Faltava um quarto para as seis da tarde e o dia de trabalho ainda estava a meio.
“Isto de dizer aos outros o que fazer tem muito que se lhe diga.” Suspirava ele com um ar cansado, mas com um tímido brilho nos olhos. Não se podia ir de fim-de-semana sem deixar as coisas organizadinhas. Notas aqui, recados ali, emails para lá e as coisas vão chegando ao seu rumo. Atarefado, consciente de que estava a fazer o melhor para a empresa, lá ia arrumando as gavetas do ego, enquanto o poder que lhe havia sido dado começava a subir às prateleiras do seu dia-a-dia. “Isenção de horário significa por vezes chegar atrasado, mas também nunca tenho horas para sair.” A ressalva está feita.
Esta pequena introdução é decerto familiar a muitos. Quem nunca deu por si a observar a forma como os outros organizam as prateleiras das suas vidas, como caminham nos labirintos dos seus destinos e como gerem os poderes que permitem interceder na qualidade de vida de terceiros?
O poder que nos é dado a nível profissional, ou pessoal e a influência que o mesmo tem no nosso comportamento e relações interpessoais é, muitas vezes, objecto de estudo. Recentemente, Andy J. Yap, da Universidade de Columbia, nos Estados Unidos da América, concluiu que “o poder chega às nossas cabeças”. Dúvidas houvesse, uma década de pesquisas vem confirmar o que no fundo todos sentimos. “Quando as pessoas se sentem poderosas, ou impotentes, esse estado de espírito influencia a perceção dos outros”, descobriu Yap . Exemplo disso é a sensação de poder que sentimos, quando nos colocamos numa posição dominante em relação ao outro. Os investigadores vão mais longe e sugerem que “perguntar a uma pessoa para se lembrar de uma altura em que se tenha sentido poderosa pode trazer o poder para o seu estado de espírito”. Yap chegou ainda à conclusão de que colocar uma pessoa numa posição de poder ajuda a aumentar a probabilidade de esta conseguir obter mais dinheiro “do que aquele que tem direito”.
Há uma linha ténue entre o uso do poder para o benefício daqueles para quem trabalhamos e o uso da confiança que nos foi depositada para obtermos o que achamos melhor para nós. Exemplos de políticos corruptos não faltam. Nem tão pouco de profissionais competentes que, não tendo poder, não têm voz. Reunirmos energias para usar esse poder para benefício de todos é um feito que poucos conseguem. Todos nós temos poder perante alguém e há sempre alguém que tem o poder de nos influenciar positiva, ou negativamente. O segredo do sucesso de um bom líder passa, sobretudo, pela forma como este exercita o poder que lhe é confiado.
A hipocrisia dos estatutos que muitas hierarquias exigem de muitos de nós reflete-se nos gestos daqueles cujo défice de carácter é proporcional ao excesso do tamanho do ego. Casos de insucesso no trabalho causados por falta de motivação são exemplos de como a voz que nos foi dada poderia ter um papel mais activo, se a sua vez de ser ouvida fosse permitida. Felizmente, ainda existem encontros positivos com líderes genuínos, que têm a capacidade de olhar para o relógio, não vendo nos ponteiros soldados de uma guerra em que todos são inimigos. Ainda há poderosas mentes que não vêem nos outros números a subtrair e que somam nas suas vidas histórias com conteúdos preenchidos de afectos. No trabalho, na família, nos círculos de amizades que vamos reunindo no nosso caminho, os bons líderes são na maioria dos casos reconhecidos e recordados, porque as pegadas que ficam não se apagam com o tempo. Deixam saudades, quando partem, e trazem conforto, quando chegam.
Chegar ao cume de um monte de sonhos já cansados de esperar, auxiliados por aqueles que nos iluminam o caminho, é a prova de amor que sara qualquer mazela deixada pela espera. Há poderes que só dependem das nossas forças. Há pessoas que usam o poder que têm para dar mais força. Aquela que todos temos, mas que nem todos conseguem trazer na mala que guarda o mapa dos sonhos e que, por isso, tem de estar pronta a usar nesta curta viagem.