalidade da autoestima. Somente se modelarmos o autoconceito em imagens intensas, ajustadas, ricas e atualizadas ao espaço e tempo em que vivemos se enraizará a autoestima e demonstrará a sua máxima eficácia nos nossos comportamentos.”

Uma boa autoestima, ajuda a criança a enfrentar os problemas e fracassos inesperados, ou seja, dá-lhe a força que ela necessita para ultrapassar os obstáculos que diariamente aparecem na sua vida. Esta força irá reduzir os momentos de tristeza, bem como a sua duração e aumentará a probabilidade da criança conseguir alcançar o que deseja.

Em criança, jovem, ou mais tarde já em adulto, uma autoestima baixa, vai deixá-lo frágil, e a mais pequena adversidade é capaz de o paralisar e deprimir.

Neste caso específico, a baixa autoestima da mãe e consequente impacto na filha com comparações, berros e imposição, vai proporcionar uma construção da personalidade sempre em relação e em comparação e nunca na singularidade e unicidade da criança.

A comparação de um adulto com uma criança, mata a autonomia e a perceção individual da criança.

Nunca se vai achar boa e vai ser necessária sempre a comparação para se poder realizar em termos pessoais e profissionais.

“Sou pediatra e envergonho a minha filha em público”

“Não comas isso”, “és uma gorda”, “vais ficar gorda”, “nem sabem a história dela quando atacou o bolo de um coleguinha na festa de aniversário dele e com toda a gente a ver”. Risota geral. Eu não me ri, sei o impacto que estas coisas têm.

Não gosto de ditados populares. Há um que me faz muito sentido, no entanto: “elogia em público e corrige em particular”.

A construção da personalidade ao nível da vergonha (e a falta dela), do respeito pelos outros (e pela falta dele), pela perceção do certo e do errado, é feita na modelagem das pessoas que respeitamos e que entendemos como referências.

Esta criança que foi envergonhada, dificilmente será um natural orador, conferencista e terá um medo de morte a falar em público e ser criticado e envergonhado por isso. Pode superar o medo, claro, até esse momento, irá investir em coachs e psicólogos. E em medicação também.

Esta é a mínima das consequências. Numa perspetiva de aceitação social e nas relações amorosas, a construção da personalidade pela aceitação do que somos é fundamental. Ser gozado pelos nossos comportamentos em público tolda qualquer relação.

“Sou pediatra e não sei o que é um crime público”

A definição de crime público é simples. Nas palavras do Ministério Público, “o crime público é um crime para cujo procedimento basta a denúncia facultativa de qualquer pessoa”.

As entidades policiais e funcionários públicos são obrigados a denunciar os crimes de que tenham conhecimento no exercício de funções.

Nos crimes públicos o processo corre mesmo contra a vontade do titular dos interesses ofendidos.

A violência doméstica é um crime público.

Diz-nos o código penal no seu artigo Artigo 152.º, n.º 1, alínea d) e n.º 2 alínea a): Comete violência doméstica quem, de modo reiterado ou não, infligir maus tratos físicos ou psíquicos, incluindo castigos corporais, privações da liberdade e ofensas sexuais: d) A pessoa particularmente indefesa, nomeadamente em razão da idade, deficiência, doença, gravidez ou dependência económica, que com ele coabite; é punido com pena de prisão de um a cinco anos, se pena mais grave lhe não couber por força de outra disposição legal. 2 – No caso previsto no número anterior, se o agente: a) Praticar o facto contra menor, na presença de menor, no domicílio comum ou no domicílio da vítima.

A lei é geral e abstrata sim. Neste caso é bastante concreta.

É preciso o Prof. Figueiredo Dias para comentar este artigo do código penal? Não!

É preciso ser psicóloga para identificar um crime público? Não!

Neste momento sou (juridicamente) comparticipante deste crime. Sei que é feito. Sei o que vai gerar e meti numa gaveta o que sei e o que posso fazer.

A única coisa que posso fazer é: aconselhar esta pessoa a consultar de forma urgente um médico psiquiatra e um psicoterapeuta, já que manifesta problemas sérios de frustração e inferioridade.

Pedagogicamente deverá fazer um curso de parentalidade consciente com uma pessoa boa no mercado.

O que devemos fazer, quando não somos capazes, é isso: rodear-nos de pessoas capazes.

Eu serei comparticipante deste crime. Eu ficarei em silêncio.

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