Siesta (Hater)

Os Hater são uma recente banda sueca, que lança agora o seu segundo álbum (sendo que o primeiro, You Tried, saiu em 2017). O quarteto é liderado pela voz de Caroline Landahl e o seu papel é vital para sentirmos realmente este Siesta. O álbum realça o que de melhor a banda tem para dar no indie pop, que transborda no seu registo: linhas marcadas no baixo, cheias de vontade de fazer “bater o pé”, e instrumentais preenchidos e acelerados, sempre revestidos do viciante timbre de Landahl. Sussurros, falsetes e alguns agudos bem presentes, mas circunstanciais na medida certa, compõem o contributo insubstituível da vocalista, que assim particulariza ainda mais a pele sónica da banda.
Este álbum é o resultado de uma sintonia instrumental e vocal muito bem conseguida, sem que daí se possa concluir qualquer simplismo no processo criativo da banda ou na produção das músicas. Cantam sobre expectativas, relações perdidas, otimismo e novos começos, como resultado daquilo que parece ser uma introspeção sem distrações, que resulta numa pop de excelência. Apanha-nos logo na primeira música (“From the bottom of your heart”) e, a partir daí, somos transportados para uma viagem tranquila, com alguns sobressaltos inesperados mas, na sua maioria, positivos e suficientes para que a chegada ao destino seja feliz.
É um trabalho discográfico longo, composto por 14 faixas, que desenrola alguns devaneios desnecessários que prolongam as canções sem grande motivo. No entanto, não é um álbum para ouvir em qualquer altura, o que pode ajudar a tolerar a sua duração sem levantar questões. “Its so easy”, “Closer” e “Cut me loose” são os destaques que brilham através de um certo “playful” rock; “Fall off”, “Things to keep up with”, “Why it works out fine”, “Seems so hard” e “Weekend” são a autenticidade que nos faz querer ouvir o futuro deste grupo sueco.
Wanderer (Cat Power)

Sublime. Chan Marshall superou-se neste seu nono álbum enquanto Cat Power e revela-se uma jovem de 46 anos a fazer música com liberdade. Não será coincidência que o seu novo registo seja resultado de um trabalho com uma editora diferente daquela que foi responsável pelos seus sete discos anteriores (Matador). Há quem diga que a mudança aconteceu depois do sucesso do seu álbum de 2012, Sun, que conquistou uma comunidade mainstream de ouvintes e levou a discográfica a solicitar um registo mais comercial de Marshall – para continuar o fluxo lucrativo. Parece que a manobra não lhes correu bem.
Em Wanderer, a artista americana moderniza a sua melancolia e o seu som, num registo que reclama a sua batalha contra problemas psiquiátricos como vencida. O primeiro single do álbum, “Woman”, que conta com a muito bem-vinda participação de Lana Del Rey, é a montra do disco e um canto dessa mesma vitória. Vale muito a pena ouvir a versão completa deste single, que serve de exemplo para confirmar a personalidade imensa deste álbum e as suas notas de ironia bem humorada. Mas para quem tem mais preguiça, ou simplesmente mais curiosidade pela estética escolhida para esta faixa, aqui fica o videoclipe.
Os restantes destaques vão desde “Wanderer”, “In your face”, “Horizon” e a belíssima cover da música de Rihanna, “Stay“, até “Black” e “Me voy”, que já só surgem na segunda metade do alinhamento. Com um conjunto assim, este disco traz-nos uma Marshall confiante e, mais importante ainda, uma artista que faz música madura, diferente e ousada, através da ausência do medo de ser modernizar e da certeza revigorada que quer ser quem lhe apetece.
Vai e Vem (Márcia)

A artista portuguesa marcou a sua forte presença no panorama nacional da música em 2009, quando lançou o seu primeiro trabalho (Márcia), no qual se inclui a famosa “A pele que há em mim (quando o dia entardeceu)”. Agora, regressa três anos depois do seu último disco (Quarto Crescente, 2015) com Vai e Vem, um registo que nos relembra a Márcia de sempre, mas com os toques de crescimento pessoal típicos de quem escreve (boas) canções.
A coerência da sua delicadeza é difícil de ser concretizada, mas certamente é já lugar cativo do trabalho que tem vindo a apresentar. Não por existir estagnação no seu registo, mas antes pela forma como escreve e interpreta – de uma maneira que nos toca, nos move e nos emociona. Neste álbum, a artista escreve sobre o desamor e a indiferença de quem se ama, mas também sobre arriscar, viver e amar – através de alguns gritos de independência, uns mais contidos do que outros.
Ao potencial vocal praticamente oculto, mas ao mesmo tempo óbvio – porque o seu controlo é exímio e a delicadeza também não é proeza fácil -, junta-se a sua composição lírica arrebatadora, que nos convence a viver (e a desejar) as suas dores, as suas dúvidas e as suas certezas. Podemos ouvir canções que nos levam para um retiro quase transcendental, como “Mil anos”, “Pega em mim” (com Salvador Sobral) e “Ao chegar”, bem como outros testemunhos da sua capacidade de apalavrar sentimentos, sejam eles quais forem – como “Tempestade”, uma das faixas mais pop, “Amor conforme”, “Corredor” e “Vai e vem” (com António Zambujo). “Emudeci” é mais uma das faixas que conta com a participação de um nome sonante da música portuguesa, Samuel Úria, sendo que este vem já sendo um companheiro recorrente na carreira de Márcia.